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Ausência

Caro leitor,

Informamos que a coluna de Eduardo Fantato não será publicada nesta terça-feira e aproveitamos o espaço para pedir desculpas pelo infortúnio.

Esperamos que a situação seja normalizada na próxima semana e estamos trabalhando para isso.

Obrigado!

Equipe Cidade do Futebol

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Justa-causa

Imagine você, caro leitor, assistir ao jogo do seu time ouvindo os comentários do próprio treinador da sua equipe. Mas não com ele à beira do campo, cumprindo a função para o qual é remunerado (aliás, o mais alto salário do país para o cargo), e sim na telinha, vendo assim como você o jogo pela televisão.

Na quarta-feira insossa das quartas-de-finais da Copa Sul-Americana, Wanderlei Luxemburgo atacou de comentarista no jogo do Palmeiras! Sim, isso mesmo. Ele deu folga aos jogadores titulares, mandou o auxiliar técnico para a Argentina junto com outros 14 atletas e, em vez de ficar em casa e observar a partida, meteu-se a comentarista da principal emissora do país.

Sacada de mestre da Globo? Mais um acesso de vaidade de Wanderlei?

De fato um pouco dos dois. Mas esse não é o questionamento que deve ser feito num caso como esse. Porque o fato já está consumado. Luxemburgo já foi à Globo e palpitou até no desempenho dos times que são seus rivais diretos na disputa do título nacional.

No dia seguinte, na maior naturalidade do mundo, mídia, torcida e diretoria do clube apenas comentaram a atuação do pseudo-comentarista, ou, mais precisamente nesse caso, do pseudo-treinador.

Nada de questionar a validade do ato em si, ou então a magnitude do descalabro que foi o episódio.

Via de regra, é como um médico ir à televisão comentar a cirurgia de um paciente, ou dar palpite sobre o procedimento cirúrgico de seus colegas. E, para agravar, o paciente é dele!!!! Ou, ainda, um advogado que naquele dia pediu recesso do tribunal, decidir ir à TV Justiça comentar o caso que está em julgamento!

Simplesmente o ato de Luxemburgo fere qualquer questão ética que se possa ter já colocado no relacionamento transmissão de jogo, treinador de futebol, etc. Uma coisa é, num período fora do trabalho, Wanderlei decidir comentar um campeonato. Outra, muito diferente, é ele deixar de lado uma competição para focar em outra e, num determinado dia, comparecer à TV para falar sobre o desempenho do time que dirige!

É tão absurdo quanto colocar ponto eletrônico em jogadores como o mesmo Wanderlei fez com o time do Corinthians em 2001. Ou, ainda, tão errado quanto mentir a data de nascimento e adulterar o nome no documento de identidade, como feito pelo até então Vanderlei Luxemburgo para se tornar Wanderley Luxemburgo e jogar no Flamengo.

Se o futebol fosse um meio mais sério no Brasil, no dia seguinte Luxemburgo seria demitido por justa-causa do trabalho. Mas como foi o próprio Wanderlei quem criou o conceito de “super-técnico”, ou de “manager”, é impossível contrariá-lo…

Nesse caso, a justa-causa é para quem deixou o “monstro” ser criado.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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O treino psicológico no contexto tático: fragmento ou fractal?

Em belo texto escrito pelo professor Lucas Leonardo, intitulado “O fim da Preparação Física“, ele, o autor, faz uma reflexão interessante sobre a fragmentação do jogo de futebol.

“(…) Para agüentar o jogo, treina-se o físico. Para executar o jogo, treina-se o técnico. Para movimentar-se no jogo, treina-se o tático.”

E questiona: “(…) Para agüentar, executar e movimentar-se no jogo basta treinar o jogo, afinal se é jogo que tenho que agüentar fisicamente, executar tecnicamente e movimentar taticamente, qual seria a melhor ferramenta para isso do que usar do jogo para preparar para o jogo?

E se através do jogo eu serei capaz de agüentar, executar e movimentar uma partida de futebol, os treinos físicos, técnicos e táticos isolados acabam. Treina-se o JOGO.”

Apropriando-me da idéia do autor, adicionaria mais um ingrediente nessa apimentada discussão. O jogo de futebol é jogo, é tático, é técnico, é físico e também mental. E é daí (do “mental”) que podem surgir algumas novas (velhas!) polêmicas.

A psicologia no e do esporte é, de certa forma, bem recente no futebol. Muitas barreiras já foram superadas e diversas discussões já foram realizadas sobre o tema. Avaliações de traço-estado, perfil “a”, “b” ou “c”, abordagem “x” ou “y”, presença ou não do psicólogo em treino, treinador-psicólogo, psicólogo-treinador, “stress-training”, “tracking”, etc e tal.

