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Carta Aberta ao Cristiano Ronaldo

Meu caro Cristiano Ronaldo,
 
Perdoe-me a ousadia desta carta. Não sei se já ouviu falar de mim. Num ponto estaremos de acordo: nem sequer ainda nos cumprimentámos! Mas eu conheço-o inevitavelmente. O Cristiano é um dos grandes mitos do nosso tempo! Vejo futebol, há muitos anos e não me custa colocá-lo, no pódio, ao lado da meia-dúzia de melhores jogadores que conheci: o Pelé, o Maradona, o Matateu, o Eusébio, o Puskas e o Cruyff. Estou a vê-los, neste momento, com os olhos da saudade – da mais dolorosa das saudades que é aquela que nós sentimos por nós mesmos!… Há-de estranhar não ter referido o nome do Di Stéfano. Ele foi, para mim (e até é natural que eu me engane) o maior entre os maiores. Esperemos que haja prémio, no Céu, que o distinga. Na Terra, não há. Entre ele e todos os outros, há uma diferença de qualidade. No entanto, em Portugal, é bem possível que nenhum jogador haja beneficiado da publicidade que o tem anunciado, por esse mundo além. Confesso, porém, que talvez nenhum deles apresentasse o dom de comunicabilidade, a energia persuasiva, a originalidade criadora que o Cristiano tem… indiscutivelmente!
 
Se, neste caso, o todo é maior do que a soma das partes, a totalidade que você é, como futebolista de eleição, talvez não tenha par, na história do futebol português. E, por isso, para o nosso tempo (e não só na sua terra natal que, neste momento, estremece de emoção pelos seus feitos), o Cristiano Ronaldo é um semi-deus! Nas religiões tradicionais, as divindades sempre estiveram directamente relacionadas com as forças da natureza, fosse nos faraónicos egípcios, na Grécia ou na Roma da Antiguidade. No judaísmo, Iavé fala com Moisés, no meio de trovões. No Evangelho, os ventos e as ondas obedecem a Jesus Cristo. Na nossa sociedade, laica e agnóstica, Deus parece poder ser dispensado, mas não morreu a necessidade de crer num Absoluto, qualquer que ele seja. Ortega y Gasset percebeu que “a religião do século XX é o futebol”. O historiador Eric Hobsbawn é mais específico e adianta: “o futebol é a religião laica da classe operária”. Não surpreende, por isso, que você, ilustre madeirense e português, produto do seminário de jogadores excepcionais, que é o Sporting Clube de Portugal, seja (repito) um semi-deus.
        
Eu estudo filosofia do desporto há precisamente quarenta anos; já convivi com muitos colegas seus de profissão e com alguns treinadores de nomeada, como o José Maria Pedroto (para mim, o maior de todos) – e aprendi, por isso, que o futebolista genial não o é só pelas suas qualidades físico-motoras, mas também pelas suas qualidades psicológicas e espirituais. Arrebatadores e assombrosos, fisica e tecnicamente, foram também o Mané Garrincha ou, em Portugal, o Vítor Batista, e acabaram na miséria física e moral. E o Maradona é o actual seleccionador da Argentina, porque uma nação inteira o não deixa tombar por terra. Não há exemplo maior de divinização de um futebolista do que a referência ao golo ilegal que ele fez aos ingleses no Mundial de 1986… “com a mão de Deus”, dizem! Só que nenhum dos tristes exemplos aqui citados (e outros que me ocorrem) dispunha do dinheiro que você aufere, nem do calor que lhe transmite o regaço carinhoso de sua família.
 
Mesmo assim, não se esqueça do que há de frágil na glória, nem o que há de efémero no êxito. Com muito dinheiro, são muitos os que não são cidadãos exemplares, são muitos os que não são modelos de virtudes cívicas, são muitos os que findam os seus dias, sem paz e sem amor. Ora, um atleta da sua craveira, mesmo sujeito a errar, como “é próprio do Homem”, deve manifestar também uma mentalidade forte, uma sólida formação moral. Porque só se é verdadeiro desportista, quando antes se é Homem, na acepção plena do termo. O Cristiano Ronaldo já tem por si a admiração de muita gente, como jogador de futebol! Que a tenha também como Homem! Deixe-me agora assinalar que o prestígio das instituições deve-se quase sempre à conduta dos homens (e mulheres) que os servem (ou serviram). E um Clube que lhe paga e solicitamente o acompanha, como o Manchester United o faz, bem merece, da sua parte, solidariedade e respeito.
 
Uma vez mais, peço-lhe que me desculpe por esta carta. Afinal, eu só queria associar-me, com legítimo orgulho, porque sou português e velho amante do futebol, aos aplausos que, neste momento, o rodeiam – aplausos inteiramente merecidos ao meu compatriota que é considerado por muitos o melhor futebolista do mundo! Eu escrevi “por muitos”? É que, de facto, são muitos também os que apostam em Messi ou Kaká! E com irrecusáveis argumentos…
        
Seu
                                     
 
Manuel Sérgio
 
*Antigo professor do Instituto Superior de Educação Física (ISEF) e um dos principais pensadores lusos, Manuel Sérgio é licenciado em Filosofia pela Universidade Clássica de Lisboa, Doutor e Professor Agregado, em Motricidade Humana, pela Universidade Técnica de Lisboa.

