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Até tu, basquete…disse o futebol?

Olá, pessoal!

Abro o espaço para fazermos uma comparação entre o que vem sendo desenvolvido no basquetebol brasileiro e o que ocorre no futebol.

Permito-me falar sobre outra modalidade justamente para mostrar que, quando existe vontade política, a gestão pode funcionar. O Novo Basquete Brasil (NBB), organizado pela Liga Nacional de Basquete (LNB), tem muito do modelo de gestão que observamos na NBA (Liga Americana de Basquete). A ideia de franquias, por exemplo, é uma das suas características.

Mas o ponto que gostaria de explorar vai além disso. Trata-se da preocupação da Liga que organiza uma série de elementos em prol de uma competição equilibrada e de um espetáculo lucrativo.

Não dá para compararmos a saúde financeira do futebol com a do basquete brasileiro. Seria como comparar a saúde do futebol brasileiro com o dinheiro da NBA.

Sobre o Campeonato Brasileiro da Série A: “Segundo levantamento da Folha de S. Paulo publicado nesta quarta-feira, o torneio arrecadará mais de R$ 600 milhões nesta temporada, mais do que o dobro das receitas da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), com bilheteria, TV e placas de publicidade”.*

Isso é pouco se comparado aos valores pagos por apenas uma franquia da NBA: cerca de R$ 400 milhões. Mas muito se confrontado aos modestos R$ 200 mil que a LNB projeta, mas ainda não definiu como valor para novas equipes no basquete brasileiro.

A parte financeira e cultural é um fator que pode causar dificuldades na compreensão dos avanços a que se chega quando fazemos tais comparações. O foco deve ser no que é oferecido de retorno ao clube.

E no melhor estilo NBA, o basquete no Brasil segue a tendência de fortalecimento da marca da Liga como forma de alavancar investimentos. Isso se torna evidente quando são promovidas clínicas para os técnicos, para os árbitros e, até mesmo, para quem faz scout.

Difícil de visualizar isso no futebol? De visualizar, não, mas, talvez, de concretizar. Contudo, o que será que isso agrega de valor? A resposta é tão óbvia quanto a pergunta: se a Liga investe em árbitros e em técnicos, a tendência é ter profissionais mais qualificados, decisões de arbitragem mais justas, técnicos mais preparados, ações e informações precisas em torno do produto principal: o espetáculo de basquete.

Eis um papel de uma Liga que não precisa enriquecer por enriquecer e, sim, dar possibilidades e suporte aos seus integrantes por meio da manutenção de um nome que atende a um espetáculo que, quanto mais sério e capacitado, melhor será; consequentemente será mais atrativo para os patrocinadores.

Os clubes na LNB têm participação nos lucros da entidade - a Liga ainda forneceu, nesta temporada, aros, redes e notebooks para a realização de scouts. A Liga conseguiu perceber (olhou com olhos de gestora) que, entrando como fornecedora de scout para todos os clubes, conseguiria baratear o que cada clube teria de gastar caso fossem investir separadamente nessa tecnologia.

É uma lógica simples até certo ponto de vista, mas que, há tempos, o futebol não consegue em sua maioria adaptar, ora julgando alguns de seus defensores como idealistas e acadêmicos demais, ora classificando os administradores que trazem novas ideias por meio da famosa tirada: “Jogou onde esse indivíduo de terno e gravata?”.

Esquecendo-se muitas vezes que esses acadêmicos podem fazer as equipes atingirem níveis técnicos mais apurados e garantirem seus empregos e salários elevados por mais tempo se tiverem um espetáculo lucrativo.

Vale a pena refletir…

*http://maquinadoesporte.uol.com.br/v2/noticias.asp?id=14652

Para interagir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br

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Ficar berrando na beira do gramado: pré-requisito para ser treinador?

Assistindo a um jogo da Copa do Mundo 2009 de futebol sub-17, entre as seleções da Nigéria e da Espanha, pela internet, me chamou a atenção um diálogo entre o narrador e o comentarista da partida, que de certa forma não entendiam como o treinador de uma das equipes (o da Nigéria) podia permanecer sentado durante todo o jogo sem passar instruções ao seu time.

O narrador questionava a real “utilidade” de se ter um treinador sentado o tempo todo no banco de reservas. O comentarista completava dizendo que para essa faixa etária (jogadores sub-17), já se podia considerar futebol de “alto nível competitivo”, e que portanto o treinador devia, mas não precisava, ficar o tempo todo na beira do gramado passando as suas instruções – e “emendou” que a ação do treinador no campo falando aos jogadores era dependente da idade e experiência dos jogadores: quanto mais jovens e inexperientes, mais “ação” do treinador na beira do campo (e ainda completou: “claro, mas sem “xingar”).

Existem tantas coisas nas entrelinhas das colocações do narrador e do comentarista que poderíamos ficar muito tempo debatendo o assunto. Porém, para ser breve, focarei a questão em alguns pontos que considero mais importantes.

O jogador de futebol vive em sua profissão, o mesmo que muitos trabalhadores em seus empregos, diariamente. Um engenheiro, quanto mais pratica seus conhecimentos e se mantém atualizado a novas descobertas, mais se qualifica como engenheiro. Quanto mais um médico, especialista em determinada “modalidade” cirúrgica, realiza cirurgias, melhor e mais qualificado se torna como cirurgião.

Isso vale para qualquer prática profissional. Quanto mais fazemos determinada coisa, quanto mais nos deparamos com novos problemas nesse fazer, mais vamos aprendendo sobre aquilo que fazemos, e mais preparados vamos ficando para fazer mais e melhor.

Então, em tese, jogadores profissionais devem fazer melhor aquilo que fazem, do que jogadores sub-20, e esses melhor do que os sub-17, que fazem melhor do que os sub-15, e assim sucessivamente.

A prática de jogar leva os jogadores a um jogar melhor, constantemente (ou assim deveria ser!).

Nessa perspectiva, a figura do treinador desempenha papel de grande importância, na medida em que ele (o treinador) é o agente facilitador e potencializador do conhecimento e aprendizagem dos jogadores. Em outras palavras, o treinador é aquele que, com seu trabalho, leva jogadores e equipes ao melhor entendimento do jogo e à melhor maneira de resolver os problemas presentes nele.

Isso vale do professor da escolinha de futebol da periferia, da cidadezinha do interior, ao treinador de uma equipe profissional que disputa a final de uma Champions League. A diferença está nos conteúdos que serão desenvolvidos para a construção do melhor entendimento do jogo (de acordo com a zona de desenvolvimento que cada um se encontra).

