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Tiro no pé

Romário é o maior jogador do futebol brasileiro desde Pelé. De fato, os números comprovam a eficiência do Baixinho. Ele já venceu de tudo um pouco e, ainda por cima, consegue aos 41 anos de idade ser letal dentro da grande área. Mas não deveria ser por isso que a lei estivesse acima de Romário.

Em dezembro do ano passado, a Máquina do Esporte levantou a lebre de que Romário não teria condições de defender o Vasco antes de julho de 2007. A repercussão do caso aumentou, e a discussão foi parar na Fifa, estância máxima para resolver os problemas do futebol. No final das contas, a Fifa lavou as mãos. Deu à CBF a incumbência de decidir se Romário poderia ou não entrar em campo pelo Vasco, mesmo que isso desrespeitasse uma de suas normas.

No final das contas, Romário já reestreou pela milésima vez no Vasco, em busca do milésimo gol. Pelas contas dele, faltam dez. Por algumas outras contas, podem faltar mais de cem… O fato é que a Fifa burlou sua própria norma para conceder ao Baixinho o privilégio que até hoje apenas Pelé foi capaz de ter reconhecido o feito da ultrapassagem dos mil gols.

Ok, a repercussão mundial do feito de Romário será importante para a Fifa, para o Vasco, para Romário. Mas o “jeitinho” dado por todos para que Romário jogasse foi um tiro no pé da gestão do futebol mundial. O Baixinho mais uma vez foi genial, conseguindo burlar uma norma da Fifa com o aval da própria Fifa! Mas seu caso abre um grave precedente.

A partir de agora, cairá o veto às transferências internacionais dos atletas. Ainda mais com o fim do passe no mundo inteiro, o futebol vai virar um festival de idas e vindas, chegadas e saídas. E, com isso, quem perde é a organização do espetáculo. É, mais ou menos, como uma peça de teatro ter o seu elenco substituído a cada show. E o entrosamento? E a qualidade do espetáculo?

Romário chegará aos mil gols. Mas a um custo grande demais para o futebol mundial.

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A Copa do Mundo e a mentira sobre o legado esportivo

Sejamos sinceros. Se a Copa do Mundo de 2014 for realmente no Brasil, quem você acha que vai pagar a conta?
 
Sem chance de qualquer erro, é possível dizer que atualmente quem financia qualquer investimento válido em estrutura esportiva no Brasil, direta ou indiretamente, é o governo, principalmente o federal. Basta ver o Pan.
 
2014 pode parecer longe. Afinal, no filme ‘De volta para o Futuro’, o futuro mais distante imaginado – que possuía carros e skates voadores, tênis e roupas auto-ajustáveis com secadores, outdoors holográficos e hidratadores de pizzas – era 2015. De acordo com idéia, portanto, a Copa do Mundo de futebol no Brasil será realizada um ano antes disso tudo.
 
Porém, 2014 não é tão longe assim. São apenas sete anos. É logo ali, como a África. E é bastante possível dizer que boa parte dos diversos problemas do Brasil não será solucionada até lá. É claro que a tendência, ainda que incerta, é que o mercado evolua, que o nível educacional médio suba e que a estrutura do país como um todo melhore. Mas muito daquilo que atravanca o desenvolvimento nacional irá continuar acontecendo, principalmente se levar em conta que dificilmente o Estado diminuirá de tamanho de maneira significativa. Isso quer dizer que quem vai financiar a Copa de 2014 será ninguém que não o Poder Público. Muito provavelmente, será o dinheiro proveniente dos tributos que irá pagar a conta final do investimento realizado para sediar o evento.
 
O fato de o Estado ser o principal financiador de um evento esportivo como a Copa do Mundo gerará grandes distorções na aplicação dos investimentos. Projetos serão escolhidos com critérios subjetivos, os materiais utilizados podem não ser da qualidade necessária, e a avaliação final dos resultados será muito mais política do que técnica. Problemas como estouros orçamentários e atraso de obras serão comuns, além de possíveis mudanças nos projetos durante a execução. E, talvez o pior de tudo isso, os projetos serão pensados muito mais pelo viés do retorno político da obra do que pela sua sustentabilidade.
 