Interessante que, se sob a perspectiva da preparação física (que já não é tão nova no futebol) a fragmentação e a dificuldade de se compreender a complexidade do todo são enormes, no caso da psicologia (e/ou preparação psicológica) os equívocos têm tomado a mesma direção.

Fractalmente falando, em toda sessão de treinamento a cada dia de trabalho, toda e qualquer atividade elaborada e proposta pelo treinador tem que trazer à carga exigências táticas-técnicas-físicas-mentais, de tal forma que o tático esteja contido no físico, o mental no tático, o técnico no mental e assim sucessivamente a todo o tempo, o tempo todo.

Se a moderna e atual perspectiva das teorias do treinamento desportivo no futebol vêm nos preconizar que “deve-se treinar conforme se deseja jogar” (de tal forma que jogo seja treino e treino seja jogo), não faria (e não faz!) sentido algum desenvolver e treinar em separado (treinamento mental, ou tático, ou físico, ou técnico) aquilo que será exigido em conjunto em jogo formal.

Aí virão os “apegados de Decartes” que dirão “mas estão aí os papers científicos, mostrando que exercícios de mentalização, visualização e etc e tal; que o POMS isso e aquilo podem e são úteis na melhora do desempenho atlético do futebolista”.

Mas não darei espaço. Poderia recorrer a Damásio, Morin, Stewart, Piaget, Prigogine, João Freire, Manuel Sérgio, Medina, Scaglia. Não faltariam conteúdos e argumentos convincentes.

Vou porém sugerir uma reflexão proposta pelo texto “O fim da Preparação Física”, quando o autor aponta que os moldes da preparação física atual surgiram pela ineficiência que os treinos técnico-táticos da década de 50 apresentavam sob a perspectiva de intensidade, densidade e volume de exigências “físicas”.

Como os estímulos dos treinos que eram propostos, sob a perspectiva da dominante “física” (chamada assim por mim, apenas com objetivo didático), não proporcionavam grandes exigências (sobrecarga), também não preparavam o atleta de futebol em sua totalidade.

Desta problemática, duas soluções possíveis:

1)    Redimensionar o treino técnico-tático, para que ele pudesse proporcionar as exigências físicas-técnicas-táticas do jogo; ou
2)    Dar um “treino adicional” que “completasse” as lacunas deixadas pelo treino técnico-tático (decisão errada!).
Como a solução encontrada fora a segunda, estamos aí somando anos e anos caminhado em direção contrária a complexidade do jogo.

Com a psicologia, a mesma coisa.

Como os treinos hoje, em sua maioria, não contêm exigências mentais-táticas-técnicas-físicas ao mesmo tempo (fragmenta-se o treino e o indivíduo), abre-se uma lacuna e com ela a necessidade de se complementar os treinos com “abordagens psicológicas”.

Mais uma vez, problema certo, decisão errada.

Se não compreendermos a complexidade do jogo de futebol, correremos o risco de mais uma vez voltarmos atrás com a história.

Já percebemos que falta algo, que existe um problema a ser solucionado; isso é fato. Mas mais uma vez estamos a atacar os sintomas e não a causa do problema…

Então peço licença para terminar com um trecho de um texto lido pela cantora Ana Carolina (poema “Só de Sacanagem“) em um show com Seu Jorge (e se minhas fontes estiverem corretas, fora escrito por Elisa Lucinda):

” (…) Meu coração tá no escuro. A luz é simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, minha avó e todos os justos que os precederam. ‘Não roubarás!’, ‘Devolva o lápis do coleguinha’, ‘Esse apontador não é seu, minha filha’. Ao invés disso, tanta coisa nojenta e torpe tenho tido que escutar! Até habeas corpus preventiva, coisa da qual nunca tinha visto falar, sobre o qual minha pobre lógica ainda insiste: esse é o tipo de benefício que só ao culpado interessará! Pois bem, se mexeram comigo, com a velha e fiel fé do meu povo sofrido, então agora eu vou sacanear! Mais honesta ainda eu vou ficar! Só de sacanagem!
Dirão: ‘Deixe de ser boba! Desde Cabral que aqui todo mundo rouba!
E eu vou dizer: ‘Não importa! Será esse o meu carnaval! Vou confiar mais e outra vez. Eu, meu irmão, meu filho e meus amigos.’
Vamos pagar limpo a quem a gente deve e receber limpo do nosso freguês. Com o tempo, a gente consegue ser livre, ético e o escambal.
Dirão: ‘É inútil! Todo mundo aqui é corrupto desde o primeiro homem que veio de Portugal!’
E eu direi: ‘Não admito! Minha esperança é imortal, ouviram? Imortal!’
Sei que não dá pra mudar o começo, mas, se a gente quizer, vai dar pra mudar o final!”

