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Quem acompanha nossas colunas na Universidade do Futebol sabe que temos insistido muito com a importância do princípio da especificidade do esporte para o nosso mercado do futebol.
Temos que reconhecer, sim, que o esporte, e em especial o futebol, é uma atividade comercial comparada à qualquer outra, mas que possui especificidades que devem ser reconhecidas e respeitadas pelas diversas autoridades competentes, incluindo, mas não se limitando, ao nosso judiciário.
A indústria do futebol, para existir, necessita fundamentalmente de dois prinípios básicos: (i) a integridade do jogo dentro das quatro linhas, e (ii) a imprevisibilidade do seu respectivo resultado. Todas as interferências, de quem quer que seja, deve sempre ser balizada por regras e normas que protejam tais princípios.
Recentente acompanhamos grandes aquisições de clubes de futebol. Na inglaterra, por exemplo, temos investidoes americanos e russos e, recentemente, de árabes (sucedendo tailandêses). Mesmo no Brasil, tivemos experiências com MSI, ISL, etc.
É claro que investimentos são sempre bem-vindos. Porém, temos que ter cuidado com isso no que diz respeito a esse nosso mercado do futebol.
Em primeiro lugar, não podemos ter um conceito de “concorrência” no futebol comparado, ipsis litteris, com o de outros mercados. Como temos já previsto em diversos diplomas legais, inclusive no Brasil, temos que restringir a propriedade de clubes, para evitar que haja conflito de interesses (direto ou indireto, questão é de fato tênue), o que levaria a uma inevitável distorção dos princípios basilares acima mencionados.
Em segundo lugar, é preciso que se faça, já a nível regulatório, mas também com intereferência de autoridades públicas, um controle rigoroso e uma verificação de procedência criteriosa desses novos recursos entrando no futebol. Sabemos que o dia-a-dia de clubes de futebol, pela natureza das despeas e velocidade dos negócios, pode criar um ambiente favorável para envolvimento com atividades ilícitas.
Finalmente, devem ser revistas as atuais regras de transferências internacionais de jogadores, especialmente menores, para que sejam evitados (i) desvios de recursos; e (ii) abuso e exploração de talentos em troca de lucros à qualquer custo.
Fresh money para o nosso mercado é sempre bem-vindo, não importando a sua localidade de origem (não podemos cogitar em discriminação por nacionalidade). Porém, é preciso que esses recursos seja colocados dentro de um arcabouço jurídico apropriado, para evitar quaisquer prejuízos à imagem do nosso esporte.
Nessa medida é que o princípio da especificidade ganha grande relevância. Somente entendendo, reconhecendo e efetivamente aplicando corretamente esse princípio é que chegaremos (organizações desportivas e autoridades públicas) a um ponto de equilíbrio entre o ingresso de novos investidores no mercado e a manutenção da integridade do esporte e de seus resultados.
E finalmente teremos mais credibilidade no esporte, o que atrairá outros tantos investidores, gerando o devido crescimento sustentável. O futebol brasileiro anda precisando disso.
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Caótico, mas tranqüilo
Eis que agora quem patrocina o Manchester United são os Estados Unidos da América, literalmente.
Anteriormente, a influência estadunidense na equipe era privada, restrita a um investidor como dono e uma companhia como patrocinadora. Agora, porém, com a crise que assolou o mundo e particularmente a AIG, a patrocinadora do clube inglês, as coisas mudaram. Afinal, quem manda na AIG agora é o governo dos Estados Unidos da América. O nome por trás do patrocínio de uma das mais importantes equipes de futebol do planeta é ninguém menos do que George W. Bush, himself. Curioso, não?
Fica mais curioso se você considerar que o primeiro jogo pós Bush será contra o Chelsea, o símbolo de ostentação russa. De um lado, os EUA e sua mega-seguradora estatal. De outro, a Rússia e seus bilhões. Manchester United contra Chelsea será praticamente uma encenação daquilo que seria a Guerra entre EUA e Rússia, não tivesse ela sido fria. Obviamente que as distorções precisam ser relevadas. De um lado um comandante brasileiro. Do outro escocês. Os principais jogadores são portugueses, sul-americanos e africanos. De russo e de americano no campo, nada.
O contrato de patrocínio da AIG com o Manchester United prevê o pagamento de uns 190 milhões de reais ao longo de quatro anos. A princípio, o caos financeiro instaurado pelos irmãos Lehman e a pseudo-estatização da AIG não devem influenciar nesse pagamento. Até porque é um dinheiro que o Manchester United decididamente não pode abrir mão, principalmente com a recém aquisição dos seus vizinhos pelos petroleiros árabes. As declarações, por enquanto, são de calma e segurança. Mas com o mercado do jeito que está, vai saber. A grana da AIG responde por apenas uns 10% do faturamento anual do clube. Entretanto, a perda do montante pode colocar o clube em uma situação delicada. Ainda mais porque boa parte do dinheiro que permitiu a aquisição do Manchester pela família Glazer veio a partir de crédito bancário, cujas taxas também estão no olho do furacão desses últimos dias.