Um caso clássico desse tipo de posicionamento foi o estádio Delle Alpi, da Juventus de Turim. Construído pelo poder público para a Copa de 1990 na Itália, o estádio virou uma dor de cabeça para o futebol italiano, principalmente para a Juventus, que se tornou dona do espaço. O estádio é enorme, suntuoso e bonito por fora. Porém, é frio, extremamente disfuncional, e tem lugares onde não é possível ter uma visão completa do gramado, que por sua vez fica longe das arquibancadas por conta de uma pista de atletismo que, pelo que me consta, foi utilizada uma única vez desde que o estádio foi inaugurado, quase vinte anos atrás. Não por acaso, a média de público da Juventus é pífia, quase no mesmo nível de jogo do Campeonato Brasileiro. O estádio foi parte do legado deixado pelo investimento público na Copa do Mundo.
 
Além desses problemas práticos de se investir o dinheiro público na realização de um evento do tamanho da Copa, há de se questionar como que um torneio como esse pode gerar um legado estrutural para o país. Afinal, melhorias estruturais, transporte, segurança, et al, são obrigações do Estado. É pra isso que eu e você pagamos impostos. Não precisa que aconteça um evento desse tipo para que o poder público pense em se mexer. Se, por exemplo, disserem que a Copa do Mundo trará melhorias na segurança pública do país, quem está pagando a Copa é o governo e todo mundo sabe que o país precisa de melhorias na segurança, por que esperar uma Copa do Mundo pra fazer isso? A mesma coisa vale para melhoria nas estradas e nos aeroportos. Todo mundo sabe que precisa melhorar. Precisa realmente da motivação futebolística para desamarrar os nós e fazer a coisa funcionar?
 
Não faz sentido.
 
Como também não faz sentido acreditar que os novos estádios serão uma benesse para o futebol brasileiro. O país ainda sofre com a herança da última vez que tentaram fazer estádios grandes e modernos, durante a ditadura militar. Criou-se, então, uma estrutura imaginária para o futebol nacional que acabou não se sustentando com a queda do regime. Desde então, o país sofre com o peso dos elefantes brancos. Ou melhor, com os amplos espaços vazios dos estádios, típicos de projetos feitos sem perspectiva de futuro e sustentabilidade, pensados unicamente no afã do momento político da inauguração. Igualzinho ao que provavelmente vai acontecer com a Copa de 2014.
 
O Pan indica que a iniciativa privada brasileira ainda não está muito disposta a investir em um evento esportivo. Em sete anos, dependendo, é possível que o cenário mude, mas não muito. Como a Copa do Mundo é imensuravelmente maior que o Pan, é óbvio que a boa vontade dos investidores privados deve aumentar. Entretanto, os ganhos políticos proporcionados pela Copa também serão enormes, principalmente se for levado em conta que 2014 é ano de eleição presidencial e para governador. Com isso, talvez a própria vontade de investimento público (dinheiro) por retorno político (voto) acabe sufocando o investimento privado. Dessa forma, pouca coisa deve mudar mesmo.
Quem vai acabar pagando a conta, é o governo federal.
 
Posteriormente, quem vai pagar é o futebol brasileiro, que terá que se virar pra sustentar uma herança desproporcional ao seu tamanho.
 
Estou louco para saber o que vai acontecer em 2014.
 
Vou pegar o meu De Lorean na garagem.

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A monocultura do futebol

Caro leitor,
 
O colunista João Paulo Medina não pôde publicar seu texto semanal.
 
Enquanto ele estiver ausente, será substituído neste espaço por Antonio Afif, coordenador de gestão de carreiras do projeto Campus Pelé.
 
Formado em economia pela Universidade Mackenzie, Afif já foi diretor de marketing e assessor da presidência do Corinthians. Além disso, prestou assessoria e consultoria a diversos clubes do país e escreveu os livros “Futebol 100% Profissional”, em parceria com José Carlos Brunoro (1997), e “A Bola da Vez – O Marketing Esportivo como Estratégia de Sucesso” (2000).
 