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

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Novos Tempos

Caros amigos da Universidade do Fubebol,

 

Como temos visto, os tempos parecem ser outros. A soberania do capitalismo mundial parece estar sob grande ameaça, por conta da ganância e da falta de ética por parte daqueles que buscam lucros a todo custo, sob o manto do liberalismo. Por causa dessa irresponsabilidade descontrolada, a intervenção no sistema privado surge como a única solução para evitar a quebra de todo um sistema financeiro mundial.

 

A regra que vemos todos os dias no noticiário é a nacionalização de grandes instituições privadas, para, no final das contas, salvaguardar a poupança dos pobres cidadãos comuns.

 

Seguindo esse caminho, entendo que o mercado do futebol profissional carece de solução semelhante. Não que o futebol esteja em crise. E também não que o futebol não esteja sofrendo consequências da crise mundial. Mas sabemos que os campeonatos no mundo não vão parar. O futebol, de tão popular, passar de um simples jogo, um simples negócio, para uma fenômeno de utilidade (ou necessidade) pública, social e cultural.

 

Porém, sabemos que a administração dos clubes sempre foi encarada de uma forma peculiar. Muitos clubes acumulam dívidas milionárias. Não conseguem arcar com as dívidas fiscais e trabalhistas, e muitas vezes não honram com os compromissos salariais. É uma história que não parece ter fim.

 

O jogo de “gato e rato” que travam historicamente clubes e INSS daria para escrever um bom livro. E a impunidade é grande, como sabemos.

 

Faço aqui uma importante ressalva. Temos hoje grandes casos de dirigentes competentes e clubes saneados. Não se pode generalizar por completo a crítica.

 

De toda forma, uma excelente medida seria uma maior intervenção, não necessariamente estatal, mas principalmente das autoridades desportivas, que melhor conhecem o funcionamento dos clubes. Como disse recentemente o presidente francês Nicolas Sarkozy e atualmente na presidência francesa do conselho da União Européia, o “Laissez-faire” está acabado. Não tenho absoluta certeza disso, porém podemos aproveitar o momento para utilizar essa reflexão no futebol.

 

Na Europa, algumas propostas estão sendo estudadas para tentar “ajudar” na gestão dos clubes. Tópicos como um limite nas despesas com salários dos clubes, a obrigatoriedade de um maior budget para categorias de base e uma limitação no número de contratos de trabalho para clubes são comuns nas rodas dos “rulemakers”.

 

É claro que, nos tempos modernos, o futebol se aproximou muito do poder judiciário, que hoje o vê como um negócio como outro qualquer. Entretanto, como tanto defendemos, exitem especificidades no futebol que devem ser consideradas e respeitadas.

 

Assim, algumas dessas medidas, apesar de terem uma grande dificuldade de execução face a uma aparente ilegalidade, podem perfeitamente não o serem por conta do seu objetivo principal, de ordem pública. Esse objetivo é justamente possibilitar aos clubes que honrem dívidas fiscais, promovam inclusão social, desenvolvam as respectivas comunidades locais, etc. É a função social e cultural do futebol.

 

Assim, a discussão começa a ganhar corpo na Europa, e deve ser acompanhada de perto em países como o Brasil, para que haja um aproveitamento daquilo que de melhor pode ser extraído, observando-se as peculiaridades de cada país.

 

A batalha é longa, mas um dia chega-se lá.

Para interagir com o autor: megale@universidadedofutebol.com.br

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E a crise?

Há certo tempo atrás, o mundo passava por um momento de crescimento como poucos antes na história. Tudo ia muito bem. Todo mundo tinha muito dinheiro. Novos negócios eram sempre grandes oportunidades para ganhar dinheiro.

Obviamente, esse cenário era superestimado. Nem tudo estava bem. Nem todo mundo tinha dinheiro. Nem todo negócio era um bom negócio. Era, sim, uma onda de otimismo que alterava boa parte da percepção lógica das coisas. Coisas não muito boas pareciam ser excelentes. E tudo parecia que ia ser assim pra sempre.

Como bem se sabe, isso não aconteceu. Em determinado momento, a onda exagerada de otimismo deu lugar a uma onda exagerada de pessimismo. Do tudo ia dar certo, passamos para o tudo vai dar errado. Nada mais normal, uma vez que os movimentos obedecem ao padrão do equilíbrio de mercado. Um baque como esse serve para purificar um ambiente que se encontrava infestado de papéis e títulos não funcionais. Escaparemos todos bem, até que fiquemos otimistas demais para então nos tornar novamente pessimistas em exagero. É o ciclo natural do mercado.