Notabilizou-se como ensaísta do fenômeno desportivo e filósofo da motricidade. É reitor do Instituto Superior de Estudos Interdisciplinares e Transdisciplinares do Instituto Piaget (Campus de Almada), e tem publicado inúmeros textos de reflexão filosófica e de poesia.

Esse texto foi mantido em seu formato original, escrito na língua portuguesa, de Portugal

Para interagir com o autor: manuelsergio@universidadedofutebol.com.br

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Seleção dos campeonatos por índice técnico

Olá, amigos!
neste último texto do ano, queria agradecer a paciência e participação de vocês com os temas e assuntos abordados, muitas opiniões, debates e críticas. Confesso que não é fácil manter semanalmente uma coluna, há dias que estamos inspirados, outros que o assunto é recorrente e há dias que nem se baixasse o Pelé. Mas ressalto que é um prazer e sempre motivante falar do futebol como plano de fundo e da tecnologia e processos que são temas que regem minha atuação profissional.
Para encerrar o ano deixo, conforme prometido na última coluna, a seleção dos campeonatos brasileiros das séries A e B com base nos indicadores técnicos.
Apenas para facilitar, segue parâmetro utilizado para definir os índices para cada função (são parâmetros simples, numa análise superficial, que dependem de outros estudos e aprofundamentos sobre seus pesos e fatores significativos na lógica do futebol. Aprofundaremos-nos nisso no próximo ano, ok?).
Como primeiro critério, estabelecemos um mínimo de participação no campeonato de 25% dos jogos para evitarmos analisar jogadores em números muito reduzido de atuações. A seguir, seguem os itens considerados para cada uma das posições:

A seguir, as seleções por índice técnico ScoutOnline:

 

A discussão pode ser feita em cima dos critérios e dos pesos atribuídos, mas entraremos nesse mérito em outro momento.
A questão é que muitas vezes os holofotes são decisivos para se estabelecer uma seleção de um campeonato. Alguns nomes efusivamente defendidos por ai nem passaram perto da seleção por índice técnico enquanto outros por pouca diferença ficaram fora, mas se estivessem na lista, com certeza não seria injusto devido ao seu desempenho técnico, como são os casos na série A de Patrício, lateral da Portuguesa, Jorge Wagner, Rogério Ceni e Hernanes, do São Paulo, e Kleber, do Santos.
Bom, amigos, sabemos que isso dá muito tema para discussões, mas vamos revigorar as energias e as idéias para o ano que se aproxima de muita reflexão e trabalho. Uma excelente virada de ano e um 2009 com muito sucesso para todos.

Para intergir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br
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Natal

Fim de ano, festas, Arnaldo deixou à beira do lago um sapatinho – não sei onde o conseguiu – com um pedido para o Papai Noel… Comovente. “Meu querido Papai Noel: para mim nada peço, que tudo tenho de sobra: minha caverna, meu lago de águas escuras e tranqüilas, e a companhia de meu amigo Bernardo. Na verdade, o que eu queria mesmo – e não sei se o senhor cuida desse assunto – é muita saúde e vida longa para alguns de nossos mais abnegados dirigentes esportivos, gente como os senhores Carlos Arthur e Ricardo Teixeira, e, se for possível, um tantinho também para todos os presidentes de confederações e federações esportivas, de modo que permaneçam o maior tempo possível à frente de seus pesados encargos. Quem sabe, de quebra, o senhor pode fazer com que dê tudo certo na Copa do Mundo de 2014 e que o Rio de Janeiro seja escolhido para sede das Olimpíadas de 2016, não importa o quanto se gaste nisso.

Sou sensível à maneira como Arnaldo acredita nas pessoas, mesmo quando desconfio delas. Meu ceticismo não evita que o Natal me torne diferente, vulnerável; não precisa muito para me comover nessa época do ano. Deixei o bilhetinho de Arnaldo onde estava e fui conversar com Aurora. Contei-lhe sobre a missiva do bagre.

– Corujas não acreditam em Papai Noel – ela disse – isso é coisa de bagres e de crianças, faz parte da natureza deles. Nós já nascemos não acreditando a não ser na comida nossa de cada dia e no trato dos filhotes, e, assim mesmo, só até emplumarem.

 

E você pediria algo no Natal?

– Sabe o que faço no Natal? Passo a noite à frente da TV. Sintonizo o canal Z33, aquele, e realizo sonhos – ela disse.

– Que sonhos? – perguntei.

E ela me disse de muitos, a maioria, impossíveis. Relato alguns. O canal Z33 só pega na toca de Aurora; transmite sonhos como se fossem realidades. A coruja gostaria que Las Vegas voltasse a ser o centro mundial da jogatina, reassumindo a primazia perdida para Wall Street. Ela também sonha ver os dirigentes do mundo chorando diante da morte de um povo inteiro na África, socorrendo-o antes dos bancos falidos dos Estados Unidos e da Europa. No Z33, na noite de Natal, os senadores da república brasileira descobrirão que existe um país chamado Brasil, habitado por pessoas chamadas brasileiros e brasileiras. E, no distante Iraque, seu tirano será enforcado por seu próprio povo. 

Há mais de hora dizia Aurora de seus sonhos; para quem só pensava na comida de cada dia era de surpreender. Eu, impaciente com aquilo, desviei o assunto para o futebol, pois foi para afogar-me nele que, um dia, deixei as luzes da cidade e mergulhei no fundo de uma caverna. 