A coluna de João Paulo Medina voltará dentro de algumas semanas.
 

Antonio Afif
 
Há vários anos ouço o amigo e professor João Paulo Medina dizer que o futebol é tratado de forma fragmentada em suas comissões técnicas – multidisciplinares, é verdade, mas carregadas de uma cultura caracterizada pela visão especialista, com pouca ou nenhuma integração entre os profissionais das mais diversas áreas.
 
É aquela velha história que sempre ouvi nos clubes de futebol em que trabalhei: “cada um tem de fazer a sua parte; eu não entro em sua área e você não entra na minha”.
 
Agora, lendo um texto recente do professor Medina, encomendado pelo mestre português Manuel Sérgio, pai da Ciência da Motricidade Humana, pude notar que os preceitos preconizados por ambos, desde os anos 80, são cada vez mais necessários ao futebol atual, que conta com um número crescente de profissionais de diversas especialidades em seus quadros.
 
A visão especialista -que propiciou bons resultados práticos no futebol brasileiro- cria no mundo atual (e isto se aplica também ao futebol) um distanciamento de uma melhor compreensão global da realidade.
 
Para Medina “a especialização, entendida de forma isolada e desconectada de suas relações com o mundo, a natureza e o homem, da forma mais ampla possível, já não faz o menor sentido”.
 
É verdade. Vemos hoje que o futebol adota alguns princípios científicos como se fossem verdades absolutas e imutáveis, que aliados com uma boa dose de empirismo dificultam novos avanços deste esporte.
 
O filósofo e apaixonado por futebol, Manuel Sérgio, respeita os antigos treinadores, pelo que podem ensinar e pelo fato do esporte mais popular do planeta ser, em primeiro lugar, prática e só depois teoria.
 
No entanto, Manuel Sérgio (que é reverenciado por José Mourinho, um dos técnicos mais admirados da atualidade), observa que a monocultura do saber, praticada por alguns técnicos de futebol, é um erro. “É preciso saber mais do que futebol, no mundo do futebol”.
 
Por isso, devemos sempre ter em mente que para entendermos de futebol, apenas estudando futebol, sem observarmos a complexidade humana, jamais saberemos o que é futebol.

A coluna de João Paulo Medina voltará a ser publicada dentro de algumas semanas

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Direito de resposta 2

O tema era despretensioso. Falar sobre o improvável direito de resposta que as fontes têm por lei a possibilidade de exigir dos veículos de imprensa parecia um tema batido e sem grande margem para discussão. Mas eis que o debate começou a ser suscitado pelo e-mail, um atalho para aproximar o jornalista da fonte e, especialmente, do leitor.
 
É inegável que, dada a condição suprema que atingiu hoje a imprensa esportiva no Brasil, é raro vermos alguém ter sucesso ao exigir seu direito de resposta. Claro que tudo isso varia. Às vezes quem reclama não tem total razão em fazê-lo, assim como geralmente quem transmite a informação não está 100% correto. Mas, quando o tema já tinha perdido sua força, a Itália mostra que o “direito de resposta” permeia as discussões não apenas da imprensa brasileira.
 
Manchete no último sábado, dia 10 de fevereiro, de La Gazzetta dello Sport, principal jornal esportivo da Itália: “Del Piero será pai”. A matéria, muito mais condizente com um veículo de fofocas de celebridades, dizia que o meia da Juventus, campeão do mundo pela Itália, seria pai em breve. Falava sobre a vida pessoal do atleta e de sua esposa, sempre com fontes de informação ligada à família de Del Piero.
 