O fato é que, independentemente do nível de conhecimento para jogar (conhecimento complexo: “físico, tático, técnico, psicológico”), treinadores/professores deveriam ensinar seus jogadores/alunos para a autonomia. Isso quer dizer em outras palavras que o jogador deve aprender e ser preparado para agir/decidir sozinho, da melhor maneira possível, para ele individualmente e para o grupo (a equipe) ao mesmo tempo.

Educar para a autonomia é o oposto distante do que muitos treinadores fazem – e acabam sendo desmascarados no principal sintoma da sua atuação: os berros na beira do gramado tentando corrigir posicionamento ou “forçando” que uma ação qualquer de seus jogadores aconteça.

Conheço muitas escolinhas de futebol na região onde moro. O que vejo com frequência avassaladora é que treinadores se comportam mais como “adestradores” do que professores. E o que é pior, reproduzem aquilo que veem na TV: treinadores berrando e xingando na beira do gramado.

Mas como se espelhar em um exemplo que está errado? Como se espelhar em treinadores que reproduziram, e continuam reproduzindo, o que outros faziam com eles quando jogavam?

Conheço bons profissionais no futebol. Nas escolhinhas e no alto nível. Muitos deles têm que encenar na beira do campo, fazendo gestos e até berrando para manter seus empregos e não serem chamados de “passivos” e sem “fibra” pela imprensa (ou pelos pais, de “sem comando” ou “desmotivados”).

Voltando ao início do texto, o treinador da Nigéria ficou quase que o tempo todo no seu canto. Certo (talvez!?) que sua equipe sabia exatamente o que fazer, que ele poderia confiar na decisão dos seus jogadores. Como sua equipe venceu, os comentários não ganharam força.

Como não têm as informações que deviam ter, narrador e comentarista aprenderam menos do deviam ter aprendido, e um dia certamente farão de outro treinador uma vítima. Basta que ele perca o jogo!

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br  

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Estabilidade contratual – Conferência Internacional da EPFL

Caros amigos da Universidade do Futebol,

A estabilidade contratual (contractual stability) é um dos pilares do Regulamento de Transferências de Jogadores da Fifa, e um dos mais importantes princípios do futebol moderno.

De acordo com referido Regulamento, clubes e jogadores devem respeitar os contratos firmados, evitando rescisões sem justa causa e transferências no decorrer das temporadas.

Tudo isso em prol de um futebol mais consistente e de uma segurança jurídica maior para empregados e empregador.

A EPFL, Organização das Ligas Profissionais de Futebol da Europa, promoveu uma conferência internacional, em Florença, na mesma ocasião da realização de sua assembléia geral.

O tema principal da conferência, que reuniu grandes juristas de direito desportivo internacional, foi o princípio da estabilidade contratual. As ligas, apesar de apoiarem a Fifa na proteção e manutenção de tal princípio, levantaram uma série de pontos (chamado grey areas) do Regulamento que devem ser aperfeiçoados.

Na Europa, a União Européia promove o Diálogo Social, uma espécie de plataforma estabelecida pelas autoridades públicas para trazer empregados e empregadores na mesma mesa e dirimirem, de forma preventiva, questões do seu dia-a-dia. Já existe o diálogo social no futebol profissional. As ligas entendem que essa plataforma poderá auxiliar, de forma única, o desenvolvimento de ferramentas para promover a estabilidade contratual e outras questões laborais que possam aparecer.

Não há dúvidas que devemos nos espelhar nesses exemplos e também promover melhores relações laborais no Brasil.

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Ciclos

Existem poucas verdades absolutas.
No futebol, naturalmente, também.

Entre essas poucas verdades, uma delas é que o futebol é cíclico.
Coisas vem e vão.
Pessoas aparecem, somem e reaparecem.
Injustiças acontecem com você agora e, amanhã, acontecerão com seus adversários.
Seu time domina hoje e será rebaixado em pouco tempo.
É assim que as coisas vão.
E vem.
No curto prazo, é tudo insano.
No longo, as coisas fazem mais sentido.

Essa é uma das peculiaridades do futebol.
A coisa no curto prazo é maluca.
E leva pessoas a tomarem atitudes imponderadas.
Por não conseguir e não poder enxergar as coisas no longo prazo.
O afã do próprio eu, somado ao imediatismo da demanda de segundos e terceiros fazem com que se tomem atitudes impensadas.
Motivadas por impulso.
Momentâneas.
De curto prazo.
Sem lógica.
Sem sentido.

Isso é visível durante e após partidas mais conturbadas.
Mas tem implicações maiores.
Não se enxerga o longo prazo no futebol brasileiro.
Porque ninguém se importa com ele.
É preciso resolver o agora.
É necessário se importar com o já.
Mais pra frente, outro que se vire.
O meu é aqui, e agora.
O depois, que fique para depois.

De que adianta montar uma estrutura sustentável para vitórias futuras se ela implica em derrotas no presente?
Nada.
Absolutamente nada.
Independente se as atitudes que se tomem sejam efêmeras.
Ninguém quer saber.
Foca no relógio.
E não no calendário.
E o relógio dá voltas.

O presidente do Palmeiras sentiu isso na pele.
Foi um exemplo claro.
Quem foi prejudicado ontem é beneficiado hoje.
E será prejudicado novamente amanhã.
Quem se preocupa, perde cabelo.
Quem percebe, assiste de camarote.

Mas não tem a mesma graça.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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Warren Buffett e o futebol – parte 1

Finalmente, consegui iniciar um curso básico sobre como investir na bolsa de valores.

Era algo que já despertava minha curiosidade, de interesse pessoal para compor meus investimentos. E também porque sempre vi um paralelo natural entre o mercado de capitais e o mercado de transferências de jogadores.

O mercado de ações é importante para formar um círculo virtuoso de crescimento econômico do país, ao financiar empresas e suas atividades, gerar e distribuir renda, que volta aos investidores, que compram mais ações das empresas, que, no fim, distribuem capital e voltam a captar recursos, renovando o processo.

E o que é uma ação? É a menor fração do capital de uma empresa.

No mercado efervescente de direitos econômicos sobre jogadores e sobre projetos esportivos, também os clubes se servem dessa estratégia para formar um círculo virtuoso de sustentabilidade financeira, ao financiar suas operações com terceiros, gerar e distribuir renda aos investidores, que compram mais direitos, renovando o processo.

Pausa: esse mercado, no futebol, não é regulado como o mercado de capitais. A prática dos negócios é que dá o tom das transações entre clubes, jogadores e investidores. São negócios jurídicos que gozam de proteção relativamente instável.

Uma das primeiras perguntas feitas no curso é: por que investir em ações?

Como a intenção é cotejar ações frente aos investimentos em clubes de futebol, pergunto: por que investir no futebol?

Vou me socorrer também de uma das primeiras lições do curso, que trata de valorizar a sabedoria do maior investidor da história do mercado de capitais em todo o mundo, o americano Warren Buffett.

Sua atuação está baseada na sensatez, simplicidade e na postura conservadora – ainda que dentro de um sistema tido como altamente volátil.

Aqui vão as regras positivas de Buffett para definir seus investimentos:

1. Ser do contra. Por exemplo, enquanto todos saem da bolsa, com medo e desconhecimento dos riscos, entre.

2. Invista em empresas estáveis e com desempenho, historicamente, acima da média. Não se entusiasme com estreantes.

3. Invista como analista do negócio, não como analista de ações. Nem sempre a relação custo-benefício de uma ação que vale R$ 25 é melhor que outra de R$ 50.

4. Compre ações como se comprasse a empresa toda. Boas ações vêm de empresas cujo modelo de negócios é simples e compreensível.

5. Seja sócio de quem não gostaria de ser concorrente. Ou seja, é melhor comprar ações da Vale, da Petrobrás, do Itaú, ou tentar abrir uma concorrente?

6. Confie no passado da empresa. Desconfie de promessas e expectativas futuras.

Não à toa, Buffet construiu e mantém sua fortuna de U$ 60 bilhões, ao longo dos últimos 50 anos, concentrada em 99% em ações. É acionista de grandes e sólidas empresas, como Gillette, GE, Kraft.

Para a melhor tomada de decisão, existem os mandamentos negativos de Buffett. Ou, o que não se deve fazer como investidor.

(Continua na próxima coluna)

Para interagir com o autor: barp@universidadedofutebol.com.br

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O árbitro… de novo!

Olá amigos! Depois de um breve período ausente, retornaria hoje com um assunto diferente, falaria do basquete. Isso mesmo, mas apenas para discutir os momentos em que vivem ambas modalidades (o futebol, logicamente, é a outra) no quesito de tecnologia de scout e do processo de gerenciamento.

Mas confesso que deixarei para as próximas semanas, afinal, um assunto neste fim de semana ganha novamente as manchetes.

O tema é recorrente. A cada rodada, ainda mais em fase decisiva, virou um hábito, após um resultado negativo, alguém sair disparando contra a arbitragem, uns com razão, outros com muita razão e alguns com nenhuma razão. De despreparo a má fé, os árbitros são alcunhados pelos diversos profissionais do meio.

Então, pergunto (desculpe-me o amigo leitor pela repetição): por que o futebol rechaça a tecnologia como auxiliar da arbitragem?

O que é difícil de compreender é que não são apenas alguns grupos que são contrários às ideias, mas quase todos eles. Todos! Inclusive aqueles que só se beneficiariam com essa questão. Seria bom para um futebol limpo, transparente e ético. Pensando bem, talvez, seja esse o problema…

Para os dirigentes, que investem, planejam (sic), a garantia de que os resultados sejam fiéis ao jogo, sem interferências injustas, serviria como atrativo para investidores e projetos que, às vezes, ficam ressabiados com os equívocos do futebol.

Para as federações, a certeza de que seu produto (os campeonatos) são sérios, coerentes e justos, agrega muito valor, embora muitos ainda acreditem no adjetivo “sem fins lucrativos” que fundamenta muitas federações.

Para os torcedores, a certeza de que seu time não será injustiçado, que derrota ou vitória podem ser cobradas e creditadas a elementos do jogo, desde o imprevisto até a capacidade técnica e de decisão de seus atletas e técnicos.

Para os técnicos e jogadores, a mesma coisa, a sensação de justiça, de reconhecimento de que os resultados são frutos de seu trabalho, seja ele bem ou mal executado.

E para os árbitros, que estão entres os maiores críticos da adoção da tecnologia com o receio de perder sua tão imponente autoridade em campo, seria uma ferramenta para manter a coerência, para ajudá-los a cumprir, com consciência limpa, a sua tarefa. E, para aqueles que acham que um dia a tecnologia poderia substituí-los, basta lembrar que a tecnologia é feita pelos homens. Então, cabe a nós, dentro de cada área do conhecimento, transmitir nossas carências para que a tecnologia seja nosso instrumento e não nosso substituto.

Vai uma dica de um interessante artigo que li apresentado no 1º Encontro da ALESDE “Esporte na América Latina: atualidade e perspectivas”, em 2008, no Paraná[i] intitulado “As regras do futebol e o uso de tecnologias de monitoramento”.

Lá, foram apresentados alguns olhares sobre a aceitação ou não da tecnologia auxiliando a arbitragem no futebol. Uma, em especial, chamou a atenção, o relato de Julian Carosi, da Federação Inglesa de Futebol:

Apesar de eu poder entender as razões comerciais pela defesa do uso de tecnologia, pessoalmente não sou favorável ao uso de [toda e] QUALQUER tecnologia. Tem-se falado particularmente do uso de câmaras para se decidir se a bola cruzou a linha do gol ou não […] Mas, e com relação à maioria dos árbitros que apitam nos estádios comuns onde a tecnologia jamais será usada? Eu sou um grande defensor de que os erros genuínos cometidos pelos árbitros e pelos jogadores são parte fundamental do próprio jogo ? esta é a razão pela qual o futebol atrai tanta gente em todo o mundo. Tire os erros e você pode muito bem ficar em casa sem fazer nada! […] Eu acho que vamos descer uma ladeira muito perigosa com a utilização de tecnologia ?especialmente se nossas decisões forem constantemente mudadas pela opinião de alguma máquina glorificada ou de um grupo que se reunirá dois dias após o jogo ter acabado. Eu acho que essa discussão acerca do uso de tecnologia no futebol bate fundo nos meus nervos, pois pessoalmente sou completa e totalmente contrário pelo seguinte: ?o uso de tecnologia é inversamente proporcional ao desaparecimento do jogo?. Em outras palavras, a grande coisa do futebol é sua imprevisibilidade e os erros cometidos pelos jogadores, técnicos e árbitros. Sobre o que falaríamos se robôs mandassem no jogo?“.

Observando e tentando realmente entender o ponto de vista, a única coisa que me vem à mente é: se errar é humano e, diz o ditado, persistir no erro é burrice, defender o erro seria o que?

Por outro lado, prefiro ficar com a manifestação de um técnico, hoje, referência mundial, ainda que alguns insistam em diminuí-lo (apenas pelo fato de ele aumentar-se exacerbadamente), mas que já provou a importância das ciências humanas e, com essa afirmação, comprova sua preocupação com o desenvolvimento justo e coerente do futebol
Com a palavra José Mourinho, em entrevista ao jornal Expresso de Portugal:

Eu acho que a história dos árbitros é uma história interminável e só a tecnologia poderá melhorar as coisas. Não entendo como numa indústria tão forte como é o futebol, a tecnologia na arbitragem não existe. Ela reduz os erros e ao reduzir os erros, reduz a crítica e a suspeição. E reduz a responsabilidade dos árbitros. Uma coisa é um fiscal de linha decidir um jogo por um fora de jogo mal assinalado, outra coisa é a tecnologia substituir o fiscal de linha numa decisão crucial. A tecnologia no futebol é o fim de todos os problemas que possam existir”.

Talvez esteja pensando de forma equivocada, afinal, como diriam alguns, o que seria do futebol sem polêmica?

O que me incomoda é ouvir isso de quem “defende” um futebol moderno e profissional. Será que polêmica é sinônimo de injustiça…?

[i] http://www.alesde.ufpr.br/encontro/trabalhos/21.pdf

Para interagir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br

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Técnico ganha jogo, mas não campeonato

O Palmeiras moveu mundos e fundos para contratar Muricy Ramalho no meio do ano. Depois de chegar ao limite do tolerável com Wanderley Luxemburgo, a diretoria do clube decidiu que era hora de ser “ousado”, de mostrar “vontade de ser campeão”. E aí, ninguém melhor do que o treinador tricampeão nacional para recolocar o Palmeiras na trilha das vitórias.

Muricy assumiu o clube na vice-liderança do Brasileirão. Após um início capenga com Luxemburgo, a equipe deslanchou com o interino Jorginho, deu uma arrancada que o deixou próximo à liderança, consumada apenas quando o treinador assumiu o comando do time.

Desde então, foram quase 20 rodadas com o Palmeiras no topo da tabela da principal competição do país. Até que, a cinco jogos do final do campeonato, Muricy deixa a liderança e a entrega para o São Paulo, não por coincidência o clube onde o mesmo treinador foi tricampeão nacional…

A emblemática queda do Palmeiras no Brasileirão tem pouco a ver com o treinador que está no comando do time. A melhor campanha neste ano, até agora, foi justamente com o técnico menos experiente, Jorginho. O fato é que, numa competição no sistema por pontos corridos, um técnico pode até ganhar um jogo, mas dificilmente leva o campeonato.

Ser campeão num torneio de 38 rodadas exige, acima de qualquer outra coisa, um time com muito mais do que 11 jogadores titulares. O ideal é que sejam 15 a 20 atletas em condições de entrar em campo e não deixar o ritmo da equipe cair. Mais do que isso, não basta também ter uma equipe talentosa dentro de campo, é preciso ter estrutura, não apenas física, mas gerencial.

O São Paulo na reta de chegada para ser o primeiro tetra nacional seguido sabe muito bem disso. Tanto que, apesar da saída de Muricy, soube se readaptar a um novo treinador e, agora, está muito próximo de consagrar o clube mais uma vez campeão do país.

O chororô de qualquer outro time ou torcida não passa pelo óbvio. Não é o São Paulo que tem “sorte”, mas sim estrutura. O clube é um dos poucos do país a pensar na temporada durante todo o ano, com peças de reposição na equipe principal, com pessoas trabalhando para melhor e mais rapidamente recuperar atletas, para desgastar menos o clube com viagens, etc.

A derrocada de Muricy no Palmeiras tem muito a ver com isso. Entre os times que estão na disputa do título do Brasileirão, ele foi quem menos reforçou a equipe na janela de transferência. Na reta decisiva, as lesões de Pierre e Cleiton Xavier foram absolutamente sentidas, sem haver atletas à altura para substituí-los.

Nessas horas, nem um bom treinador é capaz de resolver o problema. Afinal, o limite do seu trabalho, notadamente, é quando a bola começa a rolar…

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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A psicologia tática, Mourinho e os treinos complexos

Em um dia desses, durante uma conversa informal com um colega jornalista, foi-me apresentada uma questão interessante e que, talvez, fosse tema de uma de suas matérias.

Eu dizia a ele sobre as vantagens e porquês de se trabalhar no futebol, de maneira complexa, integrando as dimensões “física, técnica, tática e psicológica”. Explicava sobre a imprevisibilidade do jogo e como preparar jogadores e equipes para ela.

Depois de muita conversa, ele (meu colega jornalista) lembrou da final da Copa do Mundo de 2006, entre as seleções da Itália e a da França - mais especificamente, da expulsão do grande jogador francês, Zinedine Zidane - e perguntou como seria trabalhar sob o ponto de vista da complexidade, o aspecto psicológico integrado às demais dimensões do jogo.

Grande colega jornalista!

Essa questão permite uma série de reflexões e discussões. Proponho então, sem querer ser psicólogo - o que não sou - que “passeemos” por uma ou duas delas.

O jogo de futebol possui inusitadas circunstâncias. Muitas decisões precisam ser tomadas sobre grande pressão temporal e espacial. Um erro, e tudo pode ir “água abaixo”.

A ação (física, técnica, tática e/ou psicológica) do jogador pode definir inúmeras situações de acertos e/ou erros, de êxitos e/ou fracassos, e mudar toda a história de um jogo.

Tomar uma decisão errada e fazer um passe que gere um contra-ataque adversário é tão grave para quem joga, quanto tomar uma decisão errada, dar uma cabeçada em um adversário e ser expulso.

Porém, como não percebemos a “sutil e complexa similaridade” entre uma situação de decisão e outra (passar errado a bola e dar uma cabeçada), é comum que, pautados pelo paradigma tradicional cartesiano, acreditemos que na primeira (o passe errado) ocorreu uma falha técnica, e na segunda (a cabeçada), um desequilíbrio emocional (como se o pé que passou se separasse da cabeça que pensou - “não temos um corpo, somos um corpo!”).

Para me fazer mais claro, neste momento, e antes de prosseguir, vou recorrer a uma fala do treinador português José Mourinho, em um trecho do livro Um ciclo de vitórias, comentando sua passagem pela equipe do Benfica de Portugal: “(…) havia a questão da agressividade no treino, que era inexistente. Algumas ‘individualidades’ simplesmente não queriam que houvesse o mínimo de agressividade nos treinos. Resultavam daí que treinavam sem caneleiras, logo sem contacto e sem situações competitivas. Os treinos no Benfica eram, no mínimo, caricatos. Diariamente, um grupo de bons rapazes dava uns toques na bola, fazia umas corridas e era tudo“.

Vale aqui, antes de nada, destacar que a “agressividade” mencionada por Mourinho, não se trata de “violência”, mas de competição, desafios, conflitos específicos do jogo, situações-problema, etc. Coisas que estão presentes no jogo formal, e que, portanto, precisam estar presentes também nos treinos.

Se, por exemplo, em uma sessão de treinos composta por jogos com regras específicas que propiciem o desenvolvimento de um jogar desejado, aquele que o comanda (o treinador) para o treino a qualquer disputa mais acirrada, ou sucumbi a reclamações constantes de faltas, estará potencializando o comportamento “reclamão” dos jogadores e uma postura mais passiva, menos “dura” nas disputas de bola - direta e indiretamente “subtraindo” o comportamento competitivo de jogadores e equipe.

Não estou, com isso, defendendo a “deslealdade” entre companheiros de profissão, nem, tão pouco, a omissão de quem comanda os treinos. Estou defendendo, com o exemplo supracitado, que, mantendo-se a lealdade nas disputas, o treino seja tão duro quanto seria o jogo, de maneira que os jogadores se acostumem não só a uma constante e incisiva competição, como também a focarem-se na partida e nos conflitos que decorrem da lógica - e não nas decisões certas ou erradas dos árbitros; afinal, treino tem que ser jogo, e jogo tem que ser treino! Estou defendendo que a postura do treinador seja complexamente pedagógica!

Um treino que se paute, que esteja subordinado ao jogo, promoverá inúmeras e inusitadas circunstâncias próprias da partida, com seus conflitos, disputas e problemas típicos. A maneira de atuar do jogador deve ser o “comportamento de jogo”, de acordo com seu ambiente, e não uma variável da dimensão psicológica, física, técnica ou tática.

Quando um jogador age, expressa em sua ação, sua intencionalidade, seu “eu total”; e o “eu total” não é psicológico, ou físico, ou técnico, ou tático. Seu “eu total” é psicológico e físico e técnico e tático, ao mesmo tempo, o tempo todo.

O “jogador total” joga. Então, precisa ser preparado por meio de uma exposição permanente às circunstâncias de jogo para que, no jogo formal, possa acertar mais do que errar.

E o Zidane?

Bom, agora deve ter aprendido. Certamente não fará mais a mesma coisa em circunstância similar… O problema é que o tempo não anda para trás (ou anda Einstein?), e a Copa do Mundo de 2006 já foi vencida pela Itália.

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Direito federativo x Direito econômico

Caros amigos da Universidade do Futebol,

Tendo recebido algumas sugestões de pauta, decidi dedicar essa coluna para esclarecer a questão dos direitos federativos e os direitos econômicos dos jogadores.

Como temos noticiado neste espaço reiteradas vezes, a Fifa tem demonstrado, nos últimos anos, insatisfação em ver transferências de jogadores sofrerem influências de empresas, fundos, investidores, entre outras partes fora do mundo do futebol. A prova disso é a criação do Artigo 18bis nos Regulamentos de Transferência de Jogadores da Fifa, que proíbe a interferência de terceiros no futebol.

Em outras palavras, a Fifa gostaria apenas que federações, clubes e jogadores tivessem voz ativa na movimentação de atletas. E que investidores pudessem aplicar fundos no futebol, mas que não interferissem diretamente na ¨propriedade¨ dos direitos sobre o contrato dos jogadores.

Muito bem. Nessa medida é que chegamos ao tema desta coluna. O que seria a propriedade sobre o contrato dos jogadores.

O clube de futebol (empregador) detém os chamados direitos federativos. Como o próprio nome sugere, é titular desse direito quem possui o direito associativo perante uma federação de futebol ligada à Fifa. Como apenas os clubes podem ser associados às federações, não é possível que outras partes (investidores, fundos, etc) detenham os direitos federativos.

Ocorre que esse direito federativo gera um direito econômico aos clubes. No passado, esse direito era representado pelo passe. Hoje, com a extinção desse instituto, temos a cláusula penal nos contratos dos atletas profissionais que dá o direito de o clube de origem cobrar do jogador e/ou de seu novo clube uma indenização pela rescisão antecipada de tais contratos.

Como a própria Fifa prevê em seus regulamentos, apesar do Artigo 18bis, a legislação nacional de cada país deve ser respeitada, na medida em que aplicável. Dessa maneira, os clubes passaram a se utilizar da permissividade da legislação brasileira para cederem a investidores esses direitos econômicos gerados pelos direitos federativos de seus jogadores. É uma espécie de securitização do valor que eventualmente receberia na venda de seus jogadores.

Essa cessão é perfeitamente aceita pela legislação brasileira, por tratar-se, em princípio, de um contrato que pode conter todos os requisitos legais para tanto.

Desta forma, apesar de não agradar à Fifa, temos a existência tanto do direito federativo como do econômico. A questão importante é que, no caso de uma eventual execução desses direitos, as partes somente poderão recorrer à Fifa (que, por vezes, pode ser mais célere e mais eficaz) com relação aos direitos federativos e econômicos, caso as partes sejam da família da Fifa. Caso contrário, vão ter que recorrer à justiça comum brasileira.

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A Laranja Mecânica

Aquele borrão de camisas laranjas marcou a minha e a vida de todos os que amam futebol na Copa-74. A coluna vai trazer a história de cada uma das sete partidas holandesas no Mundial da Alemanha. Um pouco do tudo que deixou nos gramados a Laranja Mecânica, inesquecível manjar tático, físico e técnico também chamada de “carrossel holandês”. O que não significa realmente tudo aquilo que se viu - ou que se quis ver - no chuvoso verão alemão.

Começamos pela brilhante estreia contra o Uruguai, quarto colocado na Copa-70. Ainda com alguns grandes jogadores. Mas não mais com um grande futebol.

UM LADO DO JOGO - Pedro Rocha, meia-esquerda e craque uruguaio: “O nosso treinador só sabia que a Holanda tinha bons jogadores - pediu atenção especial para o 14, o Cruyff. O nosso volante, o Montero Castillo, disse para deixar com ele, que o Cruyff não iria andar em campo - pois é. No intervalo, perguntei ao Castillo porque ele não conseguira fazer o que prometera. Ele me disse: ‘Mas, como? Eu corria atrás dele o campo todo e ele não parava? Como iria segurá-lo? Não dava nem para dar porrada’. Foi um vareio que tomamos. Dois a zero foi pouco”.

OUTRO LADO – Johan Cruyff, gênio holandês: “Estávamos muito nervosos. Além de aqueles 11 nunca termos atuado juntos, cinco jogadores estreavam em algumas funções. O goleiro era novo na equipe. O Haan e o Rijsbergen não haviam atuado daquela maneira. O Jansen demorou a chegar ao elenco. O Haan teve de ser zagueiro – era volante. O Jansen ocupou o lugar dele – embora atuasse na mesma posição do Neeskens - o próprio Neeskens teve de se sacrificar. Eu não estava 100% fisicamente. Perdemos nosso zagueiro Hulshoff por contusão. E tudo isso junto, num só jogo, o da estreia? Não sei como tudo funcionou tão bem. Não tínhamos um time antes da estreia. E quando acabou o jogo, tínhamos uma senhora equipe. Todos correram muito, se doaram bastante. Deveríamos ter feito mais gols. Mas essa é outra questão. Para mim, futebol é criar chances de gol. Fazer o gol é um tanto casual e está fora do futebol. Depende de um monte de circunstâncias: sangue-frio, casualidade, sorte, falha contrária…”

LOCAL: Niedersachsenstadion, em Hannover, Alemanha. 15 de junho de 1974. 16h locais. 53.700 pagantes.

PLACAR VIRTUAL DE CHANCES CRIADAS – HOLANDA 17 X 1 URUGUAI

HOLANDA – 4-3-3 – Jongbloed (8); Suurbier (20), Haan (2), Rijsbergen (17) e Krol (12); Jansen (6), Neeskens (13) e Van Hanegen (3); Rep (16), Cruyff (14) e Rensenbrink (15). Técnico Rinus Michels.

URUGUAI – 4-3-1-2 – Mazurkiewicz (1); Forlán (4), Jáuregui (2), Masnik (3), Pavoni (6); Montero Castillo (5), Mantegazza (1) e Espárrago (8); Pedro Rocha (10); Cubilla (7) e Morena (9). Técnico Roberto Porta.

LANCE A LANCE:

COMEÇOU – Cruyff dá o primeiro toque na bola de um time histórico, tocando a bola para Van Hanegen.

40s – Bela caneta de Espárrago sobre Jansen! É a vitória da escola sul-americana sobre os robóticos europeus!!! Sei… Sei…

2min – O veterano (pleonasmo para aquela equipe uruguaia) ponta-direita Cubilla (34 anos) corta rumo à ponta-esquerda. O lateral-esquerdo Krol o segue individualmente. Marcação opressiva holandesa. Homem a homem.

3min – Falta feia do Uruguai – outro pleonasmo. Falta dura do são-paulino Forlán – outra redundância. Embora não tenha intencionado esquartejar Neeskes, o fato é que o lateral-direito arrancou a carne do meia holandês, na primeira de uma longa série de infrações sul-americanas.

5min – Belo lance de Cruyff pela esquerda, Masnik dá um balão para longe. Impressionante (à época?) a marcação obsessiva holandesa no campo rival. Jansen (sobretudo), Neeskens e Van Hanegen dão o bote num campo mais “curto” que o habitual àqueles tempos.

6MIN – GOL. 1 X 0 HOLANDA. REP. Troca de bola desde a defesa, pelo lado direito. O lateral Suurbier (29 anos) abriu pela direita o jogo com Cruyff. O centroavante (teoricamente?) pegou a bola no meio-campo (como um armador), passou bonito por dois rivais e devolveu ao lateral que mais parecia um ponta, que cruzou de canhota, no meio da área. O ponta-direita Rep (23 anos) subiu como um centroavante, ganhou do zagueiro Jáuregui (28), antecipou-se ao excepcional Mazurkiewicz (goleiro do Atlético Mineiro, 29) e abriu o placar. Dentro da área uruguaia, eram quatro famintos holandeses.

10min – Montero Castillo (30 anos) tenta operar as amígdalas de Neeskens. O Uruguai só bate. Time de alguns grandes jogadores (envelhecidos) é atropelado pela técnica e velocidade laranja. À frente, Cubilla corre, e o grande artilheiro Morena segue isolado pelo esquema tático de Porta. Desse modo, Suurbier ganha liberdade para apoiar sem ser incomodado pelo lado direito. Krol ainda se entretem com Cubilla. Mas nada que tire o descanso do goleiro Jongbloed (33). Na falta, em vez de ser registrado um B.O., o árbitro húngaro Palotai não deu nem amarelo.

11min – Sem bola, o bom meia Espárrago (29 anos, do Sevilla), tromba com Cruyff. Na sequencia, o 14 laranja deixa no bagaço meio time até o centroavante Morena voltar ao próprio campo e dar um pontapé no craque rival. Falta feia. Amarelo? Só o sorriso do juiz.

12min – Espárrago sai pelo lado esquerdo do meio-campo uruguaio. Seis holandeses estão em volta dele.

13min – Apenas o zagueiro-esquerdo Rijsbergen fica atrás. E além do meio-campo de ataque holandês. O Uruguai não está atrás. É empurrado para trás pelo time laranja.

19min – Fora o gol, chance, mesmo, mais nenhuma holandesa. Até porque, pela segunda vez em que entrou em diagonal, do centro para a ponta esquerda, Cruyff foi travado. Mas a bola continua toda laranja.

20min – Outra vez Cubilla tenta escapar pela esquerda, de noo Krol o acompanha. A bola sai pela linha lateral. O Uruguai está morto.

22min – Aleluia! Defesa de Jongbloed, que joga adiantado, e saiu muito bem numa bola em que não era preciso sair. O goleiro de 34 anos usa lente de contatos e era a terceira opção de Rinus Michels. Os dois melhores se machucaram e ele veio para o time principal pela primeira vez.

22min – O lance que representa a essência do Futebol Total holandês (“totaalvoetbal”): a bola é recuada pela meia-esquerda para o campo uruguaio. O zagueiro-direito Jaurégui tenta lançar o meia Mantegazza, na ponta direita. No bote para tentar recuperar a bola e/ou deixar o time uruguaio impedido, 10 (!!!) holandeses, em bloco, se adiantam e fazem o pressing opressivo. Pela primeira vez na história da Laranja Mecânica e do futebol mundial. O condutor do avanço para armar a maior linha de impedimento vista era o volante Jansen (27 anos). Observe que a área ocupada pelos 10 laranjas é inferior a 15 metros.

24min – Mantegazza leva o primeiro amarelo. Ufa. O Uruguai não consegue passar da própria intermediária. Ou passa mal a bola ou é engolido pela obsessão rival em marcar a saída de jogo lá na frente.

30min – Outra porrada de Mantegazza no hábil meia-esquerda canhoto Van Hanegen (30). A Holanda corre, cria, marca, mas não chuta. O Uruguai insiste em sair jogando com o lateral-esquerdo Pavoni. Mas a bola não passa do meio. Talvez um chutão para o isolado Morena seria uma solução? O craque Pedro Rocha está engolido pelo múltiplo Jansen.

35min – Krol sai da lateral, vai cortando pelo meio e manda o balaço, por cima da meta. Apesar de o centroavante todocampista ser Cruyff, falta, de fato, um goleador a Rinus Michels. Um 9 de ofício.

38min – Suurbier pega mal o sem-pulo, livre dentro da área. Jansen cruzou da linha de fundo, e Rensenbrink ajeitou de cabeça. Em resumo: o volante cruzou como ponta, o ponta foi armador, e o la
teral-direito foi centroavante.

PLACAR VIRTUAL PRIMEIRO TEMPO – HOLANDA 3 X 0 URUGUAI

RECOMEÇOU – Antes do apito inicial, Pedro Rocha cruza com Cruyff, fala qualquer coisa, o holandês ri e o cumprimenta. Possivelmente deve ser um pacto de não-agressão holandesa?

1min – Aleluia! Chance de gol uruguaia!? Pedro Rocha livre, às costas de Suurbier, pega mal de canhota e perde boa chance. Desta vez, bote defensivo holandês abriu buraco na lateral direita.

3min – Uruguai resolve tentar jogar e parte pela direita. Lançamento feito para o ataque. A linha de impedimento laranja (composta por 6 atletas) deixa 6 (!??!) uruguaios impedidos.

4min – Forlán tenta esfolar Krol. Cartão amarelo para o uruguaio. A Holanda está com três atacantes na área, e mais os três meio-campistas e o lateral-esquerdo Krol marcando a partir de 25m do gol de Mazurkiewicz. Não era assim que se jogava. E, convenhamos, depois da Copa-74, também ninguém marcou igual.

5min – Jogada espetacular e ensaiada em cobrança de falta. O excelente Van Hanegen pega mal e isola, de sem-pulo. Mas todo o lance foi lindo.

5min – Menos de dois minutos depois de receber o amarelo (já tardio), o violentíssino Forlán entra de sola na coxa de Van Hanegen. O árbitro húngaro só chama a atenção do uruguaio. Hoje, pegaria um gancho de 6 meses no TJD, e os holandeses saíram no pau com o meigo lateral.

7min – Cruyff desarma Espárrago na lateral direita holandesa. O homem é uma máquina. Ou uma franquia. Parecem ter 3 Cruyffs em campo. E apenas cinco uruguaios no gramado.

8min – Forlán evita o gol de Rep, em belo lance de Neeskens pela ponta direita. O meia virou ponta, o ponta foi centroavante, depois de uma troca de bola inteligente, sem pressa, dos holandeses.

10min – O lateral Pavoni tropeça na bola e cai dentro da área holandesa. Mas foi a primeira vez que os uruguaios chegaram com 4 no ataque. Embora o ponta Cubilla pareça valer por 4 – em peso. Para piorar, Krol o marca individualmente. Cubilla até tenta atuar pelo outro lado. Mas Krol não deixa.

11min – O imenso Pedro Rocha faz bela jogada pela ponta direita. Mas Van Hanegen retoma a bola, com a ajuda de Krol e de Jansen. São 3 holandeses contra um uruguaio. Na zaga, troca de lado entre Haan e Rijsbergen.

12min – Jansen bate bem da meia direita para boa defesa do excelente Mazurkiewicz. Por estes minutos, Neeskens trocou de função com Cruyff. O 14 holandês resolveu fazer a de Neeskens, recuando e armando o time a partir da meia direita.

14min – Neeskens pega mal e a bola voa. Mas a tabelinha de Jansen com o ataque holandês é muito bonita. A Holanda alterna o 4-3-3 para algo próximo ao 4-2-4, com a penetração de Cruyff.

15min – UM ARRASTÃO. Ou um time de futebol americano pulando sobre o quarter-back rival. É o que aconteceu com Pedro Rocha, aos

15min. O craque são-paulino tentava organizar o que sobrava do Uruguai quando três holandeses deram o bote, e mais cinco se adiantaram ou para tomar a bola ou para deixar o Uruguai impedido. Isso na intermediária uruguaia. Nunca havia visto algo semelhante. E não se viu nada parecido depois. O desfecho do lance é de dar dó e nós nos uruguaios. São quatro holandeses em cima do pobre rico Rocha. O mais impressionante: fora o goleiro Jongbloed, todos os 10 de linha ocupam uma faixa de menos de 20 metros de campo. É o pressing que faria a fama do Milan de Arrigo Sacchi, no final dos anos 80.

16min – Cruyff manda a bomba, Mazurka manda a escanteio. Deixaram o 14 livre. O gol holandês amadurece.

18min – Milar (19) substitui o pregado e acabado Cubilla. Bom finalizador, de boa técnica, o atacante é a esperança celeste de diminuir as dores do atropelamento.

20min – Masnik chuta Neeskens, derruba o rival, e pula sobre o pé esquerdo do holandês. Na cara do bandeirinha. Nada acontece com o violento agressor. Apenas um amarelo tímido para o capião e feitor uruguaio.

22min. EXPULSO. Montero Castillo, pelo conjunto da obra, é expulso. Acertou sem bola Cruyff. Mas já havia feito 6789 infrações piores. A Holanda que já tinha 79 atletas a mais em campo fica com ainda mais espaço. O Uruguai passa a atuar no 4-3-2.

25min – Rensenbrink isola e perde gol fácil. Impressionante como finaliza mal o time laranja. O ponta estava livre, dentro da área.

26min – Suurbier manda no ângulo, Mazurkiewicz defende, sem dar rebote. Impressionante. Mas a jogada anterior de Cruyff sobre Jáuregui foi de cinema. O 14 rodopiou e escapou como se fosse uma Ferrari. Como é que Cruyff corria tanto se fumava ainda mais?

28min – GOLAÇO MAL ANULADO! Lindo lance de Van Hanegen com Cruyff. Ele levanta o pé e toma a bola no alto, da cabeça de Masnik, que se abaixa para tentar o corte. Não foi jogo perigoso. Foi um golaço pessimamente anulado, que saiu da história. Uma lástima. Depois do lance, Mazurka empurra a cabeça de Cruyff, que finge agressão que não aconteceu.

29min – Jansen invade a área livre, pela direita, e manda o balaço na trave esquerda. No rebote, Rensenbrink, da ponta esquerda, emenda para grande recuperação de Makurkiewicz. Um a zero é um placar mais que mínimo pela máxima diferença entre as equipes.

32min – Mais uma linha de impedimento que causa Óoooooo da torcida em Hannover.

38min – INCRÍVEL. A Holanda ficou quase 10min sem uma chance de gol!!!! O time parece um pouco cansado e, na experiência, e na violência, os uruguaios vão se salvando. Os lances pela direita continuam sendo o forte holandês. Suurbier não para e se apresenta muito bem, chegando fácil ao fundo, e cortando bem pelo meio. Mas as finalizações continuam sendo ruins. Ah se o Van Basten já existisse em 1974?

39min – Jaurégui ganha o cartão. De crédito do árbitro. Ele bate, segura, e nada. Uma vergonha. Mas a arbitragem, à época, usava bem menos os cartões.

41min – GOL. 2 X 0 HOLANDA. REP. Ufa! Tudo começou em mais uma saída errada uruguaia. O goleiro tentou lançar com as mãos, a bola foi interceptada rapidamente e foi parar na meia esquerda, para o cerebral Van Hanegen. Belo toque às costas de Forlán para Rensenbrink que, em ritmo de treino, rolou para dentro da área. Na marca penal, Rep só precisou tocar para o gol vazio. Belo gol.

43min – Cruyff aparece como o centroavante que deveria ser. Mas chega um pouco tarde? Jogou demais o craque holandês, e em todos os lances e cantos do campo. Mas faz falta um fazedor de gols. Os holandes finalizaram muito mal. Por isso não golearam. Embora continuem dando show até o fim.

44min – Neeskens chuta muito mal e fraco e perde a 17a. chance holandesa. Nove delas depois da expulsão de Montero Castillo.

46min – PÊNALTI!? Árbitro húngaro deve estar com pena dos uruguaios. Rep é derrubado dentro da área em carrinho claro de Masnik. Ele deixa o jogo seguir. E nenhum holandês reclama.

FIM DE JOGO – Um massacre de apenas 2 x 0.

 

Veja alguns lances do desempenho da Holanda no duelo



NOTAS:

HOLANDA 

Jongbloed – 7 – Como líbero, e por estar estreando na equipe, sem problemas. Até porque a bola não chegou.
Suurbier – 9 – Incansável, ofensivo, técnico, abusado, deu o cruzamento – de canhota – para o primeiro gol. Partidaço. Um dos motivos para a Holanda atacar tanto. E ainda mais pela direita.
Haan – 8 – Sem ser molestado pelo excelente Morena, pôde comandar a defesa holandesa com categoria. No segundo tempo, trocou de lado e manteve o ritmo.
Rijsbergen – 7 – Menos qualificado da zaga, mais duro, com menos recursos. Mas foi bem contra o inexistente ataque rival.
Krol – 9 – Futuro líbero, o lateral foi um segundo ponta-esquerda com a bola, e ainda anulou o gordito Cubilla, o acompanhando em todos os cantos.
Jansen – 9 – Marca, morde, comanda o impedimento, arma, finaliza. Meio-campista completo, de ótima técnica.
Neeskens – 8 – Apanhou demais. E também jogou demais. No segundo tempo, inverteu por vezes de posição com Cruyff.
Van Hanegen – 9 – Estilista, tem canhota privilegiada para passar. Elegante, só precisava entrar mais na área. Belo passe para o segundo gol.
Rep – 9 – Oportunista. É mais centroavante que ponta. Goleador.
Cruyff – 10 – O futebol total. Centroavante no primeiro tempo, meia, ponta e até volante no segundo. Hábil, ágil, incansável. Brilhante.
Rensenbrink – 7 – Deu a assistência do segundo gol, e apanhou demais de Forlán. Poderia ter rendido mais.
Rinus Michels – 10 – A culpa é toda dele.

URUGUAI

Mazurkiewicz (Atlético-MG) – 8 – Não fosse ele… Seguro, colocado, quase perfeito.
Forlán (São Paulo) – 4 – O lateral-direito sempre soube jogar. Mas sempre bateu mais do que a Convenção de Genenbra permitia.
Jáuregui (River Plate-URU) – 4 – Não é fácil enfrentar uma Holanda como aquela. O zagueiro-direito fez o que poderia.
Masnik (Nacional) – 3 – Fez pênalti não marcado, e deveria ter sido preso por pisão em Neeskens. O experiente zagueiro-esquerdo foi o retrato em preto e azul da falência da escola uruguaia em 1974.
Pavoni (Independiente-ARG) – 4 – O campeoníssimo lateral-esquerdo e capitão do Independiente argentino foi massacrado por Suurbier e Rep.
Montero Castillo (Nacional) – 1 – O volante disse que iria pegar Cruyff. Foi a única coisa que cumpriu. Só não disse que seria na porrada, e acabaria expulso.
Mantegazza (Nacional) – 3 – Tentou marcar Van Hanegen pela meia direita. Não conseguiu, e também não armou.
[Milar (Liverpool-URU)] – 4 – Entrou?
Espárrago (Sevilla-ESP) – 4 – O meia pela esquerda tentou ajudar Rocha e dar um pé aos demais companheiros.
Pedro Rocha (São Paulo)- 5 – O verdugo foi atropelado por colegas medrosos e pelo arrastão holandês. O brilhante meia-armador não foi visto em Hannover.
Cubilla (Nacional) – 3 – Correr, o ponta-direita correu, e até pelos dois lados? Mas, como o Uruguai, em 16 rpm, e contra um Krol que não o deixou em paz.
Morena (Peñarol) – 3 – Para um dos maiores centroavantes uruguaios que vi? Não foi visto. Esquecido pelo time.
Roberto Porta – O técnico? Uma porta. Mas quem salvaria os uruguaios contra os holandeses? Como atleta, foi goleador pelas seleções do Uruguai e também da Itália.

ÁRBITRO – Karoly Palotai (Hungria) – 4. Anulou gol legal, não deu pênalti no fim, deixou o Uruguai bater o jogo todo.
 
Na próxima coluna, um dos melhores empates sem gols da história das Copas: Holanda 0 x 0 Suécia

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