– E no futebol, que sonhos há para realizar na noite de Natal? – perguntei.

– Banqueiros, deputados, senadores, presidentes, empresários e burocratas, não mais jogarão com dinheiros e vidas. Isto de fazer esporte ficará, exclusivamente, para os jogadores de futebol, os de basquetebol, de atletismo e outros. 

Quando lhe perguntei sobre nossos grandes craques, Aurora disse que, por maiores que sejam, só receberão dinheiro pelo futebol que jogarem; não mais receberão para vender camisas, tênis, perfumes e lâminas de barbear. E o povo deixará de ser besta e acreditar que jogam para valer.

A conversa foi longa e não é o caso de ficar descrevendo detalhes. Num dado momento Oto passou como um raio, as pequenas garras segurando um maço de papéis, dos amigos que ainda insistem em lembrar de mim e cultivam o velho hábito dos cartões de Natal. Fui atrás dele, para saber de suas idéias sobre a data natalina. Peguei a correspondência e perguntei-lhe:

– E você Oto, o que pensa do Natal?

– Eu acho ótimo – ele respondeu. Oto era assim, curto e grosso.

Quase caí de costas quando ele me contou que estava preparando, com seus amigos morceguinhos, um grande coral, mais de mil vozes. 

– E o que vocês vão cantar? – perguntei.

– Noite Feliz – disse o quiróptero, como se fosse o óbvio. 

Aquele morcego não parava de me surpreender. Esbanjava otimismo. Sua vida era uma espécie de festa a ser comemorada todos os dias. 

– E depois a gente vai fazer um jogo adaptado, casados e solteiros, uns cinqüenta para cada lado, no ar, com uma bolinha de vento – ele continuou.

– E quem são os casados e quem são os solteiros? – perguntei.

– Você nunca entenderia – ele me disse, impaciente, e ficou por isso mesmo. 

E, em seguida, Oto saiu esvoaçante, fazendo manobras, rasantes, comemorando a vida que, para ele, era festa. Estava tão feliz que, na entrada da caverna, deu um mergulho a menos de um centímetro do bico afiado de Aurora, derrubando-a, de susto, do toco onde sentava. O sol se punha no horizonte limpo, vermelho, que desenhava em negro a silhueta do morcego atormentando a paz da coruja Aurora. A noite chegava; com ela, o Natal. Oto fará festa com seus amiguinhos, Arnaldo dará cabriolas no lago escuro, Aurora verá sonhos realizados na sua TV. 

Eu? De minha parte só quero que exista Natal.

Para interagir com o autor: bernardo@universidadedofutebol.com.br

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O magro das pistas

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Balanço do ano

Mais um ano vai-se embora. Corrido, passageiro, com muitas novidades, outro sem-número de polêmicas, mas, sobretudo, com muitos exemplos de como é tênue a linha que separa o bom comportamento da imprensa da exploração banal da notícia.

O ano de 2008 teve alguns episódios marcantes que revelam a efemeridade da conduta dos jornalistas, especialmente quando o assunto é algo tão passional e dinâmico quanto o futebol.

Talvez o personagem do ano seja Ronaldo. Em junho, o Fenômeno foi manchete de todos os jornais após o escândalo em que se envolveu com a travesti Andréa Albertini. Acabado, humilhado, um astro em decadência. O antigo camisa 9 da seleção foi duramente criticado e, mais do que isso, colocado no rol dos craques-problemas, daqueles que não tem mais solução.

Mas aí veio dezembro. E a contratação do Ronaldo pelo Corinthians recolocou-o nos céus. Em época de crise, nada como uma notícia bombástica para desviar o foco da imprensa e reacender no corintiano o desejo de ver o time vitorioso no regresso à Série A do Brasileirão. E Ronaldo, como num passe de mágica, voltou a ser gênio, voltou a ser aquele rapaz acostumado a cair no fundo do poço e se reerguer.

Foi assim também com Muricy Ramalho. Execrado após mais uma derrota na Copa Libertadores, o treinador ficou na corda-bamba. O São Paulo foi nocauteado, e os abutres da informação já previam um 2009 com Muricy em outro clube e com um Tricolor tentando se reerguer depois da hegemonia do bicampeonato nacional.

Mas aí veio dezembro. E a conquista do hexacampeonato brasileiro elevou Muricy ao topo, a ponto de ter como indiscutível a sua presença na seleção. Afinal, só ele ganhou três nacionais na seqüência e pelo mesmo time. Só Muricy acreditava no título tricolor. Só Muricy era ranzinza porque precisava ser. Só Muricy sabia como ser campeão. Só Muricy…

Ou, ainda, com o Internacional de Porto Alegre. Que foi apontado por todos como o grande fiasco do ano antes mesmo de ele acabar. Afinal, com investimento em nomes do calibre de Daniel Carvalho e D’Alessandro, era impossível algum outro time ir bem no Campeonato Brasileiro além do Colorado. Indefinições, jogadores lesionados, falta de entrosamento. Tudo contribuiu para o Inter ser um figurante de luxo no Brasileirão.

Mas… Claro. Aí veio dezembro. E o Inter foi o primeiro time do país a ser campeão da Copa Sul-Americana. Torneio que não valia nada até o ano passado, mas que depois de ter um vencedor do Brasil, passou milagrosamente a ser uma competição importante na visão tacanha da imprensa. E Tite, de motivador sem tática, passou a ser o artífice da vitória colorada, fazendo do Inter o “campeão de tudo”, como brincaram seus torcedores e se esbaldaram os profissionais de imprensa pelo Brasil afora. Simplesmente um luxo!