Manchete no domingo, na mesma La Gazzetta dello Sport: “La Gazzetta pede desculpas a Del Piero”. Sim, é isso mesmo! E não é que o repórter do jornal só não fez uma coisa em toda sua matéria extensa sobre a gravidez da mulher do jogador? Perguntar a eles se isso era verdade…
 
O resultado foi uma vexatória página no jornal para dizer o oposto do que disse antes, como cantava Raul Seixas. Não sei qual foi a conseqüência dessa barrigada do repórter italiano. Mas, para o mais tradicional veículo de esportes da Itália, responsável pela maior venda de um jornal na história do país (quando a Azzurra ganhou a Copa, no ano passado) e com mais de cem anos de atuação, a história mal apurada foi uma afronta a seu leitor.
 
Mais do que se preocupar com o certo ou o errado, com quem foi o culpado, a Gazzetta se preocupou com seu produto, que é o leitor. Em nome de sua honra, reconheceu o erro e publicou a correção.
 
A atitude italiana mostra que, em nome da credibilidade jornalística, conceder o direito de resposta pode se revelar uma atitude muito mais correta do que simplesmente brigar com a fonte tentando comprovar que se está com a razão. É lógico que, no caso Del Piero, a razão era plenamente favorável ao atleta. E a “humildade” do jornal em reconhecer o erro foi uma aposta certa em nome do que lhe é mais precioso: a credibilidade.
 

O duro é esperar para ver se a moda pega…

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A nova investida de Hicks

Mais um clube inglês foi vendido. Mais um clube inglês foi vendido para alguém de fora da Inglaterra. Mais um clube inglês foi vendido para alguém dos Estados Unidos da América.
 
Até esta semana, seis clubes da English Premier League eram de propriedade de capital estrangeiro. Tem o Chelsea do Abramovich, o Porstmouth do franco-russo Gaydamak, o Fulham do egípcio Al Fayed, o West Ham do islandês Magnussom, e o Manchester United e Aston Villa, dos americanos Glazer e Lerner, respectivamente. A bola da vez, agora, é o Liverpool, que foi adquirido por um consórcio composto por outros dois americanos: George Gillet Jr e Thomas O’ Hicks.
 
A razão pela qual tantos americanos estão investindo em clubes de futebol inglês é bastante lógica, afinal o campeonato inglês é, de longe, o mais rentável da Europa. E o mercado de futebol europeu é, de longe, o mais rentável do mundo. Para se ter uma idéia, a receita total da Premier League na temporada de 2004/05 foi próxima de 2 bilhões de euros. A previsão é que na temporada de 2007/08, a receita chegue a US$ 3,25 bilhões. É mais do que o PIB do Timor Leste.
 
Melhor ainda para os investidores é que boa parte desse montante, um pouco mais de 40%, vem de direitos de transmissão das partidas, ou seja, é um dinheiro quase sem custo. E nada indica que esses valores atingiram sua cotação máxima, vide o recente acordo de transmissão internacionais da Premier League, que foi comprado pela bagatela de mais de U$ 1 bilhão. Esse novo acordo é o dobro do valor do anterior, e faz com que a receita de direitos de transmissão do campeonato inglês para as próximas três temporadas seja avaliada em mais de R$ 8 bilhões. Prato cheio pra qualquer endinheirado que goste de investir em esportes, como é o caso dos americanos, todos donos de pelo menos uma franquia das maiores ligas esportivas americanas.
 
O Liverpool pode ser considerado o maior time do futebol inglês. Tudo bem que o Manchester United tem lá o seu apelo comercial, que o Chelsea ganha tudo ultimamente e que o Arsenal é o time do Hornby, mas nenhum deles possui o tamanho dos vermelhos de Merseyside. Nenhum time na Inglaterra ganhou tanto. Só de títulos europeus são cinco. Além disso, a equipe sempre foi protagonista dos grandes acontecimentos do futebol inglês. As duas maiores tragédias do futebol europeu, que contribuíram de forma crucial para a mudança de toda a conjuntura comercial do jogo, aconteceram em jogos do Liverpool. Primeiro em Heysel e depois em Hillsborough. Tudo isso contribui para dar ao time um ar todo especial, recheado de história e tradição. Não é por acaso que o seu website possui pelo menos um usuário registrado de todos os países do mundo, e nem que a fila para comprar o pacote da temporada seja de 20 anos. Se você ligar lá hoje e pedir pra comprar o carnê, você entra na lista de espera e recebe o pacote, provavelmente, em 2027.
 
