Categorias
Colunas -

O jogo lento brasileiro

Crédito imagem: Lucas Uebel/Grêmio FBPA

É normal ouvirmos no mundo do futebol que os jogos no Brasil são mais lentos do que na Europa. Claro que isso não está relacionado à velocidade dos jogadores, já que se pegarmos as distâncias percorridas a maioria dos jogadores por aqui corre mais do que os que estão lá fora. Porém aqui muitos correm errado. Correm a toa. Mas, enfim, mesmo que equivocado, falar que o jogo aqui é mais devagar é mais específico do que o termo vazio e comum: ‘lá se joga outro esporte’.

A impressão de um jogo mais ágil se dá pelo volume de ações. Por exemplo, ao receber a bola um jogador pode pará-la, dar um, dois, até três toques antes da próxima ação. Ou ele pode já ter escaneado tudo a sua volta e assim que a bola chega já executar a ação seguinte. Essas frações de segundos somadas em um esporte coletivo criam a sensação de um jogo mais dinâmico para quem está assistindo.

E nisso entra um outro elemento ainda incipiente no Brasil: o jogar sem a bola. Por aqui ainda é difícil incutir a ideia de que longe da bola não quer dizer longe do jogo. Dentro do exemplo que citei de a ação com a bola ser executada rapidamente, se houve uma marcação curta, agressiva e atenta, quem tem a posse será levado automaticamente a ser mais rápido, sob pena de perder a bola.  Se a marcação é frouxa e distante, inconscientemente o portador também será levado a uma ação mais lenta. 

Perceba como o jogo é um todo. Todas as fases e elementos estão conectados. O todo é maior do que a soma das partes. Uma marcação distante incentiva a uma posse mais lenta, com muitos toques “inúteis”, antes de a próxima ação concreta ser de fato realizada. E vice-versa. O jogo brasileiro ainda tem muitos momentos em que nada acontece. Se antes a cadência do meio-campista brasileiro encantava a todos, hoje isso é visto como falta de intensidade. O alto nível é jogado em pressão de tempo e espaço. O jogo é mais rápido no decidir, agir e recuperar. Enquanto ainda ficarmos discutindo e lamentando a escassez dos clássicos ‘camisas 10’, o jogo europeu de alto nível ganhará ainda mais velocidade em comparação com o nosso.

Categorias
Áreas do Conhecimento>Humanidades|Conteúdo Udof>Artigos Artigos Colunas Colunas -

O futebol como negócio

Crédito imagem: Reprodução/Conmebol

Ainda ouviremos, vinda de quem dirige o futebol brasileiro, a frase de Michael Corleone dita no filme O poderoso chefão: “Não é nada pessoal, são apenas negócios.” Com ela, nossos ilustres dirigentes responderiam aos reclamos da torcida brasileira a respeito da decadência do futebol pátrio, com seus espetáculos insuportáveis. De fato, eles, que dirigem o futebol e outras coisas no Brasil, sabem que não precisaria ser assim tão ruim o jogo de bola por estas bandas, mas, com muito menos trabalho e com igual ou maior lucro, para que melhorar?

Talvez nem tenham nada contra o povo brasileiro, sobretudo a parcela admiradora e torcedora do nosso futebol, mas são apenas negócios. Não se trata de futebol, especificamente. Poderia ser qualquer outra atividade profissional, como exportação de carne, reciclagem de lixo, venda de franquias, não importa, desde que produza lucros astronômicos. Portanto, por que não o futebol? Das práticas sociais esportivas, certamente a mais lucrativa no cenário brasileiro; seu peso na economia brasileira não se limita ao Esporte e assume importância considerável.

Não é de hoje que o futebol assumiu ser, além de uma prática social que expressa, de modo hegemônico, nossa cultura corporal, uma poderosa arma política e de rentabilidade econômica incomparável. Em sua tese de doutorado, a professora Mariana Martins (2016) já corroborava essa compreensão, e ainda acrescentava que há um mercado que gira em torno do futebol, que atua, então, como um meio de valorização de outros negócios.  

A transformação dos estádios em arenas multiusos, a espetacularização das transmissões das partidas e a apropriação do futebol como objeto de marketing foram outras mudanças efetivadas que o transformaram, acima de tudo, num negócio.  

Há ainda outra abordagem que poderíamos fazer a partir desta compreensão do futebol enquanto negócio. O futebol, por vezes, não é somente um negócio para os empresários, patrocinadores, clubes, emissoras de televisão e investidores (dentre outros), mas é também uma importante fonte de renda para as famílias, certamente, que visualizam na carreira do seu filho (e quem sabe, no futuro, da sua filha) uma possibilidade de ascensão social.

Dessa forma, muitas famílias investem na carreira do seu filho. Destinam os recursos limitados que possuem para que ele possa treinar, comer melhor, viajar para fazer testes/peneiras, comprar uma boa chuteira. E não é raro que larguem até mesmo seus empregos para terem maior disponibilidade para cuidar integralmente da sua carreira e fazer dele, seu filho, um ídolo do futebol profissional. 