Mas não há razões para preocupação. Afinal, a segurança da torcida do Manchester United depende apenas do George W. Bush. O que pode sair errado?
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Aproveito o embalo do Mundial de Futsal, que vem por ai, para falar um pouco desta modalidade pela qual sou um apaixonado, e que é muitas vezes tida como o sucesso do futebol brasileiro, tendo toda vez que esse assunto é tocado exemplos e mais exemplos de jogadores que tiveram sua origem nessa modalidade.
Mas, dribles curtos, raciocínio rápido e pura habilidade deixaremos para os amigos acompanharem no decorrer do Mundial, a reflexão que faço aqui é sobre a mentalidade e o trabalho de PC Oliveira, técnico da seleção brasileira.
Não vivencio o dia-a-dia do treinamento da seleção, apenas vou refletir em cima do que conversei com o próprio PC no fim do ultimo ano e pelo que acompanho por informações e inclusive algumas palestras do próprio professor;
Professor sim! Sem o tom pejorativo que pode às vezes adquirir nesse tão “profissional” futebol brasileiro. No Futsal PC Oliveira desenvolve um trabalho no âmbito da tecnologia que merece ser destacado e servir de exemplo maior.
Passando pelos clubes do Brasil a fora quando conversamos sobre o uso de tecnologia e o papel do atleta e treinador nesse processo, ouvi e não apenas uma ou duas vezes, mas uma quase unanimidade, de que o jogador não tem competência, não tem paciência , não deve em momento algum lidar com as informações extraídas dos recursos tecnológicos (dados de scout, dados de testes físicos, dados nutricionais, evolução, desempenho, etc.) para não confundir-se.
Em outras palavras, me desculpem a franqueza, os profissionais do futebol tratam os jogadores como “burros”, justificando que por conta dessa “qualidade” não compreendem as informações, e que isso deve ser feito muitas vezes por pessoas com competência (ainda que a pessoa que julgam ter competência para isso tenha acabado de sair do gramado para comandar o banco). Mas isso são outros quinhentos. PC Oliveira também é um ex-jogador, mas alguma coisa de diferente ele procurou na carreira.
Dentre outras competências e habilidades do técnico da seleção de futsal destacamos a capacidade de lidar com a tecnologia, de incorporá-la no dia-dia da função. Análise tática, análise de scout, dentre outros tantos meios que utiliza. Mas o grande ponto que pretendemos referenciar é a interação que faz com os atletas, ou melhor, as condições que cria e exige para que lidem com o computador.
PC convoca a seleção e disponibiliza todo o planejamento de treino, as jogadas as seqüências para os atletas antes de se apresentarem. Os atletas manuseiam, criam novas situações e vão se acostumando com os sistemas, com a proposta, com os adversários, vão aprendendo a lidar com informação e as visualizam e transformam em prática posteriormente.
Certamente PC não deve considerar seus jogadores “burros”, nem tenta blindá-los de muita informação com o receio de perder o controle do seu trabalho. Acredita e isso faz parte de seu discurso que quanto mais reflexão e debate em cima do sistema de jogo, maior a compreensão, e nada como utilizar da tecnologia para criar e acelerar tais possibilidades.
Um dos argumentos do técnico é que se os jogadores têm competência para manusear os inúmeros aparelhos que compram imediatamente a cada novo lançamento (notebooks, ipods, DVDs players, palms, celulares), sem contar como lidam com internet, não seria um empecilho utilizar desses meios como ferramentas complementares na preparação da seleção, facilitando ainda mais a compreensão de jogo.
E outro ponto que PC Oliveira levanta é que se queremos desenvolver atletas inteligentes (pois afinal são eles que fazem a diferença) nada como estimular isso, e com os recursos tecnológicos é possível visualizar, criar, modificar, compartilhar, e aprender…
Como sempre ressaltamos, a tecnologia depende da capacidade de criar soluções por parte de quem usa.
A sorte geralmente acompanha quem trabalha e busca o sucesso com seriedade e comprometimento. Boa sorte PC, e que possa colher os frutos e cada vez mais mostrar as possibilidades que um técnico tem para se diferenciar.
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Pecado mortal
Dunga está cada vez mais próximo do adeus ao cargo de treinador da seleção brasileira. Pelo menos é isso que dá a entender a cada novo tropeço do time nacional. Na semana passada, o deus Dunga virou, de uma hora para outra, o adeus de Dunga.