Por falar em luxo, quem viu a vida trocada neste ano foi Luxa, ou Vanderlei Luxemburgo. Um começo de ano provando que ele vale os R$ 500 mil por mês que são pagos. Palmeiras campeão paulista depois de 12 anos. Time dos sonhos com o dinheiro injetado pela Traffic, clube projetando a modernização do estádio, time líder do Brasileirão após quatro anos.

Mas… Aí veio a TV Globo, que convidou Luxemburgo para comentar um jogo de futebol. Até aí esse era o menor dos problemas, se não fosse um mero detalhe: a partida era do próprio Palmeiras, pela Copa Sul-Americana, então desprezada pelo time após perceber o óbvio, que o elenco era fraco demais para disputar em boas condições duas competições simultâneas.

E Luxa foi para a telinha, ao mesmo tempo em que, pelo rádio, instruía o auxiliar Nei, que lá da Argentina tentava dar rumo para um time que perdia o seu rumo exatamente naquele momento. E Luxemburgo viu não só o Palmeiras perder, mas sua pose de “melhor do Brasil” começar a ser contestada. Não pela imprensa, que não condenou o imponderável. Mas pela torcida e, principalmente, pelos próprios jogadores do clube.

O Palmeiras desandou e não foi campeão nacional, mas no final das contas conseguiu a vaga na Libertadores graças ao fracasso de outro treinador que foi do céu ao inferno pelo segundo ano seguido: Caio Júnior, comandante que não soube comandar o Flamengo na reta decisiva do Brasileirão para assegurar uma vaga na competição sul-americana.

E temos outros incontáveis exemplos de céu e inferno neste ano que chega ao fim. E por que isso acontece? Para variar, o resultado pauta o noticiário esportivo. E, dessa forma, quem trabalha na área acaba na gangorra da opinião pública. Tão volátil quanto o placar de um jogo.

Que o novo ano traga um pouco de lucidez para a imprensa e paute os jornalistas para buscar a profundidade nas análises, deixando o resultado do jogo para mostrar que o esporte é tão legal por ser extremamente imponderável. O São Paulo e o piloto Lewis Hamilton que o digam.

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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O que aprender com Luiz Felipe Scolari

O futebol como já insisti outrora, é invariavelmente visto de forma demasiadamente simplista. E se isso já fora privilégio dos “boleiros”, hoje parece contaminar também nossos estudiosos da bola.
Amparados pelo discurso científico, caem em armadilhas contrárias as suas próprias crenças.
Dia desses, estampou as manchetes de jornais ingleses a contestação por parte de alguns jogadores do Chelsea sobre decisões tomadas, conhecimento tático e forma de se treinar do treinador brasileiro Luiz Felipe Scolari (“Big Phill”).
O “Big Phill” começou com desempenho magnífico. Em poucas semanas de trabalho jornais do mundo todo cantavam aos quatro cantos que Felipão bateria os recordes do seu antecessor no comando da equipe inglesa, José Mourinho.
As coisas não saíram exatamente como o planejado (ou melhor, não saíram como jornalistas, “especialistas” e torcedores planejavam). As críticas não demoraram a aparecer e recentemente, aproveitando-se do advento da reclamação interna dos próprios jogadores, nossos “cientistas do esporte” passaram a reiterar suas convicções sobre a “incapacidade e falta de conhecimento” do treinador brasileiro.
É fato, concreto e indiscutível, o bom desempenho em resultados de jogos e competições de Scolari (sem ir muito longe) pelo menos nos últimos 10 anos. É fato também que desde seus tempos de Grêmio ele tem como companhia o estereótipo de “paizão”, “motivador” e “xerifão”, e que muitas pessoas há tempos atribuem a essas características o bons resultados que vem alcançando na carreira.
Para os críticos, falta-lhe conteúdo e conhecimento sobre as coisas do jogo.
Senhores, não sei o que lhe falta. Realmente também não penso que esteja Felipão (ou qualquer outra pessoa) apto a ter bons resultados em ambientes diferentes tomando sempre as mesmas decisões e aplicando sempre as mesmas idéias.
Isso pode ou não, ser grave problema, dependendo do tempo que se leva para perceber o ambiente e se reajustar às novas situações.
Achar não é ciência, mas tendo (não sendo científico) a pensar que Scolari vai ser mais rápido do que os problemas. Terá mais dificuldades para isso dessa vez do que nas vezes anteriores; mas já demonstrou inteligência para tal.
O “peso” atribuído a determinadas variáveis no futebol inglês é diferente do futebol português, do brasileiro, do italiano, etc. Vencer em diferentes países requer competências dominantes distintas.
Não estou eu aqui defendendo métodos de treino, modelo de gestão ou conhecimento tático do treinador brasileiro. Primeiro porque não acompanho seu trabalho no dia-a-dia de treinos e jogos. Segundo porque o “jogar” do Chelsea realmente já fora melhor em outros tempos (mas há de se lembrar que a equipe de Felipão teve desfalques importantes em diversos jogos desta temporada).
O que estou defendendo aqui é que no “futebol complexo” em que acredito, estudo e aprendi a pesquisar, todas as variáveis e dimensões são importantes, a todo tempo, o tempo todo.
Então, para uma visão não simplista, dever-se-ia analisar um trabalho não pelo excesso de tal competência ou ausência daquela outra, mas pelo como são resolvidos os problemas e são movimentadas as “engrenagens” para tais soluções no ambiente complexo em que se encontra.
Daí, ao invés da armadilha de criticar Scolari por ignorância nisso ou naquilo, saboreemos e aprendamos como ele resolverá ou não, os problemas do seu ambiente “futebol inglês”, e entendamos, de uma vez por todas, que, didaticamente, as inter-relações entre “as coisas” são tão importantes quanto “as coisas”, sempre…
E terminando:
Para Dante, o lado sinistro é o que conduz ao inferno, enquanto o lado direito leva o céu. De qualquer forma, é sempre bom ter os dois lados atentos”. (trecho do livro “O aprendiz do tempo” de Ivo Pitanguy)