Pois é… para ter o futebol como um negócio, e muito rentável, é preciso transformar os jogadores em celebridades.  O público vive de mitos, de heróis, de ídolos! Mas empresarialmente falando, isso é coisa fácil de resolver: mitos e ídolos podem ser fabricados a qualquer momento, basta incensar um jogador por algum tempo, produzir vídeos apenas com suas boas jogadas, congestionar as redes com as imagens do escolhido e, pronto!, está feito o herói. O público também vive de escândalos, de denúncias, de jogadas e arbitragens duvidosas. Há muita coisa para empolgar a torcida; nem só de futebol vive o futebol! Se o futebol é, então, uma mercadoria e um negócio, ele precisa de produtos. É aí que entram os jogadores. Mas esse debate vamos deixar para um próximo texto.

Categorias
Colunas -

Vamos desfrutar de Abel Ferreira

Crédito imagem: Reprodução/SE Palmeiras

O empoderamento que os treinadores estrangeiros têm aqui no Brasil é inegável. O ambiente os protege mais. Torcida, imprensa, diretoria…todos têm uma paciência e uma tolerância maior. Porém, chega um momento que esse prazo extra se esgota e eles entram no mesmo balaio dos técnicos brasileiros: ou ganha ou sai. Por isso, no final das contas, o que vai prevalecer é a competência. É a qualidade do trabalho. Independentemente da nacionalidade, todo técnico aqui no Brasil paga, cedo ou tarde, pelo imediatismo e ausência de critério de avaliação por quem toma as decisões.

Por isso, quando o português Abel Ferreira vem aqui e com tão pouca idade – 42 anos – conquista esses excelentes resultados com o Palmeiras e, mais do que isso, convence não só pelo jogo, mas também pela comunicação, pelo exemplo, oratória e mentalidade, devemos aproveitar, usufruir e aprender ao máximo.

Abel é um estrategista nato e estuda o jogo nos seus pormenores. Ainda temos dificuldades em avaliar e conceituar termos como jogo bonito, jogo propositivo, jogo eficiente e etc. Ainda paira uma errônea ideia de que para jogar bem tem que ter mais posse de bola que o adversário, ficar mais tempo instalado no campo ofensivo, trocar mais passes e etc. Abel nos mostra que a beleza está em se ter uma ideia clara do que fazer com e sem a bola, em todas as fases do jogo, e executar tudo isso o mais próximo da excelência. 

E o que dizer da mentalidade preparada para o alto rendimento que o técnico português demonstra em cada aparição pública, com os microfones… além de explicar detalhadamente o porquê de cada decisão técnica e tática, Abel fala com uma propriedade acima da média para os nossos padrões sobre alta performance, cultura vencedora, sucesso pessoal e coletivo. Com seus conhecimentos sobre PNL (Programação Neurolinguística), o português dá aula em cada entrevista sobre liderança, relações interpessoais e de como fazer uma gestão eficaz do ambiente.

Um dos erros que não podemos cometer no futebol é acreditar que já sabemos tudo. Que o nosso conhecimento atual, seja pelo estudo seja pelo tempo de prática, já nos condiciona ao sucesso. É preciso humildade e mente aberta para aprender com tudo e com todos. Enquanto ficarmos repetindo que somos os pentacampeões mundiais e que os outros é que têm que aprender com nós estaremos não apenas parados no mesmo lugar, mas sim regredindo. Sim, temos que aprender com o português Abel Ferreira!

Categorias
Colunas -

“Ame e jogue o que quiseres”… escritos sobre o Futsal


Crédito imagem: Reprodução/CBFS

Há um tempo eu li uma carta que me marcou e me fez refletir por diversas questões. Essa carta foi escrita por Kobe Bryant ao se aposentar e foi destinada a quem ele era apaixonado desde muito cedo: o basquetebol.

Entretanto, as minhas habilidades com o arremessar a bola na cesta são questionáveis, por isso eu não venho falar do basquetebol. Esse texto será dedicado ao futsal, por quem eu sou apaixonada desde muito cedo. Nessas próximas linhas, irei pontuar e dar uma ideia geral sobre a proporção que essa modalidade em específico tomou na minha trajetória de vida.

Confesso que eu não sei exatamente quando o futsal surgiu na minha vida, mas sei que foi paixão “ao primeiro chute”. Ao brincar na rua, eu aprendi a jogar altinha, golzinho; eu e meus amigos ali da vizinhança fazíamos competições para ver quem “petecava” mais e fazíamos do portão da vizinha o nosso “gol” – torcendo para que a bola não caísse no quintal dela, que poria fim ao nosso “campeonato”.

Fora das duas linhas da calçada, eu tentava entender o porquê diziam que existe esporte para homens e esporte para mulheres. Por que dessa pergunta? Você já deve imaginar: eu, enquanto mulher, “não devia” praticar esse esporte, pois não era “adequado”.

A dimensão que o futsal tinha na minha vida era tamanha, e suficiente para que eu levasse essa paixão para dentro da quadra da escola na qual eu estudava. Eu observava e via que as meninas só escolhiam o vôlei, e num certo dia eu escolhi o que “só” os meninos podiam escolher: o futsal. Imagine você o falatório que não foi naquele dia, principalmente, em que eu escolhi jogar esse jogo dito como masculino.