Sim, porque, após o insosso 0 a 0 contra a Bolívia qualquer tipo de paciência e coexistência pacífica do treinador da seleção com a imprensa se esvaiu.
A começar pelo “editorial” de Galvão Bueno na Globo, logo após o término do jogo. Para começar, a emissora-mor do país fez dois intervalos comerciais antes de encerrar oficialmente a transmissão direto do Estádio João Havelange, quando o normal é apenas um. Depois, Galvão pediu publicamente desculpas ao torcedor pelo péssimo futebol apresentado pelos jogadores brasileiros. E, quando começaram as críticas mais ácidas ao comportamento do Brasil, as imagens mostradas, quase sempre, eram de Dunga, e não dos jogadores nacionais.
Foi a senha da Globo de que a paciência com o estilo Dunga de comandar a seleção acabou.
No dia seguinte, jornais de todo o país seguiram a mesma linha. Na capital paulista, “Folha de S. Paulo” e “O Estado de S. Paulo” disseram que a vitória da semana anterior, sobre o Chile, havia sido a “exceção” a um time “medíocre”, “sem vibração”, “sem padrão de jogo”, “retrancado” e outras expressões enaltecendo Dunga e Cia. Da mesma forma no Rio de Janeiro, Minas Gerais e até Rio Grande do Sul o tom de crítica era o mesmo.
Mas será que é só o futebol de baixo nível que a seleção tem mostrado o responsável por tantas críticas? Em 2001, quando viveu seu pior momento na história, o time nacional era comandado por Luiz Felipe Scolari, que perdeu nas oitavas-de-final da Copa América para Honduras! Nem assim os pedidos para a saída de Felipão ecoavam em todos os veículos.
A explicação para a falta de paciência da imprensa com Dunga está na relação diária de trabalho. Dunga ainda se comporta, com os jornalistas, como se fosse o capitão do time, e não o seu comandante, o responsável pela nau que hoje, parece, está à deriva.
Desde o início, quando na primeira entrevista coletiva teve de se explicar, entre outras coisas, pela convocação de figuras bizarras como Jônatas, então no Flamengo (que depois de ir para a seleção saiu do Fla e depois voltou para lá), e Afonso Alves, que Dunga vive às turras com os jornalistas.
Até aí tudo bem. Provavelmente nem no café da manhã com a família ele faça questão de ser simpático com alguém. Mas o que Dunga não percebeu é que, para ser técnico da seleção, é preciso, antes de qualquer coisa, ser um bom político.
Felipão, que obteve um prestígio público pouco visto nos últimos anos e talvez na história da seleção, costumava dizer que o período em que esteve no Cruzeiro (97 a 2000) havia lhe salvado a pele no comando do time nacional. Dizia ele que o jeito mineiro de ser transformara sua maneira de se relacionar com os jornalistas, o que lhe deu mais habilidade para cuidar da pressão que é dirigir o Brasil.
Dunga, porém, faz exatamente o oposto. Não é hábil para manipular a informação, para deixar a imprensa preocupada com alguma outra coisa que não a ausência de um jogador, a presença de outro, ou o péssimo resultado do time. As bufadas de Felipão nas entrevistas eram estratégicas, para que ele pensasse numa resposta e desviasse o foco de atenção de câmeras e fotógrafos. Até o jornalista achava graça quando vinha uma interjeição. E se esquecia de que o mais importante, que era a resposta à pergunta, começava a ser deixada de lado…
Para piorar, Dunga faz questão de, na mínima vitória alcançada, jogar na cara dos jornalistas que é “pé-quente”, “vencedor”, que tem “garra”. Palavras que, sem dúvida, são importantes na carreira de um jogador. Mas que não podem ser tão utilizadas por um treinador. Ainda mais num cargo de tanta visibilidade e tanto choque de interesse como o de técnico da seleção.
E assim Dunga começa a encaminhar-se para o crepúsculo de dois anos à frente da seleção. Vitorioso, sem dúvida, mas apenas dentro de campo. A inexperiência sempre foi apontada como uma fraqueza do treinador. A sua falta de passagens anteriores por qualquer time era vista como uma chance de fiasco à frente do Brasil.
Só que ninguém contava que a diferença poderia ser feita na inexperiência e inaptidão de Dunga em tratar com a imprensa. Diz ele que o problema foi ter cortado privilégios da Globo, cada vez mais dona do time nacional. Mas o pecado mortal foi não ter percebido ainda que o jornalista não é um inimigo, mas um meio de fazer o seu ponto de vista chegar ao público.
Quanto mais briga com a imprensa, mais Dunga prepara o seu espaço no hall de “ex-técnicos” da seleção brasileira. Independentemente do resultado do time dentro de campo.