Para interagir com o autor: rodrigo@universidadedofutebol.com.br

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As decisões da Fifa Exco

Caros amigos da Universidade do Futebol,

No dia 20 de dezembro passado, a Fifa realizou a última reunião deste ano do seu Comitê Executivo (Fifa Exco), em que importantes deliberações foram tomadas. Passamos aqui, brevemente, a comentar as principais decisões tomadas.

A primeira delas foi a de que os biddings para as copas de 2018 e 2022 serão realizados simultaneamente. Vale aqui lembrar que a regra da rotatividade entre confederações foi extinta, e substituída pela inelegibilidade de uma confederação sediar os dois eventos seguintes à realização de uma determinada copa (e.g., nenhum país da Conmebol pode sediar as copas de 2018 e 2022, após a copa de 2014, no Brasil).

A decisão dos países-sede deverá ser proferida em dezembro de 2010.

Outra importante decisão girou em torno da proteção de menores no futebol. O Exco reconheceu que essa é uma obrigação moral de todos os membros da Fifa (Federações Nacionais). Desta forma, importantes alterações foram aprovadas ao Artigo 19 do Regulamento de Transferência de Jogadores, que trata da questão.

Todas as transferências internacionais de menores de 18 anos que forem requisitadas com base nas exceções daquele artigo deverão ser analisadas por um subcomitê da Fifa (como sabemos, em princípio e via de regra, as transferências internacionais de menores são proibidas pela Fifa, salvo alguns casos específicos).

Além disso, o Artigo 19 passa a tratar também das academias privadas (que foi inclusive objeto uma de nossas colunas passadas). Na mesma linha de nosso entendimento aqui exteriorizado, a Fifa confirma sua preocupação com os jovens jogadores registrados nessas academias, e passa agora a obrigá-los a serem também registrados nas federações nacionais.

Essas decisões vêm como resposta às recentes manifestações da Presidência Francesa do Conselho da União Européia, no sentido de estabelecer como prioridade no futebol, inter alia, a proteção de menores.

Como a Fifa se vê impossibilitada de proibir todas as transferências de menores no futebol sem exceções como aparantemente gostaria (por questões de ordem legal), essa é mais uma medida que visa impor um maior rigor na aplicabilidade da regra atualmente existente (que engloba certas exceções à proibição como mencionado acima).

Resta agora saber como será composto esse subcomitê e quais serão as diretrizes para enquadrar os casos futuros no escopo do Artigo 19. Também temos que saber como será feito o registro dos jogadores das academias privadas, pois se trata de um tema bastante controverso.

Enfim, são mais fatos a ser observado no ano de 2009 no âmbito da atuação da Fifa, e futuramente reportado aos nossos leitores.

Aproveito para desejar a todos os nossos leitores um Feliz Ano Novo, repleto de saúde, realizações e sucesso.

Para interagir com o autor: megale@universidadedofutebol.com.br

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É Natal

Então é Natal, e Natal tem muitos significados. Não a cidade, obviamente, que significa apenas uma cidade.

A data, porém, tem variadas interpretações para vários tipos de pessoa.

Este colunista acredita que, dentre outras coisas, muitas pessoas deveriam aproveitar a data, o fim de ano, as férias e tudo mais para refletir. Natal é tempo de reflexão.

Reflitamos, portanto.

Você pode pensar a respeito de várias coisas. Para aquilo que interessa esse espaço, é válido pensar para que afinal serve o futebol.

Acho que já perguntei isso aqui antes. Pergunto outra vez: para que serve o futebol?

Alguns acham que é um meio de inclusão social. Outros acham que é um fenômeno de massa. Terceiros acreditam que é um instrumento de manipulação política. E quartos acreditam que é entretenimento puro.

Obviamente que ninguém está errado, uma vez que todas as opções supracitadas são válidas. E essa validade permite que elas coexistam.

Nenhuma opção está errada. Mas também nenhuma opção está exclusivamente certa.

Para uma criança sem maiores perspectivas de vida, é um meio de ganhar dinheiro e subir de classe social. Para o primo dessa criança que sabe que ela joga muito, é um o futebol é bom jeito de garantir uma ajuda de custo no futuro. Para o olheiro que busca talento, a criança é uma aposta, e o futebol é o cassino. E assim por diante.

Futebol, assim como o Natal, significa diferentes coisas para diferentes pessoas.

Reflita sobre isso.Um ótimo Natal.