Os novos compradores sabem disso, e toparam o desafio. Os dois americanos possuem experiência suficiente para provar que conseguem conciliar a experiência adquirida nos esportes americanos com as peculiaridades do mercado futebolístico. Gillet já tentou comprar o Denver Nuggets, time da NBA. Não conseguiu, mas acabou adquirindo o tradicional time da NHL Montreal Canadiens em 2001, que não ganhou nada desde então. Tomando o hóquei sobre o gelo como base, Tom Hicks parece possuir mais sucesso esportivo. Em onze anos, sua franquia na NHL, o Dallas Stars, ganhou treze títulos.
 
Entretanto, nem tudo são flores. Hicks é também dono do time de beisebol Texas Rangers. Na tentativa de construção de uma super-equipe em 2001, Hicks acabou gastando US$ 250 milhões em um só jogador, Alex Rodriguez. O jogador não rendeu, o time muito menos. Como as contas do time estavam muito desniveladas e nenhum outro time tinha grana pra bancar o salário do jogador, Hicks acabou subsidiando a transferência de Rodriguez para o New York Yankees, o que acabou lhe rendendo o apelido de ‘Tom Dumb’, ou ‘Tom Burro’.
 
Outra investida de Hicks foi no Corinthians, que apesar do título mundial de clubes, não dá pra dizer que foi algo de muito sucesso. Afinal, o HMTF tentou fazer um estádio e não conseguiu. Tentou licenciar produtos e não deu certo. Tentou inventar uma liga própria e nada. O projeto com o Corinthians era pra durar dez anos. Durou dois.
 
O contrato de Alex Rodriguez com o Texas Rangers também era de dez anos. Durou dois.

Resta saber onde estará o Liverpool em 2009.

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Uma crise para o futebol brasileiro

Parece estranho acreditar que uma crise possa fornecer algum tipo de auxílio no desenvolvimento de uma área qualquer de atuação, em uma sociedade como a nossa, já tão cheia delas. Mas é exatamente isso que nosso futebol parece está precisando, caso queiramos que ele evolua enquanto instituição.
 
A crise é um instante decisivo que traz à tona praticamente todas as anomalias que perturbam um organismo, uma instituição, um grupo ou uma pessoa. E esse é o momento crucial em que se exigem decisões e providências rápidas e sábias, se é que pretendemos debelar o mal que nos aflige.
 
Muitas vezes, por trás de certas situações de aparente normalidade, escondem-se as mais variadas distorções ou patologias, que em virtude daquela aparência não são colocadas em questão. 
 
O futebol, considerado por alguns sociólogos como uma representação simbólica da própria vida em um sentido mais amplo, nos fornece ricas demonstrações neste aspecto.
 
Basta, por exemplo, que uma equipe comece a perder as possibilidades ou esperanças de chegar ao fim do campeonato na posição em que seus torcedores esperam, para que o ambiente comece a piorar e as críticas se multiplicarem. A partir daí, tudo é questionado. Dirigentes, treinador, comissão técnica e jogadores são colocados em xeque.
 
O lado bom desse ambiente tenso e desfavorável é que a partir daí, todos começam a perguntar, de uma forma mais séria e profunda, sobre o que estaria errado e o que poderia ser feito para que tudo pudesse melhorar.
 
A crise, portanto, impõe certas medidas que favorecem as mudanças.
 
Neste sentido, se desejamos mudanças radicais na organização do nosso futebol, não seria legítimo afirmar que para isso ocorrer precisaríamos, antes, vivenciar uma profunda crise nesta instituição?

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Questão de ética

Faz muito tempo que a palavra ética deixou de figurar em nosso cotidiano. Assolado pela crise política de mensalões, conchavos e desvios de verbas, o Brasil assiste hoje a uma enxurrada de condutas moralmente questionáveis que não chegam a ser sequer discutidas como algo fora da normalidade.
 