Depois disso, foram surgindo outras meninas que gostavam também de jogar, e isso foi suficiente para montarmos um campeonato interclasses na escola com equipes inteiramente femininas. No ano seguinte, surgiram as Olimpíadas Estudantis – campeonato interescolar do município de São Paulo – e agora nós podíamos representar a escola com a modalidade esportiva que por muito tempo não nos deixaram jogar. Os treinos eram no contraturno escolar e eu lembro perfeitamente dos professores chegando na quadra com os materiais, da conversa anterior ao treino, dos erros e acertos nos exercícios e do frio na barriga gerado pela expectativa do dia do jogo.

Toda a junção dessas vivências tornou o futsal ainda mais grandioso para mim: foi através dele, e dos professores que não me deixaram desistir de praticá-lo, que eu descobri o gosto pela Educação Física e a escolhi como profissão. O meu primeiro emprego? Foi trabalhando com futsal. Eu pude usá-lo para formar meninos e também meninas. Aliás, foi com elas que eu entendi a importância da minha insistência, anos atrás, de mostrar que o esporte não tem gênero.

Se antes algumas meninas compunham as equipes da escola sem gostar muito do jogo e mais na intenção de vivenciar experiências diferentes, a geração atual – que eu tive o prazer de treinar – estava lá porque era apaixonada, como eu, pelo esporte e isso estava explícito no brilho dos olhos de cada uma.

Foi através do Futsal que eu representei a mesma escola como aluna e como Professora. As duas ocasiões foram fundamentais para a minha formação, mas foi com os olhos da docência que eu vi o quanto o esporte pode transformar vidas. As meninas conseguiram êxitos materiais (troféus e medalhas), mas mais do que isso, elas contribuíram, mesmo sem saber, para que outras meninas acreditassem que também podem jogar com a bola nos pés.

Então, posso dizer que esse texto tem um pouco da menina de 9 anos que não entendia o porquê a prática do Futsal era bem quista somente aos meninos. Essas linhas são escritas também pela jovem de 14 anos que jogava, representava a escola e que aprendeu valores fundamentais que contribuíram para que ela pudesse estar onde está atualmente.

Por fim, esse texto foi estruturado pela mulher de 20 e poucos anos, já Professora, que pôde usar o Futsal para treinar e formar meninos que valorizam e apoiam as meninas que conservam essa paixão pelo esporte; e que treinou e formou meninas que vão sair por aí mostrando que as quadras, campos, pistas e locais de jogos podem e devem ser ocupados por mulheres. Mais do que isso: são essas meninas que hoje inspiram outras a percorrerem essa mesma caminhada.

Portanto, ao Futsal, a minha eterna gratidão.

_____________________________

(*) Referência do título à frase de Santo Agostinho: “Ame e faz o que quiseres, porque quem ama não erra. ”

Categorias
Colunas -

Elementos para diagnósticos e avaliações no futebol em uma perspectiva sistêmica

Crédito imagem: Ricardo Duarte/SC Internacional

Em pleno século XXI, quando os estudos e pesquisas sobre pensamento sistêmico, complexidade, inter e transdisciplinaridade, entre outros conceitos, estão cada vez mais disponíveis no universo de conhecimento do futebol, não podemos mais continuar pensando em entender e avaliar atletas (e equipes) pelos critérios tradicionais, já que neles os pressupostos básicos da simplicidade, estabilidade e objetividade, característicos do paradigma cartesiano-mecanicista, infelizmente ainda predominam. É com esse olhar que ainda se consideram as clássicas e obsoletas “partes física, técnica, tática e psicológica” do desempenho esportivo, tratadas, quase sempre, de forma isolada, fragmentada e descontextualizada do todo.

Em uma nova perspectiva, alicerçada por uma visão sistêmica do futebol, o atleta deve ser visto na sua integralidade e totalidade, ou seja, na sua relação consigo mesmo (enquanto ser humano que é), na sua relação com a natureza e com o meio cultural ou social onde vive concretamente (i.e., em sociedade).

Sabemos que esta pretendida mudança cultural não é algo simples de ocorrer, uma vez que o paradigma tradicional, cuja metodologia indica que precisamos, em primeiro lugar, conhecer as partes para depois entender o todo, está arraigado em nossa cultura desde que René Descartes (1596-1650) estabeleceu os princípios dessa visão mecanicista, tornando-se hegemônico em nossa sociedade. É desde os séculos XVI e XVII, portanto, que este modo de interpretar a realidade procura dar destaque ao particular, às partes, à especialização, em detrimento de uma compreensão mais holística ou sistêmica dos fenômenos naturais, humanos e sociais.

Um exemplo bem claro deste modelo, em que o domínio da parte antecede obrigatoriamente o domínio do todo, é a crença de que para se aprender a jogar futebol, primeiro precisamos aprender as partes; em outras palavras, aprender os seus fundamentos (passe, chute, domínio da bola etc.), para só depois ter condições de jogar o jogo, propriamente dito, com mais qualidade. Este é um modelo questionado pela abordagem sistêmica, que trabalha com outros pressupostos.