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A seleção brasileira de futebol é, em princípio, aquela no mundo do futebol, que comporta a maioria dos melhores jogadores de todo o planeta. Jogadores bem treinados, bem alimentados e bem remunerados. Muitos são unanimidades.
Dia desses a seleção brasileira (a melhor?!) jogou (pelas eliminatórias da Copa do Mundo FIFA/2010) contra a seleção da Bolívia.
A equipe boliviana que não goza do mesmo prestígio da sua adversária, teria em tese jogadores menos “talentosos” que os brasileiros.
Antes do jogo era dada como “quase certa” pela imprensa brasileira e pelas quinas futebolescas uma vitória da equipe do Brasil (alguns apostando em uma grande vitória).
Pois bem, equipes aos seus postos e lá foi o jogo terminar em zero a zero.
A equipe boliviana, de acordo com seu modelo de jogo, estabeleceu uma estratégia bem definida. O Brasil, com uma leitura aparentemente inadequada da organização de jogo da seleção da Bolívia acabou enredado, quase sem saber o que fazer. As principais características inerentes ao futebol brasileiro (o jogo de velocidade, os passes rápidos, as mudanças de direção das faixas do campo e os dribles) acabaram sucumbindo ao sistema organizacional da equipe boliviana (que não foi nenhum primor).
Entendamos as armadilhas do jogo.
Contra a velocidade brasileira a seleção da Bolívia distribuiu-se em campo de forma compacta. Estreitou verticalmente o terreno efetivo de jogo em aproximadamente 30 metros a partir da linha 3 (linha do meio-campo).
Com o campo efetivo reduzido, os bolivianos conseguiram manter seus jogadores sempre próximos uns aos outros (resultado: dificuldade brasileira em imprimir um ritmo rápido de jogo).
A compactação bem definida aproximou as linhas de marcação bolivianas. Isso dificultou bastante a realização de jogadas individuais (dribles e conduções de bola em direção ao gol) da equipe brasileira porque possibilitou um sistema de coberturas eficientes quase que a todo tempo no jogo – e quando as coberturas falharam; faltas táticas.
O que o Brasil conseguiu fazer (e bem!) no jogo foi a circulação horizontal da bola, da direita para a esquerda e da esquerda para a direita; principalmente nas regiões anteriores a linha 3.
E é aí que residiu o problema importante. A equipe da Bolívia se organizou ofensivamente para progressões rápidas em direção ao gol e defensivamente para impedir a progressão da posse da bola a partir do meio campo. Isso quer dizer que quando o Brasil recuperava a bola no seu campo de defesa, os jogadores bolivianos buscavam, antes de qualquer ataque à bola, uma recomposição rápida para trás da linha 3. Ali se fechavam compactos e basculavam de um lado ao outro, fechando os corredores laterais e centrais.
O que eles queriam?
Que o Brasil circulasse a bola de um lado para o outro.
O que o Brasil fez para furar o bloqueio boliviano?
Circulou a bola de um lado para o outro.
Isso quer dizer que a seleção brasileira, com a intenção de progredir à meta boliviana, acabou por apostar na manutenção da posse da bola (circulando-a de um lado ao outro) como solução ao seu problema (chegar a meta boliviana).
Em outras palavras, o Brasil se apoiou em um princípio de ataque para conseguir cumprir outro (confusão!). O pior, é que o princípio de defesa dominante da seleção boliviana, acabou por induzir a seleção brasileira a exatamente aquilo que lhe era conveniente (conveniente a Bolívia) – ou seja, aquilo que o Brasil tinha como solução (errada!) para o seu problema só fortalecia a defesa boliviana e aumentava ainda mais as dificuldades do ataque brasileiro.
A seleção boliviana talvez quisesse, antes de fazer um gol, evitar sofrê-lo. Isso não podemos dizer ao certo (só podemos fazer suposições). Certo sim, é que seu princípio operacional de defesa dominante foi adequado ao princípio operacional de ataque dominante da equipe brasileira.
Há ainda quem discurse em nome da dificuldade de se jogar contra equipes bem “fechadas”, que ficam atrás do meio-campo esperando, deixando o adversário trabalhar a bola, com tempo para pensar e tomar decisões…
Realmente deve ser mais “fácil” jogar contra equipes que pressionam, buscam o gol o tempo todo, brigam pela bola, sufocam as saídas de bola e deixam o jogo rápido; realmente…
O que posso afirmar, sem chances de errar é que, ou equipes e treinadores buscam entender a dimensão organizacional do jogo (para identificar, alterar e influenciar princípios operacionais de ataque e defesa dos adversários, jogo e equipe) ou ainda os “novos velhos” chavões do futebol continuarão seduzindo torcidas, especialistas e profissionais do “mundo da bola”.