A saída de Christian do Corinthians é um desses casos. O jogador foi contratado no início do ano, era o artilheiro do time, sensação de um início pífio do Campeonato Paulista. Havia encontrado finalmente seu espaço na equipe de Emerson Leão e caminhava para finalmente se afirmar no futebol de São Paulo.
 
De uma hora para outra, Christian rasgou a camisa corintiana e voltou a vestir o vermelho do Internacional, clube onde despontou para o futebol brasileiro. Tal qual nossos políticos trocam de partido conforme a nota cintila mais alta, o atacante corintiano virou colorado da noite para o dia.
 
E o compromisso assumido no início do ano com o Corinthians? E a lisura no tratamento entre os clubes? E o respeito aos torcedores do clube?
 
Ninguém chegou a questionar nada disso. O Inter pagou ao Corinthians, então Christian está livre para fazer o que quiser. Esse foi o resumo da ópera. Para o alvinegro, foram R$ 500 mil entrando no clube de uma hora para outra. Para o Inter, um esforço necessário após a lesão de Fernandão e a saída de Rentería.
 
E o torcedor continua com cara de tacho. Vendo o seu novo ídolo tornar-se uma espécie de amor de verão, sem qualquer compromisso com a vida do dia-a-dia.
 
Em casos como esse que voltamos a perceber na necessidade de se criar um código de ética para o futebol brasileiro. Nele, temos de discutir o papel de clubes, jogadores e imprensa no exercício de suas profissões. Mas, se nem quem tem de dar o exemplo se presta a isso, fica difícil achar que casos como o de Christian possam afetar alguma ética de nosso futebol.

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A eleição de Platini e as conseqüências para o futebol brasileiro

Enquanto a Conmebol discute se deve ou não permitir que dois times de um mesmo país se enfrentem nas finais da Copa Libertadores, a Uefa se preocupa em adequar a nova política de democratização do poder do recém-eleito presidente Michael Platini às demandas do mercado, que eventualmente acabarão afetando todo o mundo do futebol.
 
A diferença entre essas duas preocupações dá mais ou menos o tamanho da distância evolutiva entre as duas confederações em questão.
 
Há tempos, a governança do futebol europeu vem sendo colocada em cheque devido ao constante crescimento do poder comercial dos principais clubes e ligas do continente. Um dos sinais mais claros do confronto entre a governança interna (Fifa, Uefa e demais federações) e a governança externa (clubes, ligas, investidores e Estados) do futebol europeu foi o surgimento da atual Champions League, uma remodelagem da antiga European Cup. O atual formato da principal competição interclubes da Europa favorece claramente os clubes e ligas com maior poderio econômico, e surgiu depois da ameaça de rompimento protagonizada pelos maiores clubes europeus, que planejavam migrar para uma liga fechada organizada pelo grupo Mediaset, do famoso e tão falado Silvio Berlusconi.
 
A partir do momento em que esse rompimento foi manifestado, a Uefa percebeu que já não dava mais pra governar o futebol do mesmo jeito de sempre. Era preciso dar mais espaço a quem possuía mais dinheiro, ainda que esse espaço fosse bem, bem pequeno. Dessa forma, mudou a competição e passou a adotar uma visão mais capitalista de governar.
 
Essa foi a fórmula achada por Lennart Johansson para agradar tanto os donos do dinheiro (os clubes) quanto os donos dos votos (as federações). Presidente da entidade desde 1990, Johansson assumiu a rédea do futebol europeu justamente no período em que o esporte começou a passar por sua maior transformação comercial, deixando de ser apenas um ambiente em que se envolviam interesses primordialmente esportivos para se tornar um ambiente em que se envolvem interesses primordialmente comerciais.
 