É nesta perspectiva que propomos que o diagnóstico e a avaliação de um atleta (e mesmo de uma equipe) devem ser realizados de forma distinta da tradicional. Nesta proposta, consideramos níveis e dimensões ou estruturas de análise que refletem ou levam em conta toda a complexidade da realidade esportiva e existencial, da forma mais ampla possível. Neste sentido, consideramos cinco níveis e seis dimensões ou estruturas de análise, explicitadas na sequência.

Os cinco níveis de análise seriam os seguintes: o(a) atleta, o(a) treinador(a), a equipe, o treino e o jogo.

Vamos tentar entender cada um dos níveis sob o olhar sistêmico:

  • 1. O(A) ATLETA não pode mais ser visto(a) apenas como uma máquina capaz de produzir resultados esportivos, como faz a visão mecanicista ou cartesiana. Um indício de que ainda adotamos este paradigma é quando nos referimos a atletas como sendo “peças de reposição”, como partes de um mecanismo ou engrenagem. Na verdade, um(a) “jogador(a) de futebol” é, antes de tudo, um ser que pensa, que sente, que se movimenta, que chora, que tem dúvidas, procurando dar algum sentido humano a tudo que faz. Esse ser humano (futebolista) é movido pela “faísca” do sonho de se tornar um excepcional jogador ou jogadora de futebol. Podemos dizer que é a partir de seus propósitos (objetivos, metas, sonhos) que ele se movimenta, trazendo consigo uma determinada intencionalidade, que o faz tentar se superar a cada dia para atingir seu sonho. Muito longe, portanto, de ser uma máquina ou peça de uma engrenagem. Na perspectiva sistêmica, o atleta é, ele próprio, um sistema, condicionado por diferentes subsistemas: biológico (anatômico, fisiológico, biomecânico, bioquímico), psicológico, emocional e social; todos eles funcionando de forma integrada, indivisível e complexa.
  • 2. O(A) TREINADOR(A), não é somente aquele(a) que define a escalação do time ou substituições, escolhe a tática a ser utilizada no jogo e os tipos de treinamentos técnico-táticos que devem ser ministrados durante a semana. É preciso superarmos a visão tecnicista, ainda prevalente, sobre o seu papel na equipe. O treinador ou treinadora, na verdade, deve ser aquele(a) que inspira todos a se superarem a cada momento, alinhados aos propósitos dos atletas e aos seus próprios, devidamente acordado com os objetivos e metas da instituição em que trabalha (no caso, o seu clube). Para isso, é necessária uma visão muito mais ampla a respeito dessa liderança inspiracional.
  • 3. A EQUIPE, dentro dessa mesma abordagem, é também um sistema complexo, que se constitui como tal pelas relações dinâmicas de seus subsistemas – atletas, comissão e staff -,  cujo trabalho (treinamentos, jogos, entre outras atividades) determina ou condiciona o desempenho individual e coletivo dentro de todas as suas inter-relações, em que a intersubjetividade, a instabilidade e a imprevisibilidade são suas características básicas.
  • 4. O TREINO, por sua vez, é o ambiente de aprendizagem, onde os(as) atletas se exercitam, sob o comando do(a) treinador(a). Busca-se alcançar permanentemente a melhoria do rendimento esportivo, este visto de maneira complexa (multifatorial e interdependente), simulando o ambiente e a realidade do jogo sempre que possível. Caso contrário, as ações fragmentadas, características dos treinamentos tecnicistas, correm o risco de se descontextualizarem da própria realidade do jogo e, portanto, perderem muito do seu sentido.
  • 5. O JOGO (EQUIPE A X EQUIPE B) é, por fim, o grande sistema que conecta todos os anteriores, colocando os(as) atletas e as equipes em um sistema de colaboração e confronto permanentes. O “sistema jogo” é condicionado por vários aspectos, como as regras (regulamento), o tempo, o espaço, entre muitos outros elementos, objetivos e subjetivos, que caracterizam toda a complexidade do jogo.

Agora vamos considerar as dimensões ou estruturas de análise do(a) atleta, como um microssistema que estabelece relações com outros sistemas. Para esta fundamentação, apoiamo-nos em estudos desenvolvidos e aplicados pelo respeitado Professor Francisco Seirul-lo, Diretor de Metodologia do Treinamento do F.C. Barcelona. Seirul-lo inspirou o trabalho de inúmeros profissionais do futebol, entre eles Pep Guardiola, que não esconde sua admiração pelo mestre e que contribuiu de forma decisiva nas ideias de jogo e preparação de suas equipes.