Quando esse ciclo chega na parte negativa do processo, a tendência é que todo mundo fique com um pé atrás com qualquer coisa que envolva dinheiro. Essa desconfiança, portanto, possui reflexo direto na oferta de crédito, que acaba ficando escassa, o que por sua vez mina ou encarece alguns investimentos.

O maior problema da atual crise, ao que parece, é justamente a cessão da intensa oferta de crédito ao qual todos estavam acostumados. Você tem um projeto muito doido na cabeça? Dois anos atrás, não tinha problema. Alguém, em algum lugar, ia acabar te emprestando dinheiro por juros relativamente baixos. Hoje, existe uma dificuldade enorme de se encontrar dinheiro para emprestar, e quando se encontra, os juros vão lá em cima.

Os efeitos dessa lógica no mercado do futebol estão ficando visíveis, principalmente naquilo que tange projeto de novos estádios, em especial na Europa. Alguns clubes estavam finalizando os projetos e tiveram que adia-los por conta da dificuldade de achar alguém que o financiasse. Projetos megalomaníacos tiveram que ser redesenhados e ainda aguardam investidores interessados. Ninguém sabe ainda quando os novos estádios ficarão de pé, se é que isso irá acontecer.

Outro efeito para clubes europeus é a necessidade da re-adequação de preço dos ingressos. Alguns clubes começaram a perder público, uma vez que, em época de crise, a tendência é que as pessoas poupem o máximo de dinheiro possível. Isso implica no corte de gastos supérfluos. E futebol é uma coisa meio supérflua, pelo menos para a maioria das pessoas.

Isso significa menos dinheiro para os clubes, o que também significa menos dinheiro para salários e transferências. Nunca o mercado por jogadores que têm o contrato acabando foi tão concorrido. Não só porque as receitas de dia-de-jogo dos clubes diminuíram, mas também porque o financiamento bancário para transferências também desapareceu, no processo semelhante aos estádios.

A crise certamente terá conseqüências em novos projetos e no mercado de transferências, mas dificilmente afetará diretamente a maioria dos clubes. Os grandes clubes são tão grandes que dificilmente sofrerão muito com a diminuição da gigantesca demanda ou problemas de uma ou outra empresa. Sempre haverá alguém disposto a colocar dinheiro em clubes poderosos. Os clubes menores, que certamente sofrerão mais com a perda do dinheiro de transferências e com a diminuição da demanda, possuem como grande fonte de receita os contratos de transmissão dos campeonatos, que já estão assinados e continuarão a dar dinheiro para as equipes. É pouco provável que haja uma quebra sucessiva de clubes e afins. Um ou outro não deve escapar, mas a maioria deve ficar onde está.

Resta saber se isso é bom ou ruim. Um re-equilíbrio mais drástico de mercado poderia fazer muito bem às estruturas do futebol.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br

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Ciência canela de pau ajuda jogador canela de pau

Entardecia com mais tranqüilidade que de hábito em minha caverna, geralmente ensandecida àquela hora com a movimentação dos animaizinhos voadores saindo para a caça. Os morcegos recuperavam-se do lauto banquete da noite anterior, quando uma nuvem de mariposas, vindas de não sei onde, atiravam-se como loucas contra a entrada da caverna, atraídas pela chama vermelha da tocha que mantenho acesa até a madrugada. Segundo Oto, bastava abrir a boca durante o vôo. De barriguinhas cheias, os pequenos quirópteros perderam a hora, esqueceram do entardecer. 

Sem nada para fazer, meu hábito mais constante, eu tomava um chá de jasmim. De repente eis que chega Oto, meu morcego confidente. Ainda esfregando os olhinhos perguntou-me do que era o chá, e eu disse – De jasmim. – Detesto – disse ele – não tem de outra coisa? Fez-me levantar e providenciar um de canela que eu guardava de minhas andanças pelo mundo. Sentei-me, ele pendurou-se, e iniciamos uma conversa sobre qualquer coisa, deixando-nos levar pelas palavras. Talvez inspirados pelo chá, o assunto pendeu para o futebol truculento, dos beques de fazenda, dos brucutus da bola. – Como aumentaram – disse Oto – há mais canelas de pau que craques. – Mais, bem mais – completei – aqui no Brasil então, nem se fala. Os poucos craques que restaram bandearam-se para a Europa. 