Para interagir com o autor: oliver@universidadedofutebol.com.br
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Contratação e renovação de contrato: existem critérios?

No fim do ano, o mercado do futebol no Brasil fica a todo vapor com contratações e listas de dispensas.

Sempre falamos da necessidade de um processo amparado por recursos tecnológicos, por procedimentos e critérios bem definidos, enfim, com base num planejamento sistemático.

Como os clubes brasileiros contratam?

O São Paulo sempre é tomado como referência, em virtude das últimas conquistas, embora eu ainda considere que há muito mais fumaça do que fogo, mas não posso ir contra os fatos. O tricampeão brasileiro possui um profissional que gerencia as novas contratações há muito tempo e que é, sem duvida, um dos principais responsáveis pelo sucesso recente do time. Chama-se Milton Cruz. Atento à qualidade e à oportunidade de mercado, ele foi diretamente responsável pela chegada de jogadores que muitas vezes foram extremamente criticados pela torcida e pela imprensa, e por meio de um planejamento e de uma sistematização de trabalho continuo puderam mostrar o porquê foram escolhidos.

Quem não se lembra da chegada de Danilo, Josué e Fabão, criticados intensamente e depois se tornaram campões mundiais. Assim foi nos últimos anos, e basta observamos um exemplo do atual elenco que foi tido como destaque no Botafogo nos últimos anos e chegou ao são Paulo, no início, com muitas criticas e, ainda que não tenha se firmado titular, é um jogador que já participou dessa conquista e vai se tornar, sem dúvida, uma peça chave nas próximas temporadas. 

O olho (ou critérios) de Milton Cruz deve ser valorizado, pois toda vez a equipe busca nomes consagrados nunca o resultado acontece como o esperado, ao contrário de quando nomes de menor destaque e até mesmo sem muita pompa chegam ao Morumbi e atravessam certa desconfiança. A manutenção do jogador independente de uma temporada irregular também faz diferença. Vejam Borges, que Murici insistia em não escalar no ano passado, mesmo quando o atleta na reserva era um dos artilheiros da equipe. Nova temporada e vejam a importância do jogador na conquista deste ano.

Mas, ampliando a nossa análise, os clubes brasileiros têm qual critério para contratar? À mercê dos agentes e oportunidades de ganhar dinheiro, ou interesses estranhos, nem sempre a avaliação numa contratação se dá por critérios técnicos. Aliás, nem sempre é eufemismo, na verdade, o que interessa é se o jogador tem idade e potencial de gerar lucro com sua futura venda.

Utilizei uma lista dos top 10 em ações técnicas da ScoutOnline e observando as manchetes e especulações faço algumas reflexões.

O Flamengo deve dispensar Jailton, jogador que aparece em 7º lugar na lista dos que mais desarmaram no campeonato, olha sabemos que números podem ser interpretados de outras formas, mas se um zagueiro (afinal foi a função que mais desempenhou na equipe, apesar de ser volante de origem), que tem entre suas principais funções recuperar e desarmar os adversários, aparece entre os top 10 no quesito, sendo que outros dois zagueiros Ronaldo Angelim e Fabio Luciano aparecem na 40 e 139 colocações, a sua dispensa deve com certeza ter outros motivos que não o desempenho técnico.

Talvez, seja porque não se dê o devido valor às ações técnicas de um jogador de defesa, porque quando olhamos a questão de finalizações as equipes não perdem muito tempo. Na lista dos top 10 de finalização aparecem jogadores que deixam o mercado bem movimentado, sobretudo com Edno (2º), da Portuguesa, e Adeilson (8º),  do Ipatinga. Marquinhos (10º), do Vitória, já fechou com o Palmeiras.

Na NBA, já falamos diversas vezes, os contratos são feito por metas, e renovados conforme o desempenho dentro dessa meta. Existem jogadores que são contratados para, se forem escalados, em média, dois minutos por jogo, apresentarem um desempenho médio de 1,5 pontos, 0,7 assistências, 2,1 roubadas de bola seguidas de cesta, e por aí vai. E, com certeza, ninguém fica dizendo que o que importa é número inteiro porque ninguém ganha um jogo por 1,5 cesta.

Assim como no futebol ninguém ganha um jogo por 0,5 gols ou por 0,3 assistências. Mas, inserindo essas médias ao longo de uma temporada, tem-se indicadores que podem fazer a diferença. 

Pelo exemplo citado da NBA, que conta com uma temporada regular de 82 jogos, esses números do suposto atleta teriam contribuído com 524 pontos somando assistência, pontos e roubadas seguidas de cesta (considerando dois pontos por cesta), o que dá uma média superior a seis pontos por jogo. Poderíamos seguir e analisar quantos jogos a equipe fictícia venceu por seis ou menos pontos de diferença e poderíamos, numa analise bem simplista, avaliar o desempenho desse jogador, mesmo não sendo um dos destaques da equipe.

No exemplo do futebol, nosso atleta teria feito 19 gols no campeonato brasileiro e 11 assistências, ou seja, seria responsável por 30  gols da equipe na competição. Se considerarmos que o melhor ataque do campeonato fez 66 gols esse jogador teria sido responsável por 45% dos gols da equipe. 