São seis as estruturas de análise dos(as) atletas:

  • 1. ESTRUTURA COGNITIVA – responsável pelos atos ou processos de aquisição de conhecimento, que ocorrem por meio da percepção, atenção, memória, associação, raciocínio, juízo, imaginação, pensamento e linguagem, e que produzem os estímulos necessários às tomadas de decisão. 
  • 2. ESTRUTURA COORDENATIVA – responsável pelos atos ou ações motoras simples e complexas, que são realizadas pelos atletas geralmente de forma aberta, com e sem bola.
  • 3. ESTRUTURA CONDICIONAL – responsável pelos estímulos que exigem a manifestação de qualquer das capacidades físicas (ou atléticas) básicas, tais como velocidade, resistência, força, potência em suas diferentes especificidades e processos metabólicos próprios.
  • 4. ESTRUTURA SOCIOAFETIVA – responsável pelos estímulos que regulam as relações sociais (entre os indivíduos), tais como a cooperação, a solidariedade, o respeito, a compaixão, a coesão entre os atletas, entre outros.
  • 5. ESTRUTURA EMOCIONAL-VOLITIVA – responsável pelos estímulos que controlam as emoções e a motivação (vontade), envolvendo os desejos, as necessidades e os interesses dos sujeitos ou indivíduos. No esporte de alto rendimento, esta estrutura demanda uma força mental especial, muito vinculada a seus propósitos.  
  • 6. ESTRUTURA CRIATIVA-EXPRESSIVA – responsável pelos estímulos que exigem respostas que fogem dos padrões estáveis preestabelecidos, que só podem ser desenvolvidos em ambientes de aprendizagem próprios, onde a possibilidade e a aceitação do erro e de transcender certas regras são essenciais dentro do processo de desenvolvimento dos(as) atletas.  

Portanto são os cinco níveis de análise do jogo e estas seis estruturas (ou dimensões) de análise dos atletas que constituem os elementos que permitem substituir o olhar tradicional, fragmentado, mecanicista, ainda hegemônico, por uma visão mais sistêmica e complexa do futebol e do esporte em geral.

A proposta aqui defendida é que nos preparemos para superar o paradigma mecanicista com o qual avaliamos os fenômenos ocorridos no futebol (e na vida), em que a parte – muitas vezes – é confundida com o todo, levando-nos a interpretar equivocadamente a realidade, dificultando um melhor diagnóstico e uma melhor avaliação e, consequentemente, dificultando a necessária integração de todas as ações voltadas ao ótimo desempenho esportivo. Este é o convite!

Categorias
Colunas -

Investimento de curto ou longo prazo no futebol

Crédito imagem: Rafael Ribeiro/Vasco.com.br

Temporada afunilando, campeonatos já com cenários bem definidos e clubes tendo resultados do trabalho plantado lá atrás. Sim, porque a vitória e a derrota de hoje demonstram o planejamento de ontem. Apesar de toda a imprevisibilidade que o jogo carrega por si só, a lei da vida vale para a temporada de uma equipe: não dá para colher sucesso se o que foi plantado não teve organização, coerência e conhecimento.

Ainda temos no futebol brasileiro a ideia de que basta ter dinheiro para a conquista de títulos. Claro que quanto maior o poderio financeiro mais jogadores de qualidade podem ser contratados. E no final das contas a parte técnica tem uma influência enorme no resultado final. Porém há outras variáveis que se bem controladas podem ter igual ou até maior influência no desempenho de um clube ao longo não só de dez meses de disputa, como também no médio prazo.

Formatação homogênea de elenco é uma das peças chaves para o sucesso no futebol, mas ainda desprezada por muitos clubes. Buscando atender uma demanda momentânea dos apaixonados torcedores, dirigentes apostam em contratações faraônicas que dão mídia por alguns dias, mas que oneram as contas por vários anos. Não sou contra grandes reforços. Reconheço que nomes famosos atiçam a curiosidade de todos e fortalecem o produto. Entretanto o que já está provado e comprovado que não funciona é o batido argumento de “oportunidade de negócio” para trazer jogadores em final de carreira que não atendem as necessidades de um elenco.

Na esteira de jogadores com muito nome e salários maiores ainda, mas que pouco entregam dentro de campo, vale falarmos da estrutura física e de pessoas em departamentos estratégicos de um clube. Talvez com a soma dos vencimentos mensais de um jogador voltando da Europa fosse possível investir em um departamento médico de ponta, com tecnologia e profissionais da mais alta qualidade, para que não só houvesse uma mais rápida recuperação, mas também um trabalho de prevenção de lesões. Ou quem sabe esse dinheiro pudesse ser investido em análise de desempenho, para melhorar aspectos coletivos e individuais do time e até mesmo um aporte na análise de mercado para que o processo de recrutamento fosse mais assertivo. Ou até mesmo valesse mais uma estruturação maior nas categorias de base, formando mais e melhores jogadores para que houvesse tanto entrega no time profissional como também boas vendas, fazendo com que esse modelo se retroalimente.

Reconheço que no imediatista futebol brasileiro o dirigente – que muitas vezes não é profissional e sim um ‘torcedor abnegado’ – se vê tentado a contratar um jogador renomado ao invés de investir em uma estrutura, que pode demorar alguns anos para dar resultado. No viés político dos clubes, como segurar a vaidade desse cartola para plantar algo que talvez o seu sucessor colha os resultados… Assim, seguimos com os clubes cada vez mais endividados, transportando a aleatoriedade do jogo para a gestão. Enquanto o que importar for o próximo jogo e não o médio prazo o caos seguirá dominando.