Enquanto a água fervia percebi a barriguinha saliente de Oto, vestígios do banquete de mariposas. 

– E a ciência Bernardo, ela não ajuda a formar craques? – perguntou o morcego, alisando o abdômen. – Parece que não – respondi – os craques dependem de habilidades especiais, de coordenações finas, de gestos sutis, de equilíbrio, de uma visão muito apurada do espaço de jogo, e disso a ciência pouco se ocupa. – É impossível! – disse Oto – Outro dia, estive na universidade e vi pilhas e pilhas de revistas com artigos científicos sobre esporte. 

Explico: Oto, como vocês sabem, é um morcego. Morcegos têm hábitos noturnos e gostam de, eventualmente, visitar bibliotecas. Meu quiróptero confidente descende de um vetusto patriarca alado que residiu por largos anos em Coimbra, donde a tradição familiar é de todos se interessarem pelas letras. Oto mata dois coelhos com uma só cajadada: alimenta-se de tenros papirógrafos, isto é, de piolhos, cupins e traças que destroem livros, enquanto folheia, com agilidade incrível, as obras que lhe interessam. Fanático como é por futebol foi aos papers e saiu de lá impressionado. – Bernardo – disse-me ele – se toda aquela pesquisa se revertesse em prol do bom Futebol, que maravilha! 

Senti desapontar meu amigo, mas tive que explicar-lhe que a tal ciência do esporte, com raros e esporádicos esforços, dedica-se, acima de tudo, a formar bólidos defensivos, que consomem suas vidas esportivas a destruir a refinadíssima arte de controlar a bola dos Pelés, Garrinchas, Zicos, Sócrates e seus congêneres dessa estirpe de craques que as ruas brasileiras produziram. 

– Que pena! – lamentou Oto – com tanta ciência, imagine se eles pudessem melhorar ainda mais essa arte. 

Na cabecinha do morcego, era difícil compreender o motivo que levava os pesquisadores a formarem exércitos de zagueiros e volantes truculentos. – Como fazem isso? – ele perguntava. 

Sem muita esperança de elucidar-lhe o dilema, falei que, nos últimos anos, uma verdadeira obsessão pelo desenvolvimento de força muscular, um pouco menos pelo da resistência, tomou conta da pesquisa no esporte; quem quiser confirmar, pode consultar as publicações, que estão todas à disposição por aí, nas revistas, nos congressos, nos seminários. Com o desenvolvimento de conhecimentos sobre como tornar os atletas mais fortes e mais resistentes, foi possível colocar para jogar em grandes equipes jogadores que, sem isso, não passariam da várzea. Fortes como touros, fazem frente aos melhores craques e anulam suas tentativas de praticar futebol. Os canelas de pau estão por toda parte, até nas melhores equipes do mundo, ganhando salários altíssimos. Além disso, os métodos para hipertrofiar os músculos podem ser aplicados indistintamente a todos, porém, quando aplicados aos craques, tornam-nos duros, desengonçados, lerdos; aos poucos vão ficando mais e mais parecidos com os zagueiros. Quando relaxam um pouco no treinamento, engordam, contundem-se e aí, nunca mais, nunca mais praticam sua arte. 

– E não daria para criar outra ciência, uma que favorecesse a arte do futebol? – perguntou, um tanto desconsolado meu pequeno amigo. 

– Não sei Oto – respondi – teria que ser alguma coisa mais humana, alguma ciência que enxergasse a pessoa que joga e não somente músculos, metabolismos, tendões. Essa outra ciência teria que ir às ruas, inquirir os peladeiros, as crianças, a cultura popular; talvez tivesse que vir do campo de futebol para o laboratório, e não ir do laboratório para o campo. As ruas e os campos de várzea do Brasil guardam o maior acervo de conhecimentos sobre futebol do mundo, ignorado pela ciência. Se ela fosse boa, de 1970 para cá teríamos produzido, nos gramados, verdadeiras obras de arte. Pelo contrário, incapaz de enxergar o refinamento do gesto, a visão de campo, a sutileza da finta, a perfeição do passe, produziu paredes de músculos, locomotivas de resistência, como se anular o bom futebol fosse um objetivo a alcançar. “Mas, assim é o homem Oto, assim é a ciência feita pelo homem. Não difere muito da indústria de bebidas ou de sanduíches; quanto mais tratam os diferentes como iguais, melhor, mais lucro.” Essa última parte eu apenas pensava, fechado em meu silêncio. Não quis dizer tudo isso para Oto, já bastante triste. Porém, era preciso dizer-lhe algo mais.

– A ciência do esporte também é canela de pau Oto, por isso ela só ajuda jogador canela de pau.