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O desastre em longo prazo
Caros amigos da Universidade do Futebol,
fechadas as janelas de transferência de jogadores de verão, as diversas questões que cotidianamente circundam o futebol profissional voltam a ser o objeto das diversas reuniões de comitês, conselhos e grupos de trabalho das autoridades competentes na Europa.
Uma delas, que gostaríamos de aqui tratar, é a cada vez mais precoce saída de talentos de seus clubes formadores, e a justa indenização a ser paga àqueles clubes que despendem seus preciosos recursos na formação desses jovens jogadores.
Como sabemos, a distribuição solidária de recursos entre clubes profissionais de futebol é uma necessidade não só para os clubes menores, que precisam de ajuda para sobreviver, como também para os grandes e poderosos clubes, que precisam de competição para atrair torcedores, patrocinadores e mídia.
Dessa forma, a saída “hostil” de jovens talentos de clubes formadores pode parecer um grande negócio para os grandes clubes. Mas no longo prazo, é um desastre, por não valorizar a sustentabilidade de todo o sistema.
A grande preocupação é que muitos dos que lucram com essas transferências não estão de fato preocupado com a manutenção a longo prazo do sistema. E é nessa medida que as autoridades desportivas, com a prerrogativa da legitimidade da auto regulação, devem intervir.
Algumas soluções já estão sendo implementadas. Na França, por exemplo, acaba de sair o novo regulamento da liga nacional, que obriga o jovem jogador a assinar seu primeiro contrato de trabalho com o clube formador. Foi um ato bravo por parte da Liga Francesa, mas que, como toda iniciativa pioneira, vai servir de cobaia para as demais. Alguns pontos fracos já podem ser vistos:
Em primeiro lugar, como o regulamento francês aplica-se tão somente a clubes daquele país (como não poderia deixar de ser), essa obrigatoriedade poderá ter como consequência prática o êxodo desses jogadores a outros países (aplicando-se, então, tão somente o Artigo 19 dos Regulamentos do Estatuto e Transferência de Jogadores da FIFA relativamente à proibição de transferências internacionais de menores de 18 anos).
Além disso, temos que observar que essa obrigatoriedade, caso seja levada ao judiciário francês poderá não ser exequível, pelo simples fato de que o sistema legal não admitir que seja válida uma disposição que obrigue qualquer pessoa a assinar contrato de trabalho com um determinado empregador.
Isso nos leva a crer que as soluções devem, em um futuro próximo, soluções devem ser alcançadas de forma conjunta pelos diversos países, através de seus representantes continentais ou mesmo internacionais. Para combater o mal pela raiz, somente ações com grande força máxima serão eficazes.
Pela proximidade com a sede da FIFA e a consequente facilidade no diálogo, as organizações sediadas européias sempre começam a apresentar as primeiras soluções. A UEFA, por exemplo, com a sua regra de home-grown player e a própria FIFA com o 6+5 são provas disso.
Temos que observar com atenção essas movimentações, e tropicalizá-las no Brasil. Isso porque se o problema existe no resto do mundo, no Brasil os reflexos são diretos. A qualidade da nossa competição nacional está em jogo.
Temos que manter os jovens jogadores no Brasil por mais tempo. O nosso futebol agradecerá, e os jogadores também. É claro que exceções vão sempre existir, e serão inevitáves. Mas a regra tem que ser outra. Menores de 18 anos, para dizer o mínimo, devem permanecer no Brasil.
Quem não for a favor dessa proposição, certamente não está preocupado com a sustentabilidade e perpetuação do nosso “beautiful game”.
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Mudanças consolidadas
Fabio, Rafael, Rodrigo e Vitor. Esses são os nomes que simbolizam o estado atual mercado de transferências de jogadores brasileiros.
Foram, possivelmente, as mais importantes transferências internacionais do futebol brasileiro no ano. Os três primeiros para o Manchester United, e o último para o Liverpool. Saíram, respectivamente, do Fluminense (os dois primeiros), do Internacional e do Botafogo-SP.
Talvez você nem saiba quem são. E talvez por isso mesmo você ache que eles não são muito importantes.
Ok, talvez eles nem sejam realmente importantes, até porque os gêmeos Fábio e Rafael não chegaram a jogar uma partida pelo Fluminense, o Rodrigo Possebon também pouco apareceu no Internacional e ninguém jamais tinha ouvido falar do Vítor Flora do Botafogo de Ribeirão Preto. E é justamente por isso, pelo fato de eles serem muito jovens e jamais terem aparecido antes pro grande mundo da bola, é que a transferência deles é tão simbólica.