Categorias
Colunas -

Por uma pedagogia da realidade no futebol – Tenhamos menos, sejamos mais

Crédito imagem: Gustav Schultze, 1882/Wikimedia Commons

Na segunda metade do Século XIX, na fadada Alemanha Imperial, existiu um camarada chamado Friedrich Nietzsche, que, matuto das ideias, passou boa parte da vida escrevendo um número interessante de textos e que cento e tantos anos depois continua a impactar, do ponto de vista filosófico, o modo como você, corajoso e corajosa que insiste em gastar os olhos com a falação pedagógica deste escriba, e eu, obviamente, concebemos a linda – e absurda – existência humana. Nietzsche foi e continua sendo um dos baluartes da filosofia contemporânea e qualquer tentativa de sintetizar, em centenas de palavras, uma de suas reflexões que seja é um tanto pretensiosa. Ainda assim, vou ter a pachorra (qualquer coisa é culpa do Paulo) de aproveitar certo conceito de nosso amiguinho germânico para levantar a bola e continuar a discussão sobre treinadores, treinadoras e autonomia.

Nietzsche cunhou o termo übermensch, em português, ‘super-humano’ ou algo parecido, para ressaltar nossa fome de transcendência – a todo o tempo abafada. O ‘super-humano’ não é alguém dotado de poderes, inequívoco, perfeito. Está mais próximo, sim, de que alguém que, ao fugir de pragmatismos e convenções morais e compreender suas limitações, se liberta pelo devir: passa se afirmar na diferença entre o que se tornou e o que foi e entre o que será e o que é agora. ‘Torna-te quem tu és’ – desconfio que você, corajoso e corajosa, já deve ter ouvido, lido ou até mesmo se apropriado dessa expressão, ainda que apenas pela retórica. Eis uma explicação violentamente rasa do conceito – por isso, nada como a própria leitura das obras do filósofo alemão ou explicações conceituais um pouco mais densas, a exemplo do que faz o ótimo livro Razão Inadequada, mas suficientemente útil, creio, para darmos sequência ao raciocínio.

O ‘super-humano’ nietzschiano não tolera o conformismo. Por mais contraditório que seja, há um bocado dele no que tem sido vendido como revolucionário. Que atire a primeira pedra quem nunca idealizou algum estereótipo para si. Fiquemos com os treinadores e as treinadoras de esportes: quase que platonicamente, parecem correr atrás, o tempo todo, para alcançarem um certo tipo de arquétipo profissional, que tenha isso, aquilo e aquilo outro, que aja assim e assado e, claro, no fim das contas, vença. No mundo acadêmico, a busca por um modelo ‘ideal’ me parece traduzida pela quantidade voraz de produções científicas sobre quais competências são necessárias para que sejam, esses pobres indivíduos à beira do campo e da quadra, bem-sucedidos.

Que não confundamos alhos com bugalhos. A aproximação entre ciência e prática é tão necessária quanto os estudos que aprofundem o ato de treinar e a profissão treinador. Para desespero de viralatistas e negacionistas e apesar dos pesares, universidades públicas brasileiras – cito aqui, correndo o enorme risco de cometer injustiças, UNICAMP, USP, UFSC, UFG e UFAM – tem conduzido investigações sobre o desenvolvimento e prática profissional de treinadores e treinadoras, a partir de seus laboratórios e grupos de pesquisa, com primazia e sofisticação ímpares. Cabe ressaltar: a pedra fundamental desses estudos, que constituem o cerne da Pedagogia do Esporte, enquanto subcampo da Educação Física, foi assentada graças ao pioneirismo gnosiológico do Prof. Roberto Rodrigues Paes, lá nos anos 80.

O que não significa que todos eles estejam imunes a problematizações aqui e acolá.

Nossos bate-papos pedagógicos, vocês sabem, partem d’um ponto de vista ou da vista d’um ponto, que, se não presumem almejar a verdade absoluta, parece suficientemente relevante para ser destilado em palavras e causar uma ou outra disjuntura intencional. Pois bem: a noção de que treinadores e treinadoras devem refletir sobre suas ações, práticas e condutas, constitui grande parte dos programas de formação e chancelada por importantes autores e autoras da ciência pedagógica. Tais processos reflexivos, porém, correm riscos de sequestro epistemológico e serem guiados por um pensamento linear, racionalista e fechado, mesmo que diga confrontar pressupostos tradicionais de ensino, aprendizagem e treinamento. Isso porque esse ‘estado de consciência’, se enjaulado por um tipo de abstração que não desemboca em ação real contínua ou numa prática minimamente espontânea e intencional pode tanto beirar o infrutífero, quanto acabar desmascarado no médio prazo. O Paulo, o cara do texto passado, chamaria de ativismo.

O refletir sobre a própria prática, da parte de treinadores e treinadoras, não envolve apenas o ‘apagar de incêndio’, que caracteriza a perseguição pela coerência pragmática, na aula, no treinamento ou jogo. Nem deve carregar consigo uma espécie de auto panóptico – desculpe, Foucault, este escriba não sabe o que faz – para designar uma paranoia vigilante de dentro para dentro. Fiz isso. Mas poderia ter feito aquilo. Não, aquilo, não. Aquilo outro é o melhor. Mas antes tenho que refletir sobre. Preciso parar e pensar. Paro. Penso. Mas será que minha reflexão é correta? Devo, mas será que faço? Faço, mas será que devo?