Nisso passou um bando de mariposas enlouquecidas pela luz das tochas e meu amigo quiróptero, carregando sua barriguinha ainda cheia, atirou-se com enorme desenvoltura sobre o que prometia ser mais um banquete de luxo.

Para interagir com o autor: bernardo@universidadedofutebol.com.br

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Mito ou verdade. A utilização de scout no futebol (parte II)

Dando seqüência ao texto mito e verdade sobre scout, agradeço primeiramente aos amigos que enviaram suas opiniões, e compartilho com todos um pouco desse rico debate que estabelecemos.

Lembro que deixamos o desafio baseado nos itens a seguir.

Mito ou verdade: É muito melhor mandar alguém pessoalmente fazer uma análise porque fazer tal avaliação por vídeo, não permite observar algumas características imprescindíveis, que só quem estiver no campo, consegue avaliar.

Mito ou verdade: Os custos para a utilização do scout são muito altos para a realidade brasileira, os clubes não possuem condições de investir.

O colega Pedro Assunção, que vem estudando a fundo a questão do scout, disse em seu comentário que “é necessário que se crie uma equipe de scout, como é na Europa, onde se tem várias pessoas para cuidar das variáveis estatísticas que ocorrem num jogo. uma pessoa só é impossível de se fazer um verdadeiro scout”, ressalta ainda a necessidade de profissionais que estudam scout capacitarem aqueles que serão os grandes beneficiários do seu uso, e considera também que o custo é menor quando se investe no suporte à esses profissionais.

Concordo com Pedro, sobretudo na condição da capacitação, é o que defendemos sobre o nome de atualização tecnológica, no sentido de que é necessário termos pessoas competentes nas interpretações acerca das informações extraídas de um scout, pois, por mais recursos tecnológicos que possamos desenvolver é a capacidade de transacionar entre dado e intervenção que fará a diferença.

O amigo Sinésio Capece… comenta que é: “fundamental enviar um representante para fazer este levantamento in-loco do adversário. Entendo que esta deveria ser uma prática freqüente no futebol, bem como em qualquer esporte. In-loco sim, é importante que seja. Os detalhes são melhor percebidos e o material muito melhor colhido. Não se pode fazer uma analise sanguínea através de um scanner, o indivíduo tem que estar presente em sua coleta e levar a picada da agulha.”. Considera ainda que não é um alto custo e sim um investimento, e entra também na questão de termos parâmetros e diretrizes para nortear tais observações, comentando que o observador “não pode ir (como já vi no próprio futebol profissional da 1ª divisão) com um pedaço de “papel de pão” para fazer umas anotações aleatórias”.

Riquíssimo esse debate com as colaborações de amigos, recebi outros textos que comentam a temática numa ótica bem similar e aproveito aqui para expor as minhas considerações, lembrando que esse debate não se encerra, pelo contrário apenas dá alguns passos rumo a uma compreensão conjunta acerca de suas possibilidades.

A metáfora levantada sobre a análise de sangue é muito boa, mas acredito que na questão da análise do scout podemos acreditar que as distintas ferramentas que já existem por ai, permitem que o profissional não precise espetar a agulha, uma vez que o sangue já pode vir no tubo para ele ser examinado.

Explico melhor:

1. Em termos de custos os dirigentes e comissões técnicas, não partem de um planejamento para avaliar as necessidades, realmente o custo não é alto, mas o que imagino baseia-se nos seguintes questionamentos: para mandar o olheiro para Argentina como no exemplo utilizado por nós no texto anterior, estão os gastos com viagem, alimentação, hospedagem, etc, etc, etc, em contraponto indago se esse custo é maior ou menor do que a utilização de uma tecnologia que permita ao profissional fazer a análise do sangue (do jogo), sem a necessidade dele próprio ir comprar a seringa (ir a Argentina), fazer a coleta e levar para os procedimentos de análise (papel de pão) , fazer a análise e a partir daí intervir (escrever o laudo).

2. Sem dúvida a presença do especialista no local pode passar uma confiança maior em relação às informações e detalhes pertinentes, mas faço minha avaliação com base nas ferramentas que estão no mercado, muito pouco utilizadas e ainda sim sublocadas, não se extraem 10% das possibilidades de informações que existem, ignorando a cientificidade por de trás dessas ferramentas.

Sabemos das capacidades tecnológicas em buscar, armazenar e traçar as informações de forma muito mais rápida que nós seres humanos, lembrando sempre que as máquinas só fazem aquilo que especificamos a elas. O que fundamenta minha visão é: porque não confiar nas informações tecnológicas uma vez que ela apenas vai buscar aquilo que os técnicos e auxiliares podem ter especificados para elas.