Durante os 17 anos da Era Johansson, o futebol europeu cresceu – e muito. Cresceu tanto que a própria União Européia começou a achar que estava na hora de começar a regulamentar o clima de faroeste que predomina dentro do ambiente futebolístico. O mercado, de um modo geral, ficou feliz, porque é muito melhor investir num lugar estável do que num instável. Óbvio. O Brasil que o diga. A Fifa, entretanto, nunca gostou da intromissão de outros poderes naquilo que ela considera seu feudo. E começou a prestar bastante atenção no caminhar da Uefa, até a hora em que achou que as coisas estavam começando a fugir do controle e decidiu bancar o seu próprio candidato. E ganhou.
 
Platini assume a Uefa nas mesmas condições que Havelange e Blatter assumiram a Fifa, com a retórica da justiça e da sustentabilidade do futebol. Discurso rejeitado pelos donos do capital, mas fácil de ser assumido por federações menores, que – dentro do sistema democrático de eleição da Fifa e da Uefa – são quem realmente possuem o poder decisório. Só por isso que você ouve tanto falar de Jack Warner, presidente da Concacaf, que comercialmente representa pouco no mundo do futebol, mas que na verdade controla quase trinta por cento dos votos no colegiado da Fifa.
 
Mantendo a política de atender ao voto da maioria, o ex-jogador francês declarou que pretende tornar o futebol europeu mais justo para todos. Um dos carros chefes da sua campanha é justamente mexer na estrutura da Champions League, aumentando e redistribuindo o número de vagas para a competição, tornando-a mais acessível para países com menor poder aquisitivo, justamente aqueles que o elegeram. Além disso, Platini pretende implementar o sistema 6+5 sugerido pelo próprio Blatter, em que todos os times precisarão contar com, no mínimo, seis dos onze jogadores em campo formados em casa.
 
Se isso vai dar certo ou não, não sou eu quem vai dizer. Mas o que dá pra tentar prever são os efeitos disso para a indústria do futebol brasileiro.
 
Não existe mais como dizer que o futebol brasileiro não depende do futebol europeu. Depende, e muito. E a dependência é baseada essencialmente na exportação de jogadores. Isso é fato consolidado e não há muito que ser feito, pelo menos por enquanto.
 
A democratização platiniana implica na abertura de novos mercados para os jogadores. Países com pouca tradição precisarão construir times minimamente competitivos para a disputa continental. Obviamente que eles não conseguirão formar em casa um time inteiro de jogadores em um curto período de tempo. Nem um time, nem seis jogadores, como quer a nova política. Dessa forma, faz sentido que eles passem a importar mão de obra que seja boa e barata. E isso pode ser entendido como jogadores africanos ou sul-americanos. Como a África não ganhou nenhuma Copa ainda, a preferência tenderá a ser para brasileiros e argentinos. E como a regra dos jogadores formados em casa se baseia essencialmente na idade, e não no local de nascimento dos atletas, é possível que as novas regras da Uefa acentuem a exportação de jogadores brasileiros mais jovens, destinados a mercados menos explorados. Mercados mais batidos, como o espanhol e o italiano, podem eventualmente fechar algumas das portas, mas nada que não possa ser compensado na outra ponta.
 
É difícil prever exatamente os efeitos concretos dessa nova política democrática da Uefa. Aliás, é difícil prever até se a retórica de Platini vai surtir de fato algum efeito. É bem provável que ele esteja subestimando o poder da governança externa do futebol europeu ao protestar tão efusivamente contra a crescente comercialização do jogo bretão. Mas, de qualquer maneira, é certo que algumas coisas serão alteradas.
 
E tudo isso mexe, e muito, com o atual formato da indústria do futebol brasileiro. Mais do que, inclusive, qualquer discussão a respeito do formato das semifinais da Copa Libertadores.
 
As decisões da Uefa, enfim, influenciam o futebol brasileiro muito mais do que qualquer idéia leviana e política da Conmebol. Platini influencia mais do que Leóz.
Mas também, o que esperar de qualquer organização que tenha um presidente vitalício?
 
Perguntarei ao Chávez.