Não faço. Quem sabe amanhã, porque o treino já acabou.

As reflexões são guiadas por certo fetiche à racionalização de competências basilares, visando uma dita excelência performática. Do hemisfério norte, emergiram importantes pesquisas que ressaltam a importância de conhecimentos de natureza interpessoal (ligada aos relacionamentos e conexões estabelecidas com os indivíduos ao redor), profissional (vinculada aos elementos tático-técnicos do jogo) e intrapessoal (atrelada ao relacionamento consigo mesmo ou mesma) ao treinador e treinadora de esportes.

A elaboração dessa tríade de conhecimentos tem enorme valor para a organização de ideias e procedimentos voltados ao desenvolvimento profissional de treinadores e treinadoras. Este que vos escreve, inclusive, fez uso proveitoso dela em uma investigação com jogadores e jogadoras de futebol profissional para levantar quais competências são mais apreciadas pelos protagonistas do jogo, que pode ser acessada gratuitamente aqui. Nos parece indiscutível que aptidões como liderança, gestão de pessoas e de relacionamentos, empatia, amor ao jogo e repertório tático sejam caras à profissão: elas, todavia, não são adquiridas com uma simples ‘googlada’, com um livro, um curso ou uma graduação completa no ensino superior.

O conformismo, a quem Nietzsche declarou ranço, adquiriu novos contornos sob a égide da positividade. Nos conformamos em parecer que estamos saindo da casca, sem, de fato, rompê-la de verdade – dentre outras coisas, porque é um processo não exatamente confortável. Ao invés de tornarmos quem somos, como sugeriu o germânico, fingimos vir a ser o que o convencional requer. Assim, treinadores e treinadoras buscam o elixir da boa vida pedagógica, em forma de competências, como se pudessem ser compradas em prateleiras de supermercado, como itens de uma lista de compras aguardando o check-list da caneta. Tenha isso, tenha aquilo, faça assim, faça assado.

E ser, será que alguém está sendo? No ‘Pedagogia do Esporte’, canal digital dirigido pelo amigo Lucas Leonardo, vi uma provocação interessante: será que tamanho número de diretrizes, determinações, passos e deveres não estão pasteurizando o ato de treinar? E os afetos e contextos, inerentes à ação pedagógica, não estão sucumbindo às generalizações das competências e reflexões a serem seguidas?

Desconfio que uma das saídas para essas armadilhas esteja no autoconhecimento. A noção crítica – e não idealizada – sobre o contexto real de trabalho e da infinidade de contradições que treinadores e treinadoras evocam a partir de suas crenças, concepções e valores: sobre quem são, porque são e como forjam seus conhecimentos. Por essas e outras, insistimos na epistemologia como preponderante nos processos de construção e relação com os saberes no campo pedagógico (levando em conta que o ensino é uma prática social viva e complexa) e, portanto, da prática – em consonância a que pedagogos importantes como o canadense Maurice Tardif e a brasileira Cecília Borges defendem. Entre o ter e o ser, a linha não é exatamente tênue e o fato d’os processos de formação voltarem-se mais ao primeiro verbo do que ao segundo é digno de sinal amarelo.

E isso sim, é ‘falação’.

Categorias
Colunas -

Análise complexa de desempenho

Crédito imagem: Bruno Sarraf/EC Vitória

A aleatoriedade do jogo de futebol seguirá intacta até o fim dos tempos. É isso que dá graça ao espetáculo! Uma partida começa e não sabemos o que pode acontecer. As infinitas possibilidades de ação entre vinte e dois jogadores manipulando um objeto pequeno (a bola) em um terreno proporcionalmente imenso ( o campo), coordenando dois alvos (os gols) durante mais de noventa minutos fazem do futebol o esporte mais praticado e amado do mundo!

Mas como algo inserido dentro de um contexto maior o jogo passa constantemente por evoluções. Não se joga mais como há dez, vinte, trinta anos. A essência do jogo é a mesma, porém como exemplo, trago as implicações do VAR ao esporte: não dá mais pra ludibriar a arbitragem com simulações. Ou o jogador que não tiver noção de tempo e espaço ficará impiedosamente impedido a todo momento. 

E mais do que dentro de campo, a tecnologia traz inúmeras implicações fora dele. São ferramentas que surgem a cada dia, semana e mês com a difícil missão de prever toda essa aleatoriedade e fazer com que uma equipe tenha mais chances de êxito. 

Eu poderia enumerar vários novos elementos e situações, mas vou focar na ciência disponível atualmente para a contratação de jogadores. No futebol “antigo” valia aquele olhar “sobrenatural” de um dirigente e de um olheiro. Hoje a base de dados disponível a um custo relativamente baixo faz com que diversos clubes tenham acesso não só a performance de um jogador com e sem a bola, como também a dados físicos e até ao perfil psicológico de quem se busca contratar.