O Liverpool e, principalmente, o Manchester United, não são burros. Muito menos quando se fala de contratar jogadores. E, seguramente, os quatro não foram contratados a esmo. Todos eles têm talento. Uma pesquisa rápida na internet faz você mesmo perceber isso. E, aparentemente, não precisam estourar em um grande time profissional para comprovar isso.
Os grandes clubes de futebol do país sempre se fortaleceram com o mercado de transferências por serem uma vitrine para o mundo. Os jogadores que disputam partidas com as camisas desses times aparecem em diversos canais e massificam a exposição para diversos mercados. Um jogador do Palmeiras, por exemplo, vale mais do que um jogador do Guarani, mesmo que tenham exatamente o mesmo talento, porque a) ele é visto por mais compradores e b) porque o fato de ele jogar pelo Palmeiras dá uma espécie de certificado de qualidade que hoje o Guarani infelizmente não pode oferecer.
Entretanto, a qualidade desses dois jogadores, nesse caso, é a mesma. Mas o preço de uma marca infla, e muito, o valor de um deles. Atentos a isso, os grandes clubes começam a buscar o talento antes que o impacto da marca valorize o atleta. Com a evolução dos métodos de reconhecimento de talento, essa é uma prática cada vez mais comum, o que significa na evasão de atletas do mercado brasileiro antes que eles tenham que passar pelas categorias profissionais.
Anteriormente, isso acontecia de uma forma por vezes acidental, como é o caso do Eduardo da Silva, do Arsenal, e do Cribari, da Lazio. Agora, porém, há indícios de que seja um processo planejado. E isso é temeroso, porque é uma tendência que tem tudo para se consolidar, porque ela envolve um processo racional focado, principalmente, na redução de custos de um mercado super-inflacionado. E quando você descobre a solução para obter o mesmo produto por um preço menor, você também descobre um jeito de alterar o mercado.
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O mundo da infoera tem se curvado as peripécias e ousadia dos rapazes que em 1998 não conseguiram vender um site de busca que haviam desenvolvido e resolveram montar uma empresa nos EUA de nome Google.
De lá para cá, os produtos e serviços que a Google desenvolve no mundo da internet têm dominado o mercado e muitas vezes tomado o espaço de concorrentes gigantescos como a Microsoft e o Yahoo. Qual o segredo desse sucesso? E o que isso tem a ver com tecnologia e futebol.
Muito mais do que se imagina, pelo menos sob o ponto de vista da estratégia e visão de futuro, que permitem a empresa lançar-se na frente das demais com atitudes e decisões que beiram a contradição, ao menos para os olhos de nós, leigos no mercado, e inclusive de alguns ditos experts.
Para quem não conhece Google além do nome da empresa é nome de seu pioneiro produto de busca na internet, aquele no qual procuramos tudo o que queremos e não queremos, é a empresa de servidor de email Gmail, do Orkut, do Youtube, do Google Maps, do mais recente lançamento Chrome, e por ai vai.
E todos eles são serviços gratuitos que, em boa parte, antes de seus lançamentos eram serviços privados de seus concorrentes. E quem nunca se perguntou diante dos fatos: Como a Google ganha dinheiro com serviços oferecidos gratuitamente e com praticamente nada de publicidade?
É um pouco dessa visão que falta aqueles que deveriam investir em tecnologia, e por que não no futebol profissional de maneira mais ampla. Não! Não significa buscar na gratuidade a solução, mas sim nas estratégias criativas que viabilizem projetos e auxiliem na captação dos recursos, tão escassos para questões sérias e importantes no futebol, haja visto que tal escassez torna-se abundância quando pensamos em outras finalidades.
Mas a Google poderia ensinar muito mais ao futebol. Numa recente disputa de mercado a sua concorrente Microsoft articulou a compra da também gigante Yahoo, que vinha em declínio e desvalorização, fusão essa que causaria grande impacto no mercado.
Quando todos esperavam um posicionamento forte da Google perante às leis para evitar o poderio que se formaria, a empresa mais uma vez viu de forma criativa uma solução. Através de um acordo, ofereceu à Yahoo o uso de seu mecanismo de busca, elevando as receitas de ambas as empresas. Essa valorização da concorrente fez com que a Microsoft esfriasse o interesse.
Oras, a Google poderia ter brigado e tentado impedir legalmente a junção, ou até mesmo pleitear adquirir a Yahoo, mas compreendendo que o investimento no mercado como um todo, ainda que gere lucros para os concorrentes (no caso a Yahoo) é também muito vantajoso para si mesmo.
Calma amigo, se não desistiu do texto até aqui, começo a deixar mais claro o que pretendi mostrar com esse exemplo.
A visão estratégica de uma empresa de tecnologia, que vê no crescimento do mercado e na concorrência, o espaço para o próprio crescimento, mostra ainda que a capacidade de pensar, de utilizar a criatividade no uso dos recursos e da própria tecnologia é que faz a diferença.