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PAC, educação e futebol

O governo brasileiro lançou neste início de 2007 o Programa de Aceleração do Crescimento – ou PAC, como tem sido chamado. Trata-se de um conjunto de medidas que promete mobilizar cerca de R$ 500 bilhões em quatro anos e prevê investimentos em infra-estrutura, principalmente nas áreas de energia, saneamento, habitação e transportes.
 
É sempre frustrante ouvir falar em crescimento ou desenvolvimento quando se aborda apenas as questões diretamente ligadas à economia.
 
Como nos ensina o filósofo português Manuel Sérgio, o verdadeiro desenvolvimento de um país não deve ser entendido apenas como o processo de acumulação de riquezas materiais ou pecuniárias, mas, sobretudo, as possibilidades de ascensão de todos os homens e mulheres ao mais humano, quer no aspecto econômico, como também nos aspectos biológico, psicológico, ideológico, cultural, espiritual e social de uma forma mais ampla.
 
Assim compreendido, qualquer plano ou programa que visa acelerar o crescimento de uma nação não poderia deixar de considerar prioritariamente as questões ligadas à educação. Qualquer plano que trate de economia ou infra-estrutura dissociado de uma base educacional que lhe dê sustentação está fadado ao fracasso.
 
Vivemos hoje em pleno século XXI, na era da informação. Entretanto, só com claros investimentos em educação é que seremos capazes de transformar os dados e as informações, disponíveis em toda parte, em conhecimentos e sabedoria úteis ao nosso real desenvolvimento.
 
Esse raciocínio vale para qualquer área, inclusive o esporte e particularmente o futebol.
 
Não podemos criar um plano de aceleração do crescimento para o futebol, ou seja, um PAC para essa modalidade esportiva, apenas pensando nos investimentos em infra-estrutura ou em melhorias em suas condições econômicas e financeiras. Não são os estádios ou as arenas modernas, por exemplo, que darão novos horizontes ao futebol brasileiro.
 
O que mais precisamos para continuarmos a crescer na era do conhecimento é, portanto, educação. No caso do futebol, educação para os dirigentes; educação para os treinadores; educação para os jornalistas; educação para os jogadores e educação para os torcedores.

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Direito de resposta

Na última semana, mais uma vez o técnico do Corinthians, Emerson Leão, foi alvo de uma polêmica da imprensa. O treinador alvinegro decidiu rugir mais alto na sede da Rede Bandeirantes, exigindo um direito de resposta por conta de uma matéria publicada dias antes na emissora.
 
Leão tentou fazer uso do famoso “direito de resposta”, previsto na Lei de Imprensa. Sentindo-se prejudicado pela reportagem, Leão foi à Band exigir seu direito de se defender e dar sua versão sobre o fato. Após esperar um pouco até ter a entrada liberada na emissora, Leão obteve o que queria: deu a sua versão para a reportagem.
 
O episódio envolvendo o treinador corintiano permeia o cotidiano do jornalismo, especialmente o esportivo. A diferença é que, diferentemente de Leão, quase nenhum personagem se dá ao luxo de exigir resposta para uma matéria que não lhe agrada.
 
O rugido de Leão contra a Band pode levar a uma nova era no jornalismo esportivo. A cada dia que passa vemos atletas, dirigentes, árbitros e treinadores espernearem contra as famigeradas mesas-redondas que invadem nossa programação esportiva. O maior motivo de descontentamento é com o pouco comprometimento do jornalista em dar uma informação precisa, ficando ele muito mais comprometido com a audiência do programa.
 
Leão foi um que não pensou assim. Em vez de aceitar passivamente uma reportagem em que se sentiu prejudicado, saiu em busca de uma defesa. Assim como Rogério Ceni na folclórica discussão com Milly Lacombe.
 

Se mais Leões e Rogérios cobrassem dos jornalistas uma atitude mais consciente no exercício da profissão, sem dúvida que o universo do futebol ganharia em nível de debate nas suas mesas-redondas. Mas, enquanto isso, o direito de resposta fica só na teoria. E o discurso vazio segue a permear a TV quando o assunto é futebol.