Se pararmos com suposição e começarmos a analisar dados concretos, observamos que no Santos, que teve 44 gols na competição, Kleber Pereira foi responsável direto por 26 deles, sem entrarmos numa análise mais complexa da lógica do jogo, o que nos traria muito mais informações e aspectos determinantes das partidas. Em outro exemplo, podemos identificar que Hugo, Jorge Wagner e Borges foram responsáveis por 73 % dos gols do São Paulo. 

Quando utilizamos uma resultante nítida que é o gol fica mais fácil compreendermos as informações, mas existem outras funções que não só o gol que podem ser determinantes para o resultado do jogo, isto é (antes que os maliciosos venham dizer que sem gol o jogo é 0 x 0), existem outros índices que permitem uma equipe ou jogador se destacar ou na elaboração das jogadas que surgem os gols ou ainda na prevenção dos mesmos.

Bom, espero que o amigo não tenha se perdido nos números, mas gostaria que observasse e refletisse o quanto pode ajudar numa contratação ter um critério, ter parâmetros para avaliar o que você está comprando. 

E, sobretudo, não é comprar por comprar, e sim ter indicadores de desempenho que mostram o rendimento do atleta , inclusive ajudando a distinguir se o desempenho está vinculado às funções destinadas pelo técnico ou se tem outros fatores.

Porque senão, o único fator vai ser o retorno $$$, que é sem dúvida importante para a manutenção do espetáculo e do profissionalismo que tanto defendo no futebol, mas não pode ser o único critério porque, quando a crise do chega ao futebol e quando faltar crédito (habilidade e competência técnica dos jogadores),  as especulações (transações de jogadores medíocres por grandes quantias), os bancos (futebol) quebram…

Bom, na próxima semana, vou mais uma vez me debruçar sobre os dados e trazer, por índice técnico,  qual seria a seleção do campeonato da série A e da série B.

Desejo a todos os amigos um feliz natal com muita paz e reflexão e que possam fazer renascer d
entro de cada um o melhor de nós: a esperança de que amanhã será sempre melhor que hoje, desde que façamos nossa parte.

Para interagir com o autor: fantato@universidadedofutebol.com.br

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Hora do treino

O momento em que se encontra o futebol brasileiro poderia ser uma excelente oportunidade para que os nossos dirigentes resolvessem treinar. Não, o objetivo não é fazer com que eles tentem eliminar a quase sempre proeminente barriga que já apresentam. Mas sim exercitar o treinamento do trato com a imprensa no dia-a-dia.

A pérola proferida por Roberto Horcades, presidente do Fluminense, revela bem o baixo nível que predomina no futebol da atualidade. No último dia 16, ao anunciar a renovação do contrato com René Simões, o mandatário das Laranjeiras justificou o acordo da seguinte forma:

“Se ele (René) conseguiu fazer com que meninas com dois neurônios fossem vice-campeãs olímpicas, se trata de um bom profissional”, afirmou Horcades.

A declaração gerou tanta mídia para o Fluminense quanto a contratação de Ronaldo pelo Corinthians. O “Jornal da Globo” do mesmo dia dedicou chamadas a cada bloco para a declaração do dirigente ao final do treino. Outros veículos também deram alarde para a genial frase de Horcades.

O mau exemplo do chefão do Flu, porém, evidencia um problema muito maior no futebol brasileiro. A verdade é que é difícil encontrar um dirigente que esteja, de fato, preparado para lidar com o stress e a cobrança diária que é conceder uma entrevista à imprensa, ainda mais na relação jornalista-clube de futebol.

Obviamente são muitos os casos de “cartolas” que estão mais do que escolados e não cometem deslizes infantis quando estão numa entrevista. De tanto conviver com o meio, eles sabem quais são as mais banais armadilhas, como evitá-las e, os mais espertos, sabem como criar arapucas para a própria imprensa.

Eurico Miranda e Mustafá Contursi são dois excelentes exemplos desse tipo de dirigente que já tem uma imagem pré-concebida de como funciona a imprensa e tratam de fazer de tudo para que ela trabalhe em seu benefício.

Mas o fato é que, com o futebol cada vez mais profissionalizado, aberrações como essa frase de Horcades não podem mais existir. Já falamos diversas vezes neste espaço sobre o efeito que um “media trainning” pode ter num clube de futebol. Ensinar as armadilhas do jogo a atletas, treinadores e dirigentes é um investimento com alto retorno para uma instituição.

Nossos cartolas poderiam aproveitar a pausa das férias para colocar em prática essa ação. Por que não treinar um pouco no momento de descanso, em que a cobrança da imprensa costuma ser um pouco menor?

Seria um excelente presente de Natal para os torcedores e, obviamente, para os clubes representados. Mas parece que está mais fácil esperar pela chegada do Papai Noel na madrugada do dia 25.

Falando nisso! Bom Natal a todos!

Para interagir com o autor: erich@universidadedofutebol.com.br

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Preparação Física vs “Periodização Tática”: os erros de um combate!

Entendamos de uma vez por todas senhores: a “preparação física” é importante para se jogar futebol!

Não seria eu “louco” de dizer o contrário. Estaria contra mim mesmo e contra o norte que escolhi (a Teoria da Complexidade) se desprezasse (ou menosprezasse) a “preparação física”.

E preciso hoje falar sobre isso porque tenho ouvido, visto e lido muitas coisas equivocadas a respeito do assunto.