Assim os custos estariam centrados na capacidade de extração dos dados, o que acontece também nos “papeis de pão”, mas a questão primordial é o tempo destinado a interpretação dos dados, na situação de deslocamento do olheiro até o local, a análise só poderá ser iniciada de fato com a tabulação das informações, em contrapartida tal tempo poderia ser melhor utilizado e distribuído na interpretação dos dados fornecidos por um scout tecnológico.

Se o profissional puder confiar na capacidade de extração de dados de um scout, na confiabilidade de suas informações, o que vai fazer a diferença é a dedicação e habilidade de interpretação, obtendo  elementos  que talvez pudéssemos até alcançar numa análise manual (sé é que podemos chamar assim), mas que demandaria um tempo, tal tempo este que pode ser vital para a descoberta de algum outro detalhe ou desenvolvimento de estratégias que façam a diferença.

Sabemos que nós temos nosso tempo de encarar um problema/enunciado (dados, informações) e buscar soluções (análise, estratégias, intervenção). Quanto mais rápido compreendermos o enunciado mais tempo teremos para pensar nas soluções.

Essa economia de tempo, reflete diretamente na economia financeira, isso ainda sem compararmos diretamente os custos, ou melhor investimento no scout, seja ele na capacitação do profissional, na formação de uma equipe especializada, ou na integração de recursos a tais profissionais, o que passa por uma questão de importância e prioridade que se dá ao scout no processo chamado futebol.

Bom, a discussão como disse, não se encerra por aqui, com muitos profissionais dedicados a estudar e compreender o scout aplicado no futebol, a ciência agradece.

Para interagir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br

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Ausência

Caro leitor,

Informamos que a coluna de Erich Beting não será publicada nesta segunda-feira e aproveitamos o espaço para pedir desculpas pelo infortúnio.

Esperamos que a situação seja normalizada na próxima semana e estamos trabalhando para isso.

Obrigado!

Equipe Cidade do Futebol

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Os meias que marcam e os volantes que armam: continuam fragmentando nosso futebol (até os mestres)!

No futebol brasileiro predomina o não-profissionalismo. Poucas são as ações que poderiam me fazer pensar o contrário. Claro, minorias existem e não por acaso têm tido maior êxito que seus pares majoritários.

E vejam, não estou nem sequer me referindo a ações e decisões no “campo político-administrativo”.

Já presenciei “presidente” de clube de futebol, em campeonato profissional de 1ª divisão ligando do celular ao banco de reservas para exigir do treinador a substituição deste e daquele atleta. Normal. Isso nem causa mais espanto, nem chama mais a atenção. Óbvio, existem aqueles que se submetem e aqueles que não se submetem a esse tipo de situação.

Já vi treinador “convidando” dirigente a se retirar do vestiário em dia de jogo dando três segundos de prazo para o ato ou senão… Já vi clube dispensar atleta por causa da estatura, do peso e até por cisma.

No futebol predomina o “eu acho”. E de tanto “achar” parece que foi aumentando também o número de coisas a se perder.

Pois bem. Dia desses Wanderley Luxemburgo, em um programa esportivo na TV, disse que hoje existem problemas nas categorias de base, no processo de formação dos atletas de futebol e que isso de certa forma tem atrapalhado muito a evolução e formação das equipes profissionais do futebol brasileiro. Deixou “escapar” entre linhas que os treinadores na “base” estão muito mais preocupados em vencer o jogo do próximo final de semana (ou conquistar o campeonato) do que com a real “formação de jogadores de futebol”.

E ainda que seu pensamento a respeito não tenha sido aprofundado no debate, o seu “entre linhas” é fato.

Pois bem. Gostaria, a partir desse fato, destacar três pontos:

1)     Treinadores das categorias de base talvez não tenham claro qual o seu papel;

2)     Dirigentes e coordenadores de categorias de base talvez também não tenham claro qual o papel e objetivos de treinadores e equipes nas categorias de base;

3)     Bons projetos de formação real de jogadores foram, são e continuarão sendo assassinados por investidores, dirigentes amadores, coordenadores e treinadores presos a paradigmas ultrapassados e crenças baseadas em achismos dos mais diversos tipos.

É ponto pacífico que treinadores de equipes sub-13 (sub-15, sub-17 etc e tal), por exemplo, enxerguem suas “crianças” como atletas adultos em miniatura e, por falta de conhecimento e preparo, ajam (conforme modelam em suas abstrações) como treinadores em final de Copa do Mundo falando com atletas experientes e aptos a entendê-lo (sem se aterrorizar com os gritos desprovidos de inteligência e razão).

É fato que treinadores querem vencer a qualquer custo. Mas é fato também que o mesmo dirigente que o contrata sob a “ladainha” (que ele mesmo diz em frente ao espelho para tentar se convencer) de que resultados de jogos não são importantes, é o mesmo que meses depois quer “decapitar” o treinador que não foi lá tão bem com as vitórias.

Como o dirigente não entende de processo e nem mesmo sabe o que é formação, acaba sendo comum que ele, no final das contas, queira saber somente das vitórias. E o treinador, para se proteger, assume o pacto da mediocridade e vai até as últimas conseqüências com seu plano “maquiavélico” rumo às conquistas.

Não senhores!

Não estou eu aqui a dizer “esqueçam as vitórias; ou formamos jogadores, ou vencemos campeonatos”. Simplesmente porque não acredito que uma coisa está desconectada da outra, ou que uma desabone ou elimine a outra.

Conquistar vitórias também faz parte do PROCESSO de formação. Mas elas vêm (ou deveriam vir!) com o próprio PROCESSO (ao seu tempo – e se falamos de categorias de base, o tempo é algo importante; muito importante!).

Mas o problema é muito mais amplo e profundo do que parece. Estamos vendo apenas a ponta do iceberg.

Uma coisa é entender que as categorias de base fazem parte de um processo de formação de jogadores de futebol. Outra é entender o que é jogar futebol (sem fragmentar o que é tático do que é técnico, do que é físico do que é mental – e isso até alguns dos “mestres” que nos encantam tem dificuldade para entender, conceber, discursar/agir), o que ensinar, porque, como ou quando e principalmente o que é processo.

E aí termino então com um trecho de um texto do Tostão (“Estatutos do futebol”). O que eu quero dizer com ele? As entrelinhas dirão por si só…

“(…) Repito, pela milésima vez, que muito mais importante que esquemas táticos é a qualidade dos jogadores. Porém eles brilham muito mais quando jogam em equipes organizadas.

A solução mais urgente para formar talentos no meio-campo é os técnicos, desde as categorias de base, pararem de escalar volantes que só marcam e de colocar armadores habilidosos para jogar somente como meia-atacantes. É preciso descobrir solistas, pianistas. O meio-campo está saturado de carregadores de piano (…)”

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Alterações nas janelas de transferência

Caros amigos da Universidade do Fubebol,

Como sabemos, os jogadores de futebol profissional somente podem ser transferidos de um país para outro dentro do prazo das chamadas “janelas de transferência”. Cada federação nacional pode eleger duas janelas de transferência por temporada devendo, para tanto, notificar a Fifa a respeito.

Agora, ao chegar próximo ao final do ano, teremos abertas as janelas de transferência de verão no Brasil, bem com a de inverno (e menor) na Europa. Essa próxima janela não deverá ser tão movimentada como do meio do ano, uma vez que, na Europa, estamos no meio do campeonato e apenas alguns ajustes nas equipes são feitos em termos de novas contratações.

Esse tema é muito importante para os clubes no Brasil. Sabemos que grande parte da receita dos principais clubes (e muitas vezes de clubes intermediários) decorrem da venda de jogadores. Há que se planejar com eficiência a projeção de venda de atletas, para que o clube não perca o “timing” dos clubes europeus.

O mercado pode, de tempos em tempos, esfriar. Porém, o apetite por jogadores brasileiros nunca se esgotará. Basta que os clubes brasileiros, além de formar bons jogadores, aprimorem (e profissionalizem) seus departamentos de relacionamento internacional. A partir de então, lucrar será uma questão de tempo e oportunidade.

Tivemos nesta semana uma notícia na Europa de que técnicos de clubes europeus estão querendo evitar transferências nas janelas de inverno (ou também conhecidas como mid-season transfer windows). Isto porque os técnicos obviamente não gostam de perder seus jogadores ao longo da competição.

Ou seja, apesar do pouco movimento que a próxima janela costuma propiciar, os técnicos já sentem a necessidade de evitá-la. E isso poderia corresponder a uma oportunidade a menos dos clubes brasileiros de efetuarem bons negócios na Europa.

Qualquer tentativa nesse sentido, e que alterasse o número de janelas permitidas, deveria passar por deliberação do Exco da Fifa para efetiva alteração do Regulamento. O que, acredito, não deva acontecer no curto prazo.

Porém, devemos sempre acompanhar. E, enquanto essas janelas não são alteradas, resta-nos aguardar para que as próximas especulações se iniciem.

Para interagir com o autor: megale@universidadedofutebol.com.br