Neste novo mundo do futebol, que movimenta milhões e até bilhões de reais, não dá para contratar com base no achismo ou no gosto pessoal de algumas poucas pessoas. Claro que já citei a aleatoriedade do esporte e vale pontuar que estamos tratando de seres humanos e que por isso não conseguiremos jamais prever elementos como adaptação, problemas pessoais que possam surgir e etc. Contudo, recrutar jogadores com base em memória afetiva ou até índices muito antigos de performance, sem mensurar o presente e projetar o futuro, simplesmente para “dar uma resposta pra torcida”,  não cabe mais no futebol profissional de hoje.

Categorias
Colunas -

Dedicação além das quatro linhas

Crédito imagem: Ricardo Duarte/SC Internacional

O futebol mudou porque o mundo está constantemente mudando. Como algo inserido dentro de um todo maior, que é a sociedade e sua evolução, o jogo não pode e nem deve ser como era há vinte, trinta anos. Se nós não vivemos da mesma forma, porque o futebol deveria ser imutável?!

E se o jogo é outro, quem o pratica também é. O atleta profissional de futebol de 2021 não é o mesmo de 1991, por exemplo. E em muitas coisas saímos perdendo atualmente. O principal é a diminuição do amor pelo futebol, do gosto pela bola.

Gosto sempre de contextualizar e já reconheci que o mundo mudou e admiti que o futebol não pode ser igual para sempre. O jovem de hoje tem milhares de opções de lazer e variados estímulos que o levam a não ficar focado cem por cento no futebol. E nem quero entrar na seara da falta de campinhos, da ausência da rua na formação e etc. Não, o foco não é esse!

Falo de uma geração que tem pouco apreço pelo jogo. Que não gosta muito de assistir futebol, que acha noventa minutos longos e chatos…uma geração que já não fala tanto de futebol, que não respira o jogo como gerações anteriores…

Venho detectando essa regra – claro que há exceções – e percebi que isso impacta diretamente na qualidade de todas as partes da pirâmide do futebol brasileiro.

Como em qualquer profissão, jogadores mais apaixonados pelo que fazem seriam mais competitivos. Se eles tivessem mais dedicação aos detalhes do esporte poderiam performar melhor. Se eles entregassem mais horas do dia ao jogo e não apenas o período em que estão obrigatoriamente treinando, talvez tivessem mais soluções para resolver os problemas do jogo. 

O ambiente à nossa volta é determinante e condiciona nossas ações. Se o futebol já não é tão único e atraente como já foi para muitos, a força pessoal em focar e se dedicar tem que ser ainda maior. Nunca foi tão difícil pensar só em futebol. Entretanto, também nunca foi tão fácil se destacar por simplesmente amar e se dedicar ao jogo.

Categorias
Colunas -

Sobe o nível do futebol brasileiro

Crédito imagem: Ari Ferreira/Red Bull Bragantino

A renovação é algo normal em qualquer atividade profissional. Ciclos acontecem de maneira natural – idade e seleção do próprio mercado, por exemplo – ou até intencional – a pessoa decide por si só encerrar uma trajetória laboral.

No caso dos treinadores de futebol profissional no Brasil estamos passando nitidamente por uma mudança de safra. Na elite, nos quarenta principais clubes – Séries A e B – apenas dois técnicos têm mais de sessenta anos: Luiz Felipe Scolari no Grêmio e Vanderlei Luxemburgo no Cruzeiro. E aqui se apresentam dois casos bem simbólicos; ambos têm um passado incrível, repleto de conquistas, mas estão em contextos de evitar rebaixamento.

Que fique bem claro: não acredito em rótulos! Jovem, velho, estrangeiro, etc… as competências sempre foram e sempre serão as maiores norteadoras de qualquer análise. Mas chama a atenção que alguns técnicos que foram vitoriosos no passado não estão conseguindo mercado. Nesse mundo atual sem fronteiras e globalizado é claro que vamos absorver profissionais de outros países. E novamente vale a máxima das habilidades e não do passaporte, por mais que para alguns dirigentes valha mais surfar na onda dos estrangeiros do que avaliar, de fato, o trabalho em si. Mas tendo elementos que elevem a qualidade é bom para todos! Subindo o ‘sarrafo’, no final das contas, todos ganham! Se antes a zona de conforto imperava, vejo hoje uma busca por conhecimento altamente positiva!

Dentro de uma visão sistêmica, o técnico é um elemento inserido em um ecossistema maior. É claro que não é bom pra ninguém a média de permanência de um profissional ser de apenas três meses. Neste contexto, evidentemente, o treinador vai buscar primeiro sobreviver. Depois, se der, ele pensa em um jogo mais elaborado…entretanto mesmo diante desse caótico cenário já consigo ver o nível subindo no futebol brasileiro. Já dá para notar ideias e conceitos interessantes sendo implementados. Há uma luz no fim do túnel. Depois de anos de acomodação, estamos melhorando! Para a primeira divisão do campeonato brasileiro ser uma das melhores do mundo leva tempo e depende de uma centena de fatores. Mas o que vemos hoje em campo é certamente melhor do que há cinco anos…