Um sem número de estudiosos, pesquisadores e treinadores têm alardeado aos quatro cantos do mundo o que chamarei de “periodização tática” portuguesa. Não discutirei aqui dessa vez os conteúdos e nortes dessa proposta. É fato, porém, que antes dos portugueses; russos e franceses (e mais recente do que esses, os espanhóis) já apontavam outros rumos para a iniciação, especialização e treinamento de alto rendimento nos esportes coletivos (e aqui em especial, no futebol).

Os portugueses ganharam força na sustentação da sua teoria com a rápida ascensão do treinador José Mourinho. Não sei se Mourinho e pesquisadores portugueses estão falando a mesma língua, mas os ventos sopram que sim.

Infelizmente vejo muita distância entre o que se está propondo em Portugal (especialmente os “filhos” da Universidade do Porto) e o que realmente está acontecendo em Portugal; assim como vejo grande abismo entre os conceitos e construtos que nasceram de russos e franceses (e de alguns próprios portugueses que estudaram Jogo, Complexidade, Caos, Imprevisibilidade, etc) para a prática portuguesa.

Tenho a impressão, por vezes, que tem se buscado ser igual à Mourinho e não explorar a fundo no dia-a-dia dos campos as bases teóricas que são discutidas.

A ação de um treinador transcende o método (leiam a tese do Dr. Hermes Balbino: “Pedagogia do treinamento: método, procedimentos pedagógicos e as múltiplas competências do técnico nos jogos desportivos coletivos”), mas o método terá grande peso no alto nível competitivo quando as ações de diversos treinadores tiverem equivalência e fizerem com que suas equipes vençam.

Então, para avançar não se deveria buscar Mourinho, mas sim ir à frente com o método.

É ponto pacífico e muito claro que o treino técnico-tático tradicional não era, há décadas atrás, suficiente para garantir boa performance de jogo ao longo de 90 minutos (assim como nos moldes atuais também não é – e tenho muitas dúvidas se os “óculos portugueses” [e aqui excluo Mourinho] seriam; realmente creio que não!).

É ponto claro (e não tão pacífico) que dentre as decisões possíveis para se tentar compensar em “sobrecarga” a incapacidade do treino técnico-tático tradicional de gerar respostas “adaptativas” positivas e adequadas (me desculpem os biólogos), a escolhida não foi a melhor (criou-se em separado, o treino físico).

Há muito venho dizendo que não é possível separar o que é físico, do que é tático, do que é técnico, do que é mental no jogo de futebol. Sinto não saber como ser mais claro.

Tudo que vejo em um jogo carrega tudo (todas as variáveis, juntas e ao mesmo tempo).

Isso significa que o treinamento para preparação do jogador de futebol precisa sim contemplar a complexidade que é inerente ao jogo.

Com isso, não estou eu a defender a tal “Periodização Tática” portuguesa; não nos moldes que ela é proposta, porque vejo nela uma dificuldade dos seus “mentores” de levá-la a prática. E não é pela inconsistência da teoria, nada disso! Os construtos são em sua maioria muito fortes.

O fato é que não considero boa a “decodificação” que fazem do seu ótimo corpo teórico quando o levam para a prática. Então o problema não está na proposta em si (ainda que também tenha minhas considerações sobre isso), mas no como ela vem sendo construída na prática.

Não estou eu aqui também a defender o treinamento tradicional ou o treinamento físico fragmentado. Isso já deveria ter sido superado.

O fato de algumas frentes pelo mundo estarem tentando novas perspectivas para o treinamento do jogo de futebol, pautadas no mesmo pressuposto teórico, não quer dizer que tenham a mesma interpretação e formatação desse pressuposto.

Por enquanto, o que posso dizer é que estão enganados aqueles que entendem que um modelo de periodização, treinamento ou seja lá o que for, que estruture suas bases de forma a não separar o que é tático, técnico, físico e mental não pode sustentar o desempenho atlético de um jogador em jogo.

Estão enganados também os que vêm no “modelo português” (ou em um único português – Mourinho) a resposta pronta ou salvação do treino no futebol, assim como se enganam os que trazem como solução paralela o que é chamado de Modelo de Treinamento Integrado (que teve especialmente trabalhos e pesquisas russas, americanas e alemãs como fonte primeira de inspiração) através de uma falsa não-fragmentação do jogo de futebol.

O que proponho, senhores é outra coisa e posso desde já dizer que em breve publicarei resultados a respeito disso. Sem maniqueísmos lembro que os Modelos Tradicionais, de Blocos, Cargas Seletivas, Periodização Integrada, Periodização Tática, Periodização Composta, etc, precisam ser conhecidos para que suas idéias sejam discutidas e para que os porquês das coisas fiquem claros na opção por esta ou aquela conduta de trabalho.

O que precisamos buscar é uma “Periodização de Jogo®( Leitão 2009 no prelo)“que contemple realmente o jogo, em dinâmica e carga (cognitiva, fisiológica, física, etc) fractalmente.

Que fique claro: o mais importante não é o que é tático; o mais importante não é o que é físico, técnico ou mental.

O mais importante é o que é JOGO e ponto.

Se não entendermos a fundo o que é JOGO e não soubermos transferir aos campos aquilo que nossos construtos teóricos apontam, acabaremos acusando proposta, modelo e método de falhos, mas estaremos nos cegando para o problema real, que é a nossa incapacidade de levarmos à prática o nosso discurso.

Para interagir com o autor: rodrigo@149.28.100.147