Remeto imediatamente a um serviço prestado na Inglaterra para Manchester United e Chelsea. Cada equipe tem na sua arena um aparato tecnológico que permite acesso a um incomensurável número de informações técnicas, táticas e física dos jogos. De comum acordo, e com uma visão similar a do Google, de o que faz a diferença é o uso que se faz da tecnologia e não a tecnologia em si, abrem as informações quando jogam como mandante para que o adversário utilize da tecnologia em seu estádio.
Seria muito comum, se pensarmos no Brasil, um time mandante usufruir unicamente das informações, vetando o acesso a seu adversário. Mas estão errados os ingleses? Jogando fora, conseguem receber informações, ainda que tenham que abri-las quando jogam em casa.
É ai que mora a consciência do mundo moderno de informação e tecnologia, mais vantajoso é investir e desenvolver o setor como um todo. Os méritos ficam para quem usa melhor e sabe como transformar dados em solução prática.
Bom, nos resta esperar que alguns rapazes resolvam fazer uma Google no futebol brasileiro, e que estes não sejam vistos como loucos sem a menor noção do que estão falando…
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O deus Dunga
Se o resultado de Chile x Brasil tivesse sido outro que não os 3 a 0 para o time de Dunga, o título desta coluna precisaria substituir apenas o “o” pelo “a”. Sim, porque, para variar, a imprensa brasileira que já previa o adeus de Dunga antes da partida deu mostras de que, agora, o técnico do time nacional está mais próximo do Olimpo.
A bronca do presidente Lula durante a semana serviu, mais uma vez, para que os jogadores dessem garantias de manchetes à imprensa e ao mesmo tempo encontrassem a motivação perdida para mostrar pelo menos um pouco de vontade de defender a seleção. Com isso, obviamente, a vitória veio fácil, fácil, como há muito não se via.
Até mesmo a frustração de Ronaldinho Gaúcho de ser substituído por um lateral (!) quando o time tinha um jogador a menos será agora explorada como sinal de que a seleção voltou a ser uma Seleção, com S maiúsculo!
O problema existe desde que a imprensa começou a cobrir o futebol. A interferência dos jornalistas sobre a seleção brasileira nunca foi a exceção, mas a regra que ditava o bom rumo do time brasileiro. Que o diga a Copa de 1958, quando Paulo Machado de Carvalho usou um colegiado de profissionais da imprensa para ajudá-lo no comando do time campeão do mundo.
Só que, nos dias de hoje, a cobrança exercida sobre o treinador da seleção chega a ser fora do comum. Escalação, convocação, não-convocação, convicção. Tudo é motivo para crítica. Dunga perdeu pontos com o “fiasco” olímpico. Não se questionou que, com uma seleção remendada e sem treinamento, ele conseguiu levar o time ao pódio olímpico, mais ou menos como Klinsmann fez com a Alemanha na Copa de 2006 (e que credenciou Dunga a assumir o Brasil).
O trabalho do jornalista é pautado pelo resultado. E só. Nesta segunda e até quarta-feira, os colegas que estarão enfurnados na Granja Comary para os treinos até o jogo contra a Bolívia só vão perguntar o que Dunga fará com o trio que deu a vitória sobre o Chile: Diego, Robinho e Luis Fabiano.
E, daqui a pouco, o processo de canonização virá. Com direito a discussão se não é hora de barrar medalhões como Kaká do time, já que a palavra do “capitão do tetra” terá mais peso do que qualquer histórico recente na seleção.
Nesta semana ninguém mais vai questionar a seca de gols que existia, a falha em Pequim, ou as broncas do presidente Lula. Do adeus próximo, Dunga vira deus. Até a próxima rodada complicada que terá pela frente… Sorte a dele, pelo menos, que o furacão de enfrentar o Paraguai fora, a Argentina em casa e depois as Olimpíadas já passou.
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Avançar em conceitos e paradigmas com raízes profundas não é coisa fácil.
Um grande pensador e professor amigo meu costuma dizer que nós seres humanos quando nascemos somos como uma garrafa quase vazia. Muito espaço para ser preenchido, pouca coisa já bem estabelecida.
Nós (humanos!) vamos preenchendo-a por toda vida. Lemos, assistimos, estudamos,escutamos, experimentamos; a cada nova vivência, a cada novo estímulo, mais um passo em direção as verdades que vamos construindo.
Pois bem. Com tantas verdades sendo construídas, nada mais normal do que a existência freqüente e permanente de choques de idéias; ainda mais quando o assunto é futebol.
Um tema recorrente e já abordado por mim em pelo menos outras duas oportunidades “ressuscitou” nesta semana em uma “mesa redonda” (organizada por uma instituição de ensino superior em São Paulo) com estudiosos do treinamento desportivo.
Existe um grupo de pesquisadores/cientistas que acredita que jogadores de futebol precisam desenvolver de forma maximizada a velocidade cíclica. Defendem a idéia de que tal capacidade deve ser potencializada principalmente em sua fase sensível (segundo alguns autores aos 12 e 13 anos de idade).
O principal argumento é de que ela poderia potencializar a velocidade de jogo (e que mesmo que isso não fosse verdadeiro, sua melhora não traria prejuízo algum na forma desportiva do jogador de futebol). Outro argumento, talvez mais sedutor, trata logo de lembrar que se um jogador que estiver em processo de formação, tornar-se no futuro um zagueiro, precisará ter aproveitado desenvolver a velocidade cíclica em sua fase sensível – pois, por exemplo em um lançamento em um jogo, poderá necessitar “vencer” um atacante chegando na frente dele (correndo mais rápido do que ele!).
Sedutor, porém com um erro conceitual grave.
Antes de me explicar, posso afirmar que em mais de 500 avaliações físicas (avaliando sprints de velocidade) que presenciei ou tive acesso de alguma forma aos resultados, na maior parte delas os zagueiros foram e eram mais lentos em corridas de velocidade cíclica (em distâncias que variaram entre 15 e 45 metros) que os atacantes, laterais e meias. Os atacantes em geral eram os mais rápidos. Ou seja, os jogadores mais lentos acabam por confrontar em boa parte dos jogos os seus “pares” mais rápidos.
Destino cruel…
Então, claro, estariam certos meus amigos pesquisadores: como aos 12 ou 13 anos ainda não se sabe ao certo qual a posição esse ou aquele jogador assumirá no futuro, melhor mesmo é desenvolver o máximo possível a velocidade cíclica.
Gostaria então antes de mais nada relembrar mais uma vez que o futebol é um jogo em que a defesa sobressai ao ataque. Muitas seqüências ofensivas, muitas ataques, poucos gols. Diversos são os motivos. Não vou discuti-los hoje. Fato mesmo é que de alguma forma nossos jogadores “tartarugas cíclicas” (devo chamá-los assim?) têm conseguido levar vantagem sobre os nossos “papa-léguas”.
É óbvio que o zagueiro (ou qualquer defensor de uma equipe) precisa diversas vezes no jogo vencer os atacantes adversários; em muitas situações tendo que chegar na frente. Mas, volto a lembrar: chegar mais rápido (ou primeiro, ou na frente) não significa correr mais velozmente.
E aí está o ponto. Ao invés de potencializar a habilidade do jogador de ser mais rápido, independente da situação-problema do jogo (pela estruturação do espaço, pela comunicação coletiva na ação, pela fundamentação técnica; ou por alguma competência específica mal desenvolvida) a preocupação torna-se “física”.
É preciso que fique claro que não é necessário que se atinjam níveis elevados dessa ou daquela capacidade física isolada para se jogar futebol em alto nível de excelência. Pensa-se em melhorar a resistência física, a força física, a velocidade física. Dever-se-ia pensar em potencializar a resistência de jogo, a força de jogo, a velocidade de jogo; e quando escrevo jogo me refiro a algo muito mais amplo e profundo do que olhá-lo sob a perspectiva física ou do senso comum.
Jogar não é correr ainda que haja no jogo corridas. Jogar não é saltar ainda que haja no jogo saltos (tocar piano não é flexionar os dedos ou o carpo, ainda que haja no tocar piano flexão dos dedos e do carpo).
Preenchamos nossas garrafas. Muita atenção sempre com o que vai para dentro dela. E principalmente, cuidado para nunca esquecer que o nível sempre vai estar distante da boca; porque se acreditarmos que a garrafa ficou realmente cheia, teremos chegado ao fim, ao nosso fim.
è Enchendo a minha garrafa
O autor do texto que vos escreve dá aulas de Bioquímica e Fisiologia do Exercício nos cursos de especialização da UGF. É professor de Teorias do Treinamento Desportivo e de Metodologia do Ensino do Futebol. Está terminando seu Doutorado em Ciências do Esporte. Aprendeu que o ser humano não é biológico, não é exato, nem sequer mesmo é “humano” (ainda que seja HUMANAMENTE DE BIOLOGIA (IN)EXATA, (IN)EXATAMENTE DE HUMANIDADE BIOLÓGICA, BIOLOGICAMENTE DE (IN)EXATIDÃO HUMANA). Não resolveu ser do contra, apesar de vez ou outra “cutucar” seus pares acadêmicos. Costuma dizer que sua garrafa ainda está vazia, mas que com empenho chega à metade até os 70. Depois sua humanidade biologicamente inexata é quem dirá